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    A organização da sociedade civil no apoio à solução dos problemas económicos e sociais

    O intelectual camaronês Achille Mbembe, autor do artigo «A era do humanismo está terminando», editado em 2017, alerta para a crescente bifurcação entre a democracia e o capital, como sendo a nova ameaça para a civilização e refere que o principal choque da primeira metade do século XXI, não será entre religiões ou civilizações:

    “Será entre a democracia liberal e o capitalismo neoliberal, entre o governo das finanças e o governo do povo, entre o humanismo e o niilismo”.
    Proveniente do latim “nihil”, que significa “nada”, entre os seguidores do niilismo destaca-se o alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), para quem o poder e os valores com origem nas instituições (religiosas, sociais e políticas) tornam-se inexistentes, para darem lugar à emergência de “um homem livre e não corrompido por qualquer tipo de crença, o qual realiza as suas próprias escolhas”.

    Achille Mbembe, nesta sua visão futura do mundo, refere que, nos EUA, “o assassinato de negros pela polícia continuará ininterruptamente e mais centenas de milhares se juntarão aos que já estão alojados no complexo industrial-carcerário, instalado após a escravidão nas plantações e as leis de Jim Crow”. Na prática, estas leis aplicadas, entre 1877 e 1964, exigiam instalações separadas para brancos e negros em todos os locais públicos, sobretudo, nos antigos Estados Confederados da América.

    A Europa continuará a sua lenta descida ao autoritarismo liberal, apelidado de “populismo autoritário” pelo teórico cultural e sociólogo britânico-jamaicano Stuart Hall (1932-2014). Independentemente dos difíceis e concertados acordos alcançados em fóruns internacionais, a sustentabilidade ambiental continuará a não ser respeitada e a guerra anti-terrorista “se converterá, cada vez mais, numa guerra de extermínio entre as várias formas de niilismo”.

    Com o esbatimento das ideologias, que poderiam abrir espaço para um renovado contexto de luta de classes, irão crescer as desigualdades em todo o mundo, dando lugar ao “racismo, ultranacionalismo, sexismo, rivalidades étnicas e religiosas, xenofobia, homofobia e outras paixões mortais”.

    A perda de valores, tais como a solidariedade, a generosidade e a compaixão, passará a fazer parte das crenças religiosas, onde, nas situações de fome e extrema pobreza, o mais importante para as pessoas é ganhar dinheiro, independentemente da forma como, do ponto de vista ético, esse ganho vier a ser alcançado.

    Como as ciências sociais não se regem por determinismos rígidos, mas tendenciais, há que, através de uma educação para o desenvolvimento e do estabelecimento de um quadro de valores, contornar estas macrotendências ultraliberais, que separam cada vez mais os países industrializados dos países em desenvolvimento e criam profundas assimetrias no interior de cada uma das sociedades.

    Segundo o economista e professor jubilado Adelino Torres, “traçar políticas que maximizem os potenciais benefícios da globalização e minimizem os riscos de desestabilização e marginalização, constitui, no fundo, o grande desafio a ser enfrentado pelos países africanos”.

    Associado ao conceito de desenvolvimento está implícita a existência de um Estado de direito democrático com ampla participação da sociedade civil.

    Numa perspectiva de liberdade, tal como exigem os fins e os meios para o desenvolvimento, a sociedade civil ao ser envolvida, de forma organizada, na construção do seu próprio futuro, deixa de se apresentar como mera e passiva beneficiária de programas de progresso económico e social e passa a contribuir para o estabelecimento de “papéis de sustentação e não de entrega sob encomenda”.

    Tal facto, leva à necessidade de os governos africanos terem de envolver a sociedade civil no debate sobre políticas económicas e sociais, para obterem o apoio dos cidadãos para os esforços em prol da melhoria das suas condições de vida, fazendo, assim, parte não só dos problemas, mas, de forma pró-activa, das soluções para os superar.

    Um novo estilo de gestão governamental comporta obrigatoriamente num novo contrato social. A base da cidadania assenta num sentido de identidade; i.e., num sentido de pertença, que não se relaciona apenas com o facto de fazer parte de uma mesma nação ou de ter um idioma comum, mas também por todo um conjunto de factos históricos que unem as pessoas à volta das mesmas preocupações, que necessitam de ser futuramente resolvidas de forma comum.

    Como refere o “Relatório da Comissão Independente População e Qualidade de Vida, de 1998, “quando as pessoas são partes de, preocupam-se. Quando se preocupam, ocupam-se de, agem, contribuindo para o bem-estar da sociedade, mesmo antes de surgir a reivindicação dos direitos de participação”.

     

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