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    As empresas estatais

    O confisco, pelo Estado, de empresas que estavam em posse dos generais Kopelipa e Leopoldino Nascimento, baseando-se no princípio de que as mesmas passaram a existir graças ao capital do Estado, está a dar muito que falar nas redes sociais.

    Como se pode imaginar, muitos estão completamente indignados como duas figuras, usando as ligações em várias esferas do Estado, conseguiram controlar empresas com o preço de quase um bilião de dólares.

    Afinal, os activistas que sempre foram gritando que havia algo profundamente errado na governação do país tinham razão. Que isto sirva como uma lição para se evitar, no futuro, exemplos deste género, que foi, efectivamente, um saque desavergonhado dos recursos de todos angolanos.

    Alguns de nós estamos aflitos porque há pouca probabilidade de as empresas que foram confiscadas vão estar a funcionar dentro de um ano, o obituário destas empresas deveria já ser escrito e os arranjos dos seus funerais deveriam ser já preparados. No continente africano, são poucas as empresas estatais que são viáveis.

    Estou pronto para ser surpreendido pela positiva. Para isto, o Estado angolano vai ter que empregar gerentes sérios para liderar as empresas que passaram para a esfera pública. Há angolanos com imensa experiência e competência em gestão que podem fazer um bom trabalho.

    Estou a escrever isto, aqui no Planalto Central, precisamente no Katchiungo. Tenho visto o comboio que sai do Luena para o litoral e vice-versa. De cá para Benguela, uma viagem de cerca de quatrocentos quilómetros, o comboio leva onze horas — sim, onze horas, exactamente a duração do voo de Londres a Joanesburgo!

    Porque razão é que não passamos a ter uma pequena linha-de-ferro privada, Planalto Express, por exemplo, que sai de Benguela ao Huambo, com menos carruagens, mas bem cheia e com conforto garantido? Suspeito que há muitos interesses que não estariam confortáveis com tal competição.

    As empresas ligadas ao Estado nem sempre ajudam na competição que é necessária para o bom funcionamento do mercado livre. Uma das características destas empresas estatais é o salário elevadíssimo dos seus directores, as casas matulonas, as viaturas da última gama, as viagens para estrangeiro etc.

    Ainda naquele meu outro país, Zâmbia, havia, em 1976, quando lá fui, um sistema de comboios de invejar, hoje tudo ficou para a história. Uma das razões é que o chefe do caminho-de-ferro do Estado é nomeado pelo Governo. Neste caso, o que conta são as conexões e não as habilidades empresariais.

    Nos próximos meses, as empresas que o Estado recuperou dos generais Kopelipa e Dino poderão ter uma nova gestão nomeada pelas altas instâncias. Suspeito que vai se tratar de “usual suspects” ou de os “ suspeitos de costume” com algumas caras de brancos ( portugueses ou brasileiros) aí e lá para se dar a impressão de competência técnica.

    Numa empresa privada, quando não se faz lucro a mesma vai à falência e o seu director também fica manchado. Quando a mesma faz lucro, a sua liderança é recompensada adequadamente e fica cheia de glória. Em muitas empresas do Estado, o lucro nem sempre é dada tanta importância, a liderança, em muitos casos, é composta por antigas figuras que se destacaram no partido no poder.

    Em certos casos, vários escalões da gerência são preenchidos por conhecidos (gente com conexões) resultando num nepotismo incestuoso.
    Ainda naquele meu outro país, Zâmbia, havia, durante a minha infância, a grande linha aérea nacional, a Zambia Airways. Um antigo piloto contou-me, uma vez, como a empresa era gerida (nepotismo, falta de rigor etc), resultando na falência da mesma.

    O Estado já não podia injectar capital nesta águia que se tinha tornado num gigantesco elefante que mal andava. Hoje, a Zâmbia tem várias pequenas linhas aéreas regionais que têm sido altamente eficientes e proveitosas para os seus donos.

    Os abutres estão à espera de lado olhando atentamente. É que algumas das empresas que o recuperou dos generais Dino e Kopelipa possuem património que, nas mãos de uma boa gerência, podem proporcionar muitos bons lucros.

    Aquela gráfica em Talatona, a Damer, poderia servir não só à demanda angolana, mas de várias partes do mundo. Há material que se vende nos Estados Unidos, que é impresso na Índia.

    Os abutres compram a empresa, usualmente pagando as dívidas, despedem os empregados, pegam no património e continuam com as operações com custos altamente reduzidos. Os abutres, usualmente, são muito bem organizados e são mestres em premir os botões certos do sistema para obterem os resultados que pretendem. Espero que desta vez eles não tenham a sorte que eles parecem sempre ter.

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