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    Direito a habitação em Angola sem reconhecimento

    Reunião da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, em Luanda, termina sem reconhecer a luta diária da SOS Habitat pelo acesso da população angolana a moradia digna. Para ONG, houve pressão do Governo.

    (dw.de)
    (dw.de)

    A decorrer, em Luanda, desde 28 de Abril, foi encerrada na segunda-feira (12.05.14) a reunião da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (CADHP), da qual participaram 385 delegados, 143 dos quais em representação de 26 Estados, 18 de instituições nacionais de Direitos Humanos, 14 de organizações internacionais e 180 de organizações não governamentais (ONGs), africanas e internacionais, entre outros.

    A reunião serviu para a análise da situação dos direitos humanos no continente africano.

    Durante os trabalhos, a organização não governamental internacional Human Rights Watch (HRW) lançou um apelo aos conferencistas para denunciarem os “abusos” que ainda acontecem em Angola – nomeadamente no que diz respeito à restrição da liberdade de expressão, à pressão exercida pelo Governo sobre a comunicação social independente – e a pedirem a condenação dos responsáveis pelas mortes, raptos e torturas naquele País Africano de Língua Portuguesa (PALOP).

    Nesta conferência internacional, a CADHP atribuiu o estatuto de observador a doze ONGs que trabalham em prol dos direitos humanos e dos povos. Uma das ONGs que esperava obter este estatuto era a angolana SOS Habitat – Acção solidária, que defende a plena cidadania e uma habitação harmoniosa para a população do país. Mas tal medida não se concretizou. A este respeito, a DW África entrevistou Rafael Morais, coordenador da SOS Habitat.

    DW África: Por que motivos, acredita, não foi concedido à SOS Habitat o estatuto de observador da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos?

    Rafael Morais (RM): Nós já solicitamos à Comissão Africana há dois anos a nossa candidatura e pensamos que este ano iríamos receber este estatuto. Infelizmente, houve um lobby contra nós, no sentido de que a SOS Habitat não possui o certificado de admissibilidade. Mas nós ingressamos documentos à comissão para poder justificar exactamente que a situação do certificado de admissibilidade não é da nossa responsabilidade, é da responsabilidade do Ministério da Justiça – uma vez que a SOS Habitat remeteu todo o processo legal ao Ministério da Justiça, o cartório recebeu, autenticou e remetemos também a cópia do Diário da República.

    Então, seria de responsabilidade do Ministério da Justiça entregar este certificado de admissibilidade. Nós estamos a trabalhar no sentido de esclarecer mais uma vez à comissão, à presidência da comissão, para poder esclarecer certamente o que está a acontecer e também de quem é a responsabilidade neste caso para poder atribuir o certificado de admissibilidade.

    DW África: Será que o lobby foi extremamente forte para impedir a SOS Habitat de obter este estatuto?

    RM: O lobby foi extremamente forte. O secretariado da comissão foi nos solicitando documentos, nós fomos remetendo. Mas a cena ficou estagnada quando nos pediram o certificado de admissibilidade. Acontece que existem organizações que não têm este certificado – como no caso da JPD [Justiça, Paz e Democracia], por exemplo – mas a comissão atribuiu o estatuto de observador já há bastante tempo.

    É claro que, as condições em que se encontram outras organizações, nós também nos encontramos. Quanto ao resto, nós estamos legalizados. Temos todos os requisitos apresentados ao Ministério da Justiça. Contudo, o lobby por parte do Governo foi forte. Mas nós vamos continuar a trabalhar também no sentido de poder adquirir este estatuto nos próximos meses.

    DW África: Será que faltou pressão por parte das outras organizações não governamentais que estavam presentes no encontro?

    RM: Houve um trabalho árduo, sobretudo no plano da JPD e da Open Society, no sentido de pressionar a comissão e fazer compreender à comissão que o certificado de admissibilidade não é de responsabilidade da SOS Habitat e sim é da responsabilidade do Ministério da Justiça – a sua atribuição, neste caso. Portanto, houve um trabalho forte. Infelizmente, não surtiu efeito.

    DW África: Em todo o caso, é uma frustração para a SOS Habitat?

    RM: Não é bem assim uma frustração. O nosso trabalho continua. Mesmo com a falta do certificado de admissibilidade vamos seguir a trabalhar. O nosso trabalho é de proteger e promover os direitos humanos relacionados com habitação e terra. Sempre que houver violações dos direitos das pessoas nesse sentido, é claro que o nosso trabalho vai continuar. Vamos continuar a trabalhar com a comissão no sentido de termos esse estatuto, uma vez que é um direito também que nos cabe.

    DW África: De qualquer forma, depois dessas reuniões que tiveram lugar em Angola – nomeadamente das ONGs e agora da Comissão Africana – será que uma nova etapa em reacção ao respeito dos direitos humanos em Angola vai começar a funcionar?

    RM: O Governo angolano, neste caso, enquanto albergou aqui a presidência da Comissão Africana, Angola aprendeu muito com os outros países no que toca o respeito e a promoção dos direitos humanos e é isso que nós queremos, que tem que haver alguma diferença em relação aos anos anteriores.

    Para nós da SOS Habitat, vamos continuar a trabalhar, continuar a fazer lobby dentro do Governo, no sentido de fazer respeitar o direito à habitação e à terra. Antes da comissão, houve um encontro de ONGs. Foi debatida a questão das demolições injustas que deveriam ser paralisadas. Infelizmente, remeteu-se também a comissão para ver se recomendasse ao Governo angolano e parece que não saiu também esta recomendação sobre as demolições. Mas mesmo assim, vamos continuar a trabalhar.

    DW África: Numa palavra, valeu a pena a realização destes dois grandes encontros sobre os direitos humanos em Angola?

    RM: Valeu a pena porque foram expostas várias questões relacionadas aos direitos humanos dos vários países. Sobretudo Angola, na questão da acusação do [Isaías] Cassule e [Alves] Kamulingue e outros também que têm reivindicado seus direitos, têm passado uma situação cada vez mais crítica. E também a situação das guerras que estão a ocorrer em outros países africanos também. Há muitas violações de direitos humanos nesses países. Também foi exposto e foi recomendado aos governos no sentido de que haja realmente um esforço de todos nós para pôr fim a este tipo de situação, porque no fundo o desenvolvimento de cada país tem como resultado final o bem-estar das sociedades.

    Durante a reunião de Luanda, a Comissão adoptou um relatório de actividades a submeter à próxima sessão ordinária do Conselho Executivo da União Africana, por ocasião da 23ª Cimeira da Conferência de Chefes de Estado e de Governo da União Africana, prevista para o próximo mês de Junho. (dw.de)

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