Domingo, Maio 19, 2024
15.1 C
Lisboa
More

    Sonhar não é proibido

    REGINALDO SILVA (DR)
    REGINALDO SILVA (DR)

    É a sonhar que também nos entendemos ou às vezes nos entendemos melhor, antes de mais porque não há qualquer tipo de contacto físico neste tipo de exercício, o que à partida retira da circulação alguns conhecidos riscos resultantes das manifestações e de outras demonstrações de protesto que agora estão na moda.

    Para quem não tem outros recursos e só lhe sobra a esperança, sonhar, efectivamente, nunca foi proibido, o que é um grande vantagem, sobretudo quando se vive debaixo de ordenamentos mais repressivos, onde se incluem aqueles que garantem tudo no papel, mas não passam disso mesmo, supostamente por causa dos ingleses que têm de saber de tudo e mais alguma coisa para efeitos não sei de quê. Nunca percebi muito bem a origem desta história, que é a do “isto é para inglês ver”.

    Será pelo facto dos ingleses, a certa altura da história contemporânea, terem sido uma espécie de “masters” do mundo, pelo que havia necessidade de os enganar com as aparências, para eles não se chatearem muito com a malta? Lamentavelmente, as constituições, mesmo as mais democráticas ainda não consagram o sonho como um direito fundamental, tendo a própria Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), omitido este aspecto, que quanto a mim devia ser o conteúdo do primeiro artigo do referido texto, com estatuto de preâmbulo.

    Assim sendo, teríamos a DUDH a começar com o seguinte artigo: “Todos os cidadãos livres e presos do planeta Terra têm o direito de sonhar com um mundo melhor do que aquele que os seus governos em dado momento da história lhes estão/podem oferecer, não devendo em circunstância esta possibilidade serlhes coartada ou negada”.

    Poderíamos ainda acrescentar um segundo artigo: “Caso os sonhos não sejam realizados, os cidadãos têm o direito de confrontar em hasta pública os seus governos com toda a sua frustração, exigindo-lhes que eles passem a sonhar também com um mundo que seja melhor e mais justo para todos e não apenas para alguns que são mais iguais que os outros.” oi o que Martin Luther King fez há 50 anos, quando a América branca e racista não permitia muito mais do que isso aos negros, hoje também chamados de afro-americanos, sobretudo por causa do politicamente correcto, do que por outra razão que seja mais consistente. Pela mesma lógica, os brancos de origem anglo-saxónica que mandam nos EUA, os Wasps, também deveriam ser chamados de euro-americanos e por aí adiante.

    Com a excepção dos índios que eram os donos originais da terra e que também pagaram um preço muito elevado por terem herdado essa fortuna dos seus vermelhos antepassados, os negros foram os únicos americanos que nunca quiseram ir para a tal de América. De facto nunca lhes passou pela cabeça terem de viajar naquelas condições tão horríveis, rumo a um destino que também nunca esteve no seu mapa e muito menos nos seus sonhos. Contrariamente ao que aconteceu com todos os outros emigrantes, os negros nunca sonharam com a América, nunca tiveram o tal de “American Dream”, mas cedo perceberam que aquilo era um tremendo pesadelo que iam ter de viver com os olhos bem acordados e com as costas sempre preparadas para tantas e tantas chibatadas que lhes estavam destinadas.

    Os negros foram forçados ir para lá trabalhar como escravos, arrancados à força dos seus quimbos por um comércio brutal feito por brancos mas também por outros negros, que nem sempre aparecem na história devidamente retratados, tendo em conta o seu verdadeiro papel/ responsabilidades nesta gigantesca conspiração/sangria contra a demografia africana e o progresso do continente.

    Depois do prolongado pesadelo americano, há 50 anos, em Washington diante 250 mil pessoas, Luther King sonhou alto e em bom som com uma América para todos. As suas palavras ecoam até hoje com o sabor da liberdade, tendo resistido incólumes ao passar do tempo pois estavam carregadas com a força transformadora e mobilizadora do sonho que segundo alguém disse, é quem comanda a vida. “Tenho um sonho, hoje. Tenho um sonho que um dia todo os vales serão elevados, todas as montanhas e encostas serão niveladas, os lugares ásperos serão polidos, e os lugares tortuosos serão endireitados, e a glória do Senhor será revelada, e todos os seres a verão, conjuntamente.”

    Como é evidente o sonho de King continua por se realizar na sua plenitude e provavelmente nunca o será, mas é esta a direcção de uma estrada que só pode ter sentido único. É por aí que devemos continuar a caminhar, como cidadãos de um mundo onde o racismo branco opressor dos anos 60 nos States, deu hoje lugar a outras segregações sociais e económicas tão violentas, mas certamente ainda mais devastadoras. ing estava concentrado na situação do negro norteamericano, sem perceber, talvez, que naquele momento ele estava a ter um sonho que iria ser partilhado por milhões de habitantes de outros países e de outras raças. Hoje, 50 anos depois, facilmente todos eles identificam com as suas palavras, porque a realidade, com outros matizes, lamentavelmente ainda é a mesma que aquela que inspirou, o célebre “I have a dream”. (opais.net)

    Por Reginaldo Silva

    Publicidade

    spot_img

    POSTAR COMENTÁRIO

    Por favor digite seu comentário!
    Por favor, digite seu nome aqui

    Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

    - Publicidade -spot_img

    ÚLTIMAS NOTÍCIAS

    TSE suspende julgamento de ações que pedem cassação de Moro por atos na pré-campanha em 2022; caso será retomado na 3ª

    O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) suspendeu nesta quinta-feira o julgamento das ações que pedem a cassação do senador Sergio...

    Artigos Relacionados

    Social Media Auto Publish Powered By : XYZScripts.com
    • https://spaudio.servers.pt/8004/stream
    • Radio Calema
    • Radio Calema