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    Luvu: Uma esperança para mercadores angolanos e congoleses

    O mercado transfronteiriço do Luvu tem registado, aos sábados, a presença de angolanos que vendem a grosso e a retalho mercadorias de produção nacional e de outros que compram vestuário, calçado, bijuterias, electrodomésticos, cremes, telemóveis e os distintos panos “Super-wax” de feirantes congoleses.

    Diariamente, mais de 100 camiões porta-contentores e normais, com cargas saídas maioritariamente de Luanda, percorrendo 557 quilómetros, chegam ao Luvu. Em menor número, outros automóveis transportam mercadorias de vários pontos do país.

    De acordo com camionistas, antes da proibição da reexportação de mercadorias, havia cargas que vinham da África do Sul, da Namíbia e de outros países para serem transaccionadas na República Democrática do Congo.


    VIDEO – MERCADO DO LUVU

    Um dos motivos que facilitam a chegada deste número elevado de camiões e outras viaturas é o asfaltamento de toda a estrada desde 2014 e o período festivo que se avizinha.

    Em contrapartida, para se chegar ao Luvu, é necessário superarem-se obstáculos, como o do Quilómetro 25, próximo da aldeia de Nkuanza, onde existe uma inclinação de até 10 porcento e têm ocorrido muitos acidentes. No local, são visíveis carcaças de carros abandonados, na sua maioria camiões.

    Em Janeiro de 2016, por exemplo, a circulação rodoviária ficou interrompida por mais de 24 horas, devido a um acidente que envolveu um camião com atrelado em direcção ao Luvu.

    Segundo camionistas, outros dos obstáculos são os inúmeros controlos antes da fronteira, uma vez que os agentes da Polícia Fiscal, Fronteiriça e de Trânsito inspeccionam cargas e pessoas. Tal situação deve-se ao facto de toda a fronteira do Norte de Angola, aliada à Lunda-Norte, registar os maiores números de imigração ilegal, com realce para o Zaire e Cabinda, ao contrário do Sul.

    Por exemplo, na última semana, oitenta e sete (87) congoleses foram repatriados a partir da província do Zaire, ao passo que, no Cunene, as autoridades policiais detiveram, em Abril último, seis estrangeiros, sem haver registos actuais.

    O camionista Mabengue Victor também alega que os controlos feitos pela Polícia são os maiores obstáculos para se chegar ao mercado do Luvu. Elogiou, em contrapartida, a melhoria da estrada para se chegar ao local, embora tenha trechos com o asfalto consumido.

    Perto do penúltimo controlo policial, na última curva para se divisar o Luvu, surge a retaguarda de um camião dos mais de 200 perfilados em mais de um quilómetro, à espera do dia e vez de entrar na RD Congo com cimento.

    Camionistas pouco pacientes com a situação lamentam o facto de ficarem dias à espera dos momentos apropriados para passarem, mas nem todos conseguem transpor.

    Ao pé do último controlo, nasceu um mercado que vende comida e bebida aos camionistas e a outros indivíduos forçados a acampar nas proximidades.

    Sobre esta situação, Manuel Diabanza, responsável pela área de contabilidade dos Serviços Aduaneiros do Luvu, declarou que as viaturas que estão parqueadas são as que transportam cimento e, de acordo com o cronograma de trabalho, não podem passar todos os dias. Os domingos, as segundas-feiras, as terças-feiras e as quartas-feiras são os dias apropriados para a passagem de veículos pesados que levam cimento.

    Para lá do penúltimo controlo, encontram-se mais camiões parqueados com outro tipo de mercadoria, aguardando apenas pelo licenciamento para entrar. Este processo pode ser rápido ou lento, em função da condição da documentação e da carga inspeccionada.

    Kislumeso Paulo, também camionista, disse que estava à espera que o despachante entregasse o licenciamento para poder entrar no Congo com a mercadoria.

    Por outro lado, exportadores que se encontravam no local alegaram haver demora propositada no atendimento.

    Emília Cabungula declarou que as autoridades aduaneiras prejudicam o trabalho, uma vez que, conquanto se constitua a documentação, ainda ficam muitas horas a aguardar pelo deferimento.

    “Somos capazes de ficar durante horas com a mercadoria aqui, sem a podermos movimentar, em virtude da demora no tratamento da nossa documentação”, fez saber outra exportadora que preferiu falar sob anonimato.

    As exportadoras explicaram, igualmente, que, para o licenciamento, pagam um porcento do valor de compra da mercadoria.

    Interrogado pela Angop, Manuel Diabanza afirmou não haver demora, mas, sim, irregularidades na constituição da documentação para formalizar o processo, por parte dos exportadores, e alguma dificuldade técnica por parte do Ministério do Comércio.

    “O que se passa é que o Ministério do Comércio tecnicamente tem alguma dificuldade na emissão de licenciamento e, por isso, muitos não conseguem tratá-lo a tempo, mas trazem os camiões à fronteira antes de terem os documentos emitidos. Esta fase de contactar o despachante para a solicitação da regularização alguns dias”, explicou o responsável pela contabilidade dos serviços aduaneiros.

    Manuel adiantou que o despachante contacta as Alfândegas para o deferimento dos documentos e todo este processo cria dificuldades.

    “Em função da demora, o proprietário descarrega a mercadoria, fragmenta-a e acaba por sobrecarregar o trabalho das autoridades aduaneiras, por se tratar de muitos volumes separados, o que leva a dar entrada a aproximadamente 250 solicitações/dia”, explicou.

    Ainda conforme Diabanza, além dos que transportam cimento, diariamente registam, em média, a chegada de 100 camiões com cervejas, refrigerantes, bebidas energéticas, fuba e outros produtos nacionais.

    “Após passar a fronteira, a mercadoria é empilhada em armazéns rústicos, onde se pagam 50 Kwanzas por grade, caixa ou saco. O preço varia de acordo com as dimensões da unidade”, acrescentou.

    Mercado do Luvu

    O frenesim estonteante, os odores fortes emanados das pessoas que, aos magotes, atravessam a fronteira da RD Congo para Angola e vice-versa, os bagageiros e a longa fila de camiões saltam à vista quando se chega ao mercado transfronteiriço do Luvu.

    O local torna-se mais desconfortante quando o sol atinge o zénite e os seus raios “agridem” tudo no local. A poeira provocada pela movimentação constante dos feirantes fica em suspensão, fazendo parte do ar respirado ou se misturando com o suor, o que forma uma nova camada na pele das pessoas.

    Os mercadores apelam a que se melhorem as condições de comercialização no mercado, através da colocação de bancadas, pavimentação e sanitários.

    Mabengue Tula Victor aconselhou que se retomassem as obras do mercado moderno do lado de Angola, no sentido de se dar aos frequentadores condições de venda e saneamento.

    Próximo da ponte usada por pessoas e automóveis (camiões, carrinhas, viaturas ligeiras e motorizadas com carroçaria), há vendedores de refrigerantes e cervejas que enganosamente apregoam: “olha a cerveja fresca”, “olha a água fresca”, “olha a gasosa fresca”. Ao comprar, dá-se conta que nada é fresco, apenas banhadas em água do rio, o que faz que a sede aumente.

    No lado do Congo, o regateio dos preços é feito em Francês, Kikongo ou Lingala, dificilmente em Português. Caso estas comunidades não se pudessem comunicar, estariam criadas as condições sociolinguísticas para o surgimento de pidgins (língua resultante de contacto entre línguas, não sendo língua materna de nenhum falante) e depois um crioulo qualquer…

    Em bancadas toscas de troncos de árvores cortadas ou sobre uma ligeira elevação no chão, são empilhadas as mercadorias para a venda. Actualmente, nota-se a ausência de alimentos perecíveis – óleo vegetal, grãos ou outro importado, devido à proibição da sua reexportação.

    Na parte congolesa, é visível vestuário, calçado, telemóveis, electrodomésticos, cremes e bijuterias. O maior destaque naquele lado são os panos, principalmente, os “Super-wax”. Nos dois lados, o franco congolês e o Kwanza são aceites.

    Uma muda de pano “Super-wax” simples custa entre os 4.500 e 5.000 Kwanzas, e a de composto “dois tempos” fica entre 5.500 e 6.500 Kwanzas.

    Em relação à cerveja, refrigerantes e bebidas energéticas angolanas, os preços variam conforme a cotação diária da moeda, mas podem ser regateados, segundo as habilidades de quem vende e de quem compra.

    No princípio deste ano, o administrador-executivo da Agência de Promoção de Investimentos e Exportações, Lopes Paulo, afirmou que as trocas comerciais entre Angola e a RD Congo no mercado do Luvu trariam benefícios à economia do país.

    A iniciativa de os dois países continuarem a trabalhar para um comércio organizado no local foi louvável e espera-se que esta venha a oferecer aos cidadãos produtos em segurança e de qualidade.

    Embora as autoridades aduaneiras e fiscais se recusem a falar dos valores arrecadados dos impostos e das vendas de mercadoria, sabe-se que são movimentadas somas avultadas no local.

    A comuna do Luvu, que dista 60 quilómetros a Norte da sede municipal de Mbanza Congo, capital da província do Zaire, existe desde a década de 80.

    Ponte dramática

    A entrada e saída do Congo por esta fronteira faz-se pela ponte metálica sobre o rio Luvu, com camiões que transportam elevadas tonelagens, carrinhas, motorizadas e pessoas que circulam simultaneamente.

    Em Junho de 2014, a antiga ponte sobre o rio Luvu desabou, devido ao excesso de peso de um camião que transportava materiais de construção para o Congo, mas foi substituída no mês seguinte.

    No período da manhã, a travessia ocorre de forma normal, apesar de centenas de pessoas que circulam nos dois sentidos. Em contrapartida, quando o mercado está no lado congolês, depois das 15 horas, o caos instala-se sobre a ponte.

    Como o “estouro de uma manada”, as pessoas, nos dois lados, no afã de deixar a parte estrangeira a tempo, caminham e encontram-se às centenas sobre a ponte. A força equiparada dos dois lados paralisa qualquer movimento. É uma experiência quase indescritível: homens, mulheres e crianças presas. Com os peitos comprimidos, a temperatura alta, os corpos empapados com suor, ninguém se move. Sufocos, desmaios e gritos de gente a ser pisoteada “emprestam” ao local um “espectro de morte”.

    Felizmente, a racionalidade apodera-se de uns poucos da turba “animalesca” e, agachando-se entre as pernas de outras pessoas e cargas, consegue “abandonar” o local e alertar as autoridades angolanas sobre o desastre.

    Com o aviso, os agentes da Polícia impedem outras pessoas de tentarem passar pela ponte e organizam a travessia. Paulatinamente, a movimentação fica desanuviada. Mas quem de lá sai fica quase sem voz, com o corpo tremente, roupa desfeita e bens pessoais como telefones e outros acessórios desaparecidos.

    Perante aquele cenário, um agente da Polícia disse: “É assim quando o mercado é do lado do Congo”. (ANGOP)

    Por: Ismael da Purificação

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