Num formato de “Presidência Aberta”, a Escola Superior Politécnica do Zaire, no Soyo, encheu-se ontem de jovens inquietos para questionar João Lourenço sobre o futuro das novas gerações.
Foi a última actividade de um dia que começou na fábrica de Gás Natural Liquefeito (LNG, em inglês), que ainda passou pelo projecto eléctrico do Ciclo Combinado.
O encontro, escreve o JA, foi moderado por dois jovens empreendedores, que fizeram, ao longo de quase duas horas, uma espécie de entrevista ao Presidente da República.
Mas o auditório nem sempre reagiu bem a este formato, sobretudo à repetição de perguntas sobre a vida militar e outros assuntos do percurso pessoal de João Lourenço – os representantes da sociedade civil, associações de estudantes, organizações partidárias e igrejas estavam mais interessados em colocar as suas preocupações.
Apenas no último momento a plateia foi chamada a intervir. E as perguntas foram, como quase sempre – mesmo noutras províncias – à volta das dificuldades ao nível da mobilidade (estradas e transportes), da Educação, do acesso à habitação para os mais jovens e mais pobres, do aumento do desemprego e da falta de oportunidades para melhorar as condições de vida.
A primeira questão centrou-se no facto de, nos últimos anos, terem sido lançadas diversas empreitadas que não foram terminadas, com especial enfoque no acesso à habitação e às centralidades construídas pelo Estado. João Lourenço lembrou que as “centralidades não são a única solução para a habitação no país”.
“O Estado tem a responsabilidade de construir principalmente habitação social e de realojar as pessoas que vivem em zonas de risco ou em más condições. Mas não será o Estado a construir habitações para todos, até porque não é possível.
O Estado deve desenhar políticas que promovam a resolução deste problema. É neste sentido que devemos trabalhar com a iniciativa privada para desenvolver o sector imobiliário. Uma terceira opção passa pelo envolvimento dos cidadãos, que também podem construir a sua habitação por via da auto-construção”, explicou.
Para agilizar o sector imobiliário, o Presidente da República referiu que, neste momento, a maior preocupação do Estado é incentivar a produção interna de materiais de construção. Desta forma será possível baixar os custos de construção, promovendo também a criação de empresas e de novos postos de trabalho.
Outra das grandes dificuldades para a juventude é o acesso ao emprego. Os questionamentos sobre este importante tema surgiram pela voz dos moderadores e também da plateia.
Para João Lourenço, que reconheceu o aumento do desemprego nos últimos dez anos, só o trabalho árduo e o empreendedorismo poderão minimizar o problema e diversificar a economia.
“Não há milagres. E julgo também que não devemos olhar apenas para um empregador. Trabalhar pode não significar ter um patrão ou trabalhar para o Estado. Tem de haver iniciativa e os cidadãos devem estar preparados para trabalhar em qualquer ponto do país. As pessoas devem ir atrás do emprego e não ficar à espera das oportunidades”, disse.
Ainda dentro do mesmo tema, o Presidente da República foi questionado sobre as dificuldades que o sector petrolífero enfrenta devido à baixa dos preços nos mercados internacionais.
Esta realidade, conjugada com a falta de condições de trabalho e os despedimentos na Base do Kwanda, tem prejudicado os trabalhadores do sector.
Também as denúncias à volta da escassez de combustível nas principais cidades da província do Zaire e a enorme oferta dos mesmos produtos junto à fronteira foram objecto de questionamento. A pergunta recebeu mesmo uma enorme salva de palmas do auditório.João Lourenço reconheceu que, para um país produtor de petróleo, “a escassez de produtos refinados não é aceitável”.
E recordou que o problema essencial está na falta de produção interna e na dependência das importações. “Como se não bastasse, parte desses produtos importados são revendidos nos países vizinhos. O comércio fronteiriço é para continuar, mas precisamos de regular estas questões”, prometeu.
Em relação ao sector da Educação, as preocupações centraram-se na Universidade 11 de Novembro e no facto daquele estabelecimento de ensino superior público não ter professores suficientes, nem material pedagógico para atender as necessidades.
Na área das engenharias, os alunos são formados com recurso a imagens e sem actividades práticas. Também não existem estágios curriculares.
Aposta nos jovens
Ao longo do encontro, João Lourenço procurou elogiar e motivar as novas gerações. Muitas empresas e organizações alegam que a pouca aposta na juventude resulta da sua falta de experiência de vida e profissional.
O Presidente da República não concorda com esta perspectiva e reafirmou a aposta pessoal na renovação do quadro técnico e político da administração pública e do próprio Governo. “Em primeiro lugar, os jovens devem apostar nos estudos e em ser um bom estudante.
Depois a experiência ganha-se. É verdade que tenho escutado alguns comentários negativos em relação à aposta que temos realizado, mas confesso que não liguei a isso”, disse o Chefe de Estado.
“Ninguém é super-homem e os jovens devem acreditar em si próprios. Olho para a juventude angolana com muito bons olhos. Nos momentos mais decisivos da história foram, sem sombra de dúvida, os jovens que asseguraram o país. Os jovens libertaram a Nação e asseguraram a soberania com enormes sacrifícios”, reconheceu João Lourenço.
Ao longo das quase duas horas de presença no auditório, o Presidente da República demonstrou boa disposição e chegou a arrancar gargalhadas da plateia. Explicou que não gosta que o tratem pelo nome completo e que prefere apenas João Lourenço.
Também sorriu quando demonstrou conhecer a forma como algumas pessoas lhe chamam em ambientes mais informais. “Desde a campanha eleitoral para as eleições gerais de 2017 que o meu nome reduziu ainda mais”, disse, numa referência clara ao diminutivo JLo.
Energia
Durante o dia de ontem, a comitiva presidencial também aproveitou para conhecer as instalações do Ciclo Combinado do Soyo, que está a produzir 375 megawatts de energia.
Cerca de três milhões de consumidores de dez províncias (Zaire, Luanda, Bengo, Uíge, Cuanzas Norte e Sul, Huambo, Bié, Benguela e Malanje) beneficiarão, até Setembro, de energia eléctrica produzida pela nova central.
Das seis turbinas instaladas, três já estão concluídas e operacionais. A central do Ciclo Combinado do Soyo é composta por dois blocos constituídos por duas turbinas a gás cada, duas caldeiras de recuperação de calor e uma turbina de vapor, sendo que cada bloco tem uma capacidade total de 375 MW, perfazendo um total de 750 MW quando atingir o máximo da produção, prevista até ao final do ano.
O projecto é coordenado pelo Gabinete de Aproveitamento do Médio Kwanza (GAMEK), em representação do Ministério da Energia e Águas.
Para que a capacidade da nova central seja totalmente aproveitada, é necessário investir nas redes de distribuição em áreas ainda não ligadas à rede nacional de energia eléctrica.
Fábrica Angola LNG recupera produção de gás no país
Depois de um incidente que resultou em prejuízos financeiros e na paralisação, entre 2014 e 2016, da fábrica de gás natural liquefeito, Angola LNG, localizada no município do Soyo, província do Zaire, a infra-estrutura está a recuperar a capacidade produtiva e pode atingir os 5,2 milhões de toneladas métricas durante o presente ano.
Os números foram avançados pelo director-geral da empresa, Gordon Murray, durante a visita de João Lourenço e respectiva equipa governamental.
“Neste momento acabamos de carregar o navio Sonangol Lobito com 158 mil toneladas métricas de gás natural liquefeito para exportação”, disse o gestor.
Gordon Murray não especificou o destino final dos carregamentos e disse apenas que o LNG saído do Soyo será distribuído “por todo o mundo”.
Com um investimento de 12 mil milhões de dólares, o projecto Angola LNG foi construído para aproveitar os recursos de gás natural do país e é um dos maiores empreendimentos alguma vez realizados no sector de petróleo e gás em Angola.
O projecto é o resultado de uma parceria entre a Sonangol, Chevron, BP, ENI e Total. A empresa dispõe de uma frota permanente de sete navios tanque e três terminais de carregamento (LNG, líquidos e butano comprimido) e a missão do projecto é minimizar a reinjecção e queima de gás, bem como fornecer energia limpa e fiável.