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    Os angolanos começam a ter poupanças

    (OPAIS)
    Fernando Teles (OPAIS)

    Fernando Teles presidente do conselho de administração do Banco BIC, com a frontalidade e o desembaraço que o caracterizam, fala do crescimento daquela que é uma das primeiras cinco instituições financeiras angolanas, as quais dominam claramente o mercado. Explica o porquê e o como do BIC Angola ser um dos três bancos nacionais a constar entre os 1,000 maiores do planeta e o único, com capitais predominantemente nacionais, a encetar uma significativa expansão externa. Detém-se também sobre o sistema bancário angolano. Acha que há bancos a mais e sublinha que o BIC está atento às oportunidades, inclusive se surgir a da privatização do segundo banco público. Aliás, insiste, o banco tem liquidez que baste, tem fundos próprios de USD 820 milhões e, nesta posição, tem de estar aberto e muita atento às oportunidades. Como as que se colocaram em Portugal, Brasil, Cabo Verde, Namíbia e África do Sul. Revela também porque e como o BIC participa na primeira operação de convertibilidade externa do kwanza. E revela muito mais.

    Foi fundador do Banco BIC e é um dos accionistas de referência. Acabou de receber o prémio Sirius que consagrou o BIC como ‘a melhor empresa do ano do sector financeiro’. Que sentimento é que isso lhe suscita enquanto fundador e presidente do banco?

    Receber um prémio é sempre bom, seja ele qual for. A verdade é que nós, o ano passado e um pouco ‘contra a corrente’, fomos dos bancos que em vez de reduzir os resultados líquidos aumentou os resultados líquidos. Note-se que uma parte dos grandes bancos diminuiu os resultados relativamente ao ano anterior. Além disso, somos dos bancos mais capitalizados em Angola, somos dos bancos com maiores fundos próprios em Angola. E daí talvez a atribuição do Prémio Sirius. Estamos satisfeitos por o ter recebido mas temos de prosseguir o nosso caminho. O que é preciso é no dia-a-dia e na prática fazer crescer os depósitos, o crédito, os resultados.

    Quais são as perspectivas de resultados este ano?

    Vamos chegar aos resultados que foram orçamentados, vamos subir os resultados relativamente ao ano anterior.

    Para quanto?

    O resultado do ano anterior, em termos líquidos, foi de USD 168 milhões. Esperamos que o resultado deste ano seja superior.

    Mas superior em quanto?

    Não tenho ainda os números definitivos até porque, como sabe, até ao final do ano há sempre algumas regularizações que se fazem, há provisões que se criam ainda até lá, muito embora a banca feche a contabilidade todos os meses, crie provisões todos os meses. Não posso dar um número até ao final de Dezembro.

    E em relação aos outros indicadores como a rentabilidade dos activos. O BIC é dos três bancos angolanos que figuram entre os 1.000 maiores do mundo, elaborada por The Banker, e regista mesmo um excelente lugar no que respeita à rendibilidade líquida dos activos (o chamado ‘Return on Assets – ROA), o 78o lugar. Como é que se conseguiu este desempenho?

    Tem a ver com duas coisas. Temos que, por um lado, crescer em depósitos, em crédito concedido, obter resultados mas, além disso, a nossa posição em África tem também a ver com os fundos próprios. O que acontece é que nós Banco BIC, durante os primeiros quatro anos, não distribuímos resultados aos accionistas e não temos seguido uma política agressiva de distribuição de resultados. Ou seja, nós só distribuímos resultados depois do quarto ano de actividade e só temos estado a distribuir 40% dos resultados, os restantes 60% têm servido para aumentar a situação líquida através de reservas e de resultados transitados. E isso faz com que tenhamos solidez e tenhamos condições para continuar a investir em outros projectos, incluindo projectos a nível da banca.

    Como têm evoluído os depósitos?

    Fechámos Dezembro de 2012 com USD 5,7 mil milhões e fechámos ontem (esta entrevista foi realizada Segunda-feira 16 de dezembro) com USD 6,6 mil milhões em depósitos.

    E qual é a ponderação nos depósitos entre a moeda nacional e a moeda estrangeira?

    É mais moeda nacional. Esta deve ter entre 60% a 65% dos depósitos. A moeda nacional ganha, cada vez mais, à moeda estrangeira.

    E quanto ao crédito?

    Fechámos ontem com USD 5,9 mil milhões em crédito. Cerca de metade é crédito às empresas e a outra metade é crédito ao Estado.

    Porque é que há tanta gente a queixar-se da dificuldade de aceder ao crédito?

    Eu também me queixo muito dos clientes que não pagam ao banco mas isso é outra história…

    Têm muitos processos em tribunal?

    Não, há muita burocracia para que um processo decorra em tribunal e seja despachado. Temos alguns processos, não muitos, que estamos a procurar negociar com os clientes, estamos a aceitar dações em pagamento. Posso dar um exemplo: houve um empresário de construção civil que teve um problema com o sócio angolano e abandonou o mercado. Ficámos com o empreendimento e a nossa empresa na área imobiliária está ela própria a fazer as vendas. Preferimos isto a ir para tribunal e ficar à espera, é uma solução que não é fácil. Além disso, como os contratos que tínhamos com as empresas englobavam uma hipoteca e uma procuração irrevogável nego- ciámos com o próprio empresário.

    Já houve alguma conclusão de um processo em tribunal, alguma sentença?

    Não houve. Também temos poucos processos em tribunal.

    Há a ideia de que os maus pagadores são-no em vários bancos…

    Felizmente os maus pagadores começam hoje a ser referenciados através da Central de Riscos (do BNA). Só que há três anos não havia central de riscos, há muitos créditos que foram constituídos há quatro, cinco, seis, sete anos e que os bancos não sabiam que as pessoas tinham crédito noutros bancos e que, às vezes, tinham crédito malparado noutros bancos. Nós não somos dos bancos que se podem queixar mais, temos provisões para o crédito malparado que temos mas estamos atentos e temos uma Direcção só para a recuperação de crédito. Quando os comerciais têm dificuldade em fazer os maus pagadores cumprirem, entra uma outra área, com mais força ainda, um pré-contencioso, antes da área jurídica e do tribunal.

    Mas não vou esconder-lhe que há muitas pessoas em Angola, que vestem bem, têm bons carros, boas casas e se esquecem de pagar aos bancos. Há muitos desses. As pessoas humildes pagam aos bancos, as pessoas que aparentam ter muito dinheiro, às vezes não têm tanto dinheiro assim e se o têm são vigaristas e, enquanto tal, andam sempre a fugir dos bancos. Não só do BIC como dos outros. Esta é a realidade. Mas agora, com a Central de Riscos, começámos a detectar quais são as pessoas más pagadoras. O que lhes vai acontecer é que não conseguem obter crédito em lado nenhum e o cerco começa a existir.

    Acaba de corroborar a ideia de que no microcrédito há muito menos incumprimento…

    No microcrédito também há muito malparado. Não é uma questão de microcrédito. É que as pessoas mais pobres sabem o que custa obter um pequeno crédito, pois, por vezes, as pessoas não confiam nelas, não têm bens, enfrentam dificuldade em obter crédito. A partir do momento em que há uma prova de confiança por parte do banco farão tudo para pagar. Só não pagam se houver uma situação de má aplicação do dinheiro, a qual não gerou o rendimento que lhe permite pagar ao banco.

    Os vossos protocolos com o BNA quanto à possibilidade de abrir conta com Kz 100 e a substituição do BI por qualquer outro documento estão a resultar?

    Têm permitido uma maior bancarização das pessoas.

    E têm-se repercutido nos depósitos?

    As pessoas que não têm dinheiro não têm dinheiro para depositar. Cem Kwanzas não é dinheiro significativo. Não vou esconder que, a nós bancos, interessa-nos mais os clientes dos centros de empresas, as empresas grandes, os clientes de private banking, mas temos de viver com todos. Temos 900 mil clientes.

    Na estrutura dos depósitos ainda há uma grande concentração nos depósitos à ordem ou tem-se evoluído em termos de prazos mais dilatados?

    Neste momento já os depósitos a prazo ultrapassam os depósitos à ordem. O que quer dizer que os angolanos começam a ter poupanças e a guardar nos bancos o dinheiro que têm, fazendo aplicações em depósitos a prazo, ou em títulos, em OT ́s (Obrigações do Tesouro), naquilo que houver disponível.

    A inflação está a descer consistentemente, assim como as taxas de juro. O BNA baixou recentemente de forma significativa (250 pontos base) a taxa de referência e a LUIBOR tem vindo a descer. O BIC está a seguir a LUIBOR na indexação das taxas de juro praticadas?

    Está, a LUIBOR já é a nossa taxa de referência para o crédito. Mas ainda recentemente lançámos uma linha de crédito para os funcionários públicos com uma taxa de 9% em Kwanzas, o que está abaixo da LUIBOR em determinados prazos. Não indexámos à LUIBOR, trata-se de uma taxa fixa, queremos ter mais funcionários públicos como nossos clientes. Por outro lado lançámos o produto para ajudar os funcionários públicos na resolução dos seus problemas de crédito.

    O crédito tem crescido abaixo dos depósitos. Admite que, com a descida das taxas de juro, possa haver também uma subida do crédito? A taxa de crédito à economia não é muito elevado, como sabe…

    Sim, a taxa não é muito elevada mas posso dizer que estamos com quase USD 3 mil milhões em crédito. Crédito às empresas. E não aprovamos mais porque também não aparecem projectos credíveis. Basta olharmos para a cidade de Luanda e observarmos as construções, de todo o tipo, que há, as lojas que estão abertas… isso não é feito com fundos próprios, é feito essencialmente com recurso ao crédito bancário.

    Que tem estado concentrado na construção e no comércio… Na indústria e na agricultura há queixas muito sérias…

    As queixas continuam a ser as mesmas. Eu sou agricultor e posso falar com conhecimento de causa. Na agricultura, ou se tem equipas muito boas ou dificilmente se tira rentabilidade. A agricultura precisa de crédito bonificado, como já foi lançado, pois se não for com crédito bonificado dificilmente as pessoas conseguem tirar rentabilidade da agricultura. Sendo assim a maior parte dos bancos foge da agricultura. O BIC tem bastante crédito na agricultura, uma parte até com algumas dificuldades pois tratou-se de projectos grandes que não se conseguiram rentabilizar de imediato. Apoiámos, por exemplo, uma empresa produtora de algodão e as primeiras colheitas não têm sido grande coisa. Mas também apoiámos uma grande fazenda que tem 7.000 ou 8.000 cabeças de gado e também tem registado algumas dificuldades. Isso não significa que não apoiemos a agricultura pois achamos que, quando não houver petróleo, a agricultura e a pecuária vão ser a solução. Para isso temos de começar já a fazer investimentos nessas áreas. Mas temos de ter todos a certeza de que não é fácil na agricultura e na indústria rentabilizar os projectos, pois tanto uma como outra são sectores de capital intensivo, que têm de contar com profissionais de alto gabarito, ‘know-how’. Gente que faça andar os projectos. Não foi por acaso que Angola, que herdou muitas indústrias em 1975, chegou ao ponto de as ver desaparecer em grande parte. Na verdade, na indústria ou na agricultura é mais difícil que no comércio.

    É nesta leitura que o BIC assenta a expansão em Angola?

    Somos hoje a maior rede bancária privada em Angola. Temos 206 balcões e a seguir ao banco público, o BPC, somos o maior banco em Angola em número de balcões.

    Isso quer dizer que estamos a abrir em municípios onde nem sequer há rentabilidade. Onde há pouca rentabilidade, há poucos depósitos, há pouco crédito. Mas é uma forma nossa de ajudar o país a crescer e também fazer com que empresários regressem às suas terras, regressem aos seus municípios, porque, entretanto, vêem que está lá um banco a instalar-se e isso é positivo. Com custos operacionais elevados mas isso valoriza o nosso contributo para o crescimento do país. Os bancos, desde que tenham rentabilidade na rectaguarda, têm de fazer este esforço.

    O BIC, como refere, tem reforçado a sua presença no mercado angolano. Vai continuar a crescer essencial- mente com fundos próprios? É que, feitas as contas, metade do crédito está praticamente nas mãos de dois bancos, o BESA e o BPC…

    O BESA e o BPC?

    Sim, no mercado de crédito, segundo dados do final de 2011.

    Crédito à economia? Não é verdade. O BESA o que tem é crédito ao Estado. Nós também temos USD 3 biliões de crédito ao Estado. Nós temos mais crédito á economia, crédito às empresas, somos o terceiro banco em crédito e temos, por exemplo, mais depósitos do que tem o BESA. O BESA tem mais crédito porque trouxe dinheiro de uma offshore e aplicou-o em Angola. Temos hoje em fundos próprios USD 820 milhões. Precisamos para ter um rácio de solvabilidade normal de cerca de USD 420 milhões. Temos o dobro do capital que necessitamos.

    Em todo o caso, quererão reforçar a vossa posição. Pergunto-lhe se admite alguma aquisição de outra instituição no mercado angolano, designadamente tendo em conta a possibilidade de o BPC ser privatizado, se admite listar o banco no mercado de capitais quando este arrancar na sua vertente acionista e se admite pedir o rating para o banco, mesmo tendo em conta o tecto do rating soberano.

    São tudo hipóteses e, enquanto tal, admito tudo.

    Mesmo adquirir o BPC se for colocado à venda?

    O BPC não vai estar à venda. Angola precisa de um grande banco público e com certeza que o banco público vai-se manter. Não acredito que o BPC vá ser vendido. Se me dissesse que não há necessidade de um segundo banco público, que é caso do BCI… Mas essa é uma questão de que as entidades públicas é que sabem, não sou eu que sei disso.

    Se houver privatizações de instituições financeiras, designadamente bancárias, o BIC estará na corrida?

    Se houver privatizações olharemos para os dossiês, é normal. Quem está no mercado e tem liquidez tem que ir olhando para as oportunidades que aparecem. Acho que 23 bancos são bancos a mais, não defendo que não se autorize novos bancos. O que defendo é que os bancos que têm dificuldades e que não conseguem cumprir com os rácios fixados pelo banco central ou aumentam o capital ou então procuram outra solução.

    Estão a entrar no mercado grandes instituições internacionais. Isso irá suscitar um processo de fusões no nosso mercado bancário?

    Até pode não acontecer mas é natural que suceda.

    A segunda questão: o mercado de capitais. O BIC poderá listar-se?

    O Banco BIC já teve, há uns anos atrás, uma oferta de um banco suíço que analisou os números do BIC e queria que nós vendêssemos 25% na praça de Londres. E posso dizer que, do ponto de vista dos accionistas, o banco tinha sido muito bem avaliado e os 25% valiam muito dinheiro. Os accionistas consideraram que ainda não era altura de abrir o capital, temos condições para aguardar pela abertura da Bolsa em Angola e pode acontecer que então venhamos a vender algum capital na Bolsa. Mas não temos tido necessidade de nos capitalizar. Se a tivéssemos já tínhamos aberto o capital. Os próprios accionistas têm capitalizado o banco através da não distribuição de resultados e por isso estamos calmamente à espera que a Bolsa abra para então analisarmos.

    Mas o BIC vai entrar logo no início da abertura do mercado de acções da Bolsa?

    Não está garantido. Se me disser que a Bolsa vai abrir, mas não vai abrir com liberdade de circulação de capitais, isto é, os estrangeiros não podem vir investir na Bolsa e não podem entrar com o seu capital e sair com o seu capital livremente. Se isso acontecer a Bolsa não terá dimensão e se não a tiver não sei se vale a pena entrarmos na Bolsa. Não é por acaso que estamos há muitos anos à espera que a Bolsa abra em Angola. As autoridades sabem que a Bolsa para ter êxito tem de ser aberta ao exterior. Restringida a empresas angolanas, não aberta a investidores externos não é uma Bolsa é uma ‘Bolsinha’. Aí mais vale, se quisermos vender capital, chamar um dos candidatos, e há muitos candidatos à compra do capital do BIC, há muitos clientes nossos que gostariam de entrar no capital do banco, e dizer: ‘você quer entrar no capital, estão aqui tantos por cento para ser vendidos’.

    A estrutura accionista do banco mantém-se a mesma?

    Mantém-se mas pode haver uma altura em que qualquer accionista decida abrir o capital. Mas temos oito anos e meio de actividade e a estrutura accionista é a mesma.

    Quanto ao rating. Há alguma possibilidade de o BIC pedir uma notação? Isso é o normal e o natural.

    O tecto da dívida soberana não é limitativo?

    Para haver rating para uma empresa em Angola o mais importante foi que Angola também passou a ter rating. A seguir, naturalmente, as empresas também vão ter rating. Mas só faz sentido ter rating quando se está na Bolsa. Se não estivermos na Bolsa o rating não tem interesse nenhum.

    O rating serve essencialmente para que quem compra as nossas acções saiba como estamos classificados em termos de posição.

    Ajuda na obtenção de recursos externos…

    Obviamente ajuda. Se nós precisássemos de crédito a nível externo ou se estivéssemos na Bolsa seria natural que já estivéssemos notados. Na verdade, os bancos são escrutinados e analisados pelos auditores, internos e externos, todos os anos e, logicamente, quando, por exemplo, recebemos o prémio Sirius acabamos por ter um rating. O que é que acontece? Eles olham para os indicadores do banco, vêem se são bons ou não, melhores que os outros ou não, e, com base neles decidem. É um rating! Por sinal, liderado por uma das empresas de auditoria e de consultoria que é a Deloitte. Mas, no exterior, os ratings são fixados por algumas empresas a nível internacional, que nem sempre acertam. Como sabe, alguns dos bancos que foram à falência há uns anos tinham um rating muito bom na véspera da falência. O rating é fixado com base em determinados indicadores e se estes, à partida, estiverem aldrabados o rating será fixado de forma não muito normal. E todo o caso, o caminho normal é que nós venhamos a vender capital em Bolsa, que venhamos a ter rating.

    A rede bancária em Angola está a expandir-se. Uma questão que diz respeito a quem entra nos bancos no dia-a-dia: como avalia a qualidade do profissional bancário?

    Temos de fazer um grande esforço. Ainda hoje tive mais uma reunião de quadros, onde estiveram todos os gerentes, os directores, os elementos directivos e, do início ao fim falei em qualidade, qualidade, qualidade, boa prestação de serviço, bom desempenho. Temos uma equipa muito jovem, temos uma média etária de cerca de 28 anos, o que é uma vantagem, mas, por outro lado, por vezes, esses jovens, que às vezes já são gerentes, nem sempre fazem tudo bem. A juventude não é defeito. Comecei a trabalhar na banca com 14 anos de idade cá em Luanda e eramos muito os jovens a trabalhar no banco e não era por isso que este não tinha qualidade. Os responsáveis é que têm de estar atentos e coordenar essas equipas. Estamos a mandar muitas pessoas a Portugal, os quadros todos, a nível directivo, já foram a Portugal estagiar, durante uma se- mana ou duas receberam formação, e agora estamos na fase de também virem os quadros de Portugal cá estagiar e trazer a sua experiência. Durante o ano de 2013 passámos de 1.700 trabalhadores para 1.900 mas saíram para outras instituições 70 ou 80 trabalhadores. Sempre que chego ao aeroporto vejo alguém dos meus quadros na alfândega, jovens que já trabalharam comigo.

    O BIC tem feito uma campanha publicitária forte no que respeita ao facto de ter passado a comercializar Kwanzas nos seus balcões no exterior, designadamente em Portugal. Em que consiste de facto essa operação?

    Essa operação foi feita a pedido do senhor Governador do BNA que acha que é importante que o Kwanza também comece a ter cotação lá fora. Nós estamos numa situação em que o país está estável e com certeza que o angolano também se sente orgulhosos em poder levar Kz 50 mil para o exterior e chegar lá e poder trocá-los, se quiser, por euros. Do mesmo modo, há empresários que vêm a Angola e que, em vez de trazerem euros ou dólares, trazem Kwanzas, que podem utilizar mal chegam ao aeroporto.

    O câmbio de Kwanzas está limitado a esses Kz 50 mil?

    Há pessoas que perguntam se estamos limitados a trocar Kz 50 mil. Não, não estamos, não há limite nenhum para a compra de Kwanzas. O senhor pode ir com a sua família toda, se forem dez pessoas já são Kz 500 mil. Nada impede que vá individualmente trocar Kz 500 mil.

    Já é possível abrir contas em Kwanzas no BIC Português?

    Ainda não está previsto a abertura de contas em moeda nacional no exterior mas está prevista a mudança da moeda. Mas o caminho é esse. Tem que se começar por algum lado. Começou por se transacionar a moeda. A seguir, desde que haja confiança, o caminho a seguir vai ser abrir contas em Kwanzas.

    E qual tem sido a adesão ao produto ‘comercialização do Kwanza no exterior’ até agora?

    É um produto que está a começar. Arrancámos com um balcão, já estamos a fazer a transacção em 20 balcões, obrigou-nos a fazer algum investimento, a comprar uma máquina que reconheça se a nota é falsa ou verdadeira.

    Só aceitam novas notas…

    Só aceitamos as novas notas de Kwanza, que são mais fiáveis, mais fáceis de detectar em termos de segurança. As notas antigas estão a entrar em desuso, cada vez mais há notas novas no mercado.

    Esta operação também significa que há confiança de que a política de estabilidade cambial irá prosseguir?

    Confio na política do banco central. Também os empresários e as pessoas idóneas em Angola confiam no Banco BIC e em mim próprio. Já fiz dois bancos em Angola, qualquer deles se não foram líderes de mercado estavam próximo disso. O anterior banco donde saí, quando saí era líder de mercado. Abri o balcão do Huambo quando ainda aterrava em espiral e não havia mais nenhum banco privado no Huambo. As pessoas tinham medo de ir ao Huambo, de abrir agência no Huambo. É uma questão de acreditarmos ou não. Cresci em Angola, é um país com potencialidade, é um país com um bom povo, é um país com todas as hipóteses de crescer desde que as pessoas ajudem. Faço parte desse grupo que ajuda.

    Neste negócio é necessário ser-se audaz…

    Tem que se arriscar. O risco é a base. Se não tivesse arriscado nunca tinha saído de Luanda, nunca tinha aberto balcões nas províncias. Era mais cómodo. Mas não tinha crescido como cresci.

    Referiu que o facto de só distribuírem uma parte dos resultados ou não ter havido distribuição inicialmente reforçou a situação líquida, o que vos deu condições para investir noutros projectos e noutros locais. Esses investimentos têm sido concretizados com fundos próprios? Os fundos próprios têm servido mais de ‘almofada’ e de volume para que possamos ter sustentabilidade do que propriamente para investir noutros sítios. O nosso investimento em Portugal e Cabo Verde é feito pelos próprios accionistas, não é feito pelo banco. Os bancos BIC em Portugal e Cabo Verde são bancos autónomos, muito embora tenham os mesmos accionistas, a mesma imagem. No Brasil não sabemos se será o BIC Angola que vai entrar, é possível que seja, mas temos a alternativa, caso não seja o BIC Angola, de serem os accionistas. De qualquer forma o banco acaba por funcionar como grupo e, nos vários sítios, com a mesma imagem e a mesma gestão. Em termos globais, o PCA acaba por ser o mesmo em todo o lado.

    Poderá haver entrada de capital local em cada um desses países?

    Não há entrada de capital local. São os accionistas que têm, por vezes, entrado, com base nos seus resultados. Têm uma distribuição anual de 40% dos resultados e com eles fazem o que quiserem, e esses dividendos têm servido para investir nesses locais individualmente.

    No caso do Brasil, o BIC concluiu, em final de Setembro, a aquisição de 96,78% do capital social da Sociedade BPN Participações Brasil, que detém 99,99% do capital do BPN Brasil Banco Múltiplo, por € 12,3 milhões. Onde ficou o capital residual?

    Nós comprámos tudo. Só não comprámos a totalidade ao governo português via Parvalorem (uma sociedade que gere participações públicas portuguesas) dado que o BAI Angola tinha uma participação que lhe comprámos. Mas realizámos a escritura de compra ao governo português e ao BAI no mesmo dia e à mesma hora. Muito embora o projecto do Brasil ainda não esteja concretizado. Juntamente com o vendedor reunimos com o banco central do Brasil e agora estamos à espera que os aspectos burocráticos da autorização sejam concluídos.

    Este crescimento faz-se fundamentalmente em países de língua portuguesa…

    Nesta fase sim, ainda que, neste momento, aguardemos que o banco central da Namíbia nos autorize a abertura de um banco no país e estamos a abrir um escritório de representação na África do Sul, que já está autorizado. A nossa ideia é de avançar para alguns países em volta de Angola.

    E não põem a hipótese de adquirir posições noutros bancos?

    Acontecerá o que estiver no mercado. Se for mais fácil fazer uma aquisição faremos uma aquisição, se for mais fácil propormos um banco novo proporemos um banco novo. Na Namíbia propusemos um banco novo.

    Quando falámos as primeiras vezes sobre o vosso projecto para Cabo Verde disse-me que o BIC estava mais interessado numa plataforma de negócios para o BIC Angola e BIC Português. Agora fala num banco de retalho. Isso significa a aquisição de uma outra instituição cabo-verdiana?

    Não necessariamente. Quando falo em retalho é porque sei que há um projecto que está a ser debatido na Assembleia Nacional de Cabo Verde e que já foi aprovado pelo governo do país que prevê transformar os IFI (instituições financeiras intermediárias) em bancos comerciais. Se as instituições financeiras internacionais puderem fazer banca comercial nós estamos abertos a fazer retalho, mais vocacionado para as empresas que para os particulares.

    O mercado cabo-verdiano tem suficiente dimensão para ser atractivo?

    A economia cabo-verdiana não é uma grande economia, mas é uma economia com que simpatizámos.

    É um país de língua portuguesa, é um país que tem uma economia a caminhar bem. Está como ministra das Finanças em Cabo Verde a ex representante do Citibank aqui em Angola, que é uma pessoa que nós conhecemos e que nos tem incentivado a abrir em Cabo Verde e a fazer investimentos.

    Mas não haverá muita captação de depósitos… Costuma dizer que um banco não cresce de forma sustentável se não capitalizar os depósitos…

    Em Cabo Verde até há captação de depósitos. O problema de Cabo Verde é que não tem onde colocar os depósitos dos emigrantes. Em Cabo Verde cerca de 50% dos depósitos são dos emigrantes e não onde colocar. Ao contrário do que as pessoas pensam a banca cabo-verdiana tem grande liquidez, o problema é que essa liquidez não consegue ser colocada porque não aparecem projectos em Cabo Verde que solicitem crédito onde essa liquidez seja aplicada.

    A estratégia para Cabo Verde passa por parcerias com empresas angola- nas eventualmente interessadas em investir em Cabo Verde?

    Já há outros bancos em Cabo Verde. O BAI, por exemplo, está com uma operação comercial com alguma dimensão no país. Para já comprámos uma IFI que se destina funda- mentalmente ao apoio ao BIC em Angola e Portugal, mas se avançarmos para a área comercial temos que essencialmente para apoiar os grandes empresários que já operam em Cabo Verde e apoiar as empresas angolanas ou portuguesas, que já conhecemos dos nossos bancos e que também tenham negócios com Cabo Verde. O Senhor Presidente da República esteve cá em Angola, e eu estive a almoçar com ele juntamente com outros empresários angolanos. Aquilo que nos foi pedido foi que o ajudássemos a que houvesse investimento novo em Cabo Verde. Estamos abertos a isso.

    Está então aberta a possibilidade de não se ficarem unicamente pela área financeira?

    Para além da área financeira pode haver o apoio a outro tipo de negócios. Mesmo que não estivéssemos directamente em Cabo Verde podíamos eventualmente fazer alguma operação a nível internacional. Os bancos angolanos por vezes fazem operações no exterior. Mas é normal que lá estejamos.

    Continuará, em todo o caso, o banco de Cabo Verde a funcionar como uma plataforma offshore?

    Não diria offshore porque Cabo Verde não tem offshore. Cabo Verde chama-lhe instituição financeira internacional.

    O BIC tem uma posição muito forte em Angola, é um dos cinco maiores bancos. Está em Cabo Verde, vai estar na Namíbia, na África do Sul… Isso significa que o BIC tem uma estratégia continental?

    Nunca pensámos propriamente em ser um grande banco em África. Pensámos é que deveríamos olhar para os mercados dos países que estão próximos de nós, e esses são os países de língua portuguesa e para os que estão próximos de Angola e têm relações com Angola. Devemos olhar para esses mercados e se houver oportunidades devemos aproveitá-las. Não estou preocupado em chegar à Argélia, ou à Tunísia ou a Marrocos.

    Falemos da operação portuguesa. O BIC Português obteve em Outubro um resultado líquido positivo de € 320 mil, recuperando de um acumulado negativo de € 850 mil nos primeiros 9 meses do ano. Só em Setembro o banco gerou € 600 mil positivos. O que aconteceu em Setembro que explique esta viragem, este ‘turning point’?

    O BIC Português, desde que tomámos conta do BPN, duplicou os depósitos. O BPN tinha 1,8 mil milhões de euros de depósitos, nós tínhamos mais cerca de 300 milhões de euros no BIC Português, o que somava a 2,1 mil milhões, hoje estamos com 3,8 mil milhões de euros em depósitos. Quanto ao crédito já aumentou 1,2 mil milhões e estamos a fazer operações novas. Temos muitas operações autorizadas que ainda não foram utilizadas mas vão sê-lo nos próximos dias. No que respeita aos resultados tivemos que fazer face a algum crédito malparado quando tomámos conta do BPN, tivemos que fazer provisões, e estas geram resultados não positivos. Tínhamos também a questão de algumas aplicações na dívida portuguesa, que também estava a confrontar-se com algumas dificuldades e depois tinham de se criar imparidades…

    Quanto é que tem o BIC Português em dívida portuguesa?

    Os principais bancos portugueses têm entre 4 a 5 biliões de euros de dívida portuguesa, nós temos pouco mais de 500 milhões de euros. Não é significativo para o nosso balanço. A dívida portuguesa é mais um produto, da mesma maneira que, aqui em Angola, a dívida do estado é mais um produto. Relativamente a Portugal estamos na fase em que estamos a sair do vermelho, estamos a começar a ter resultados positivos. Cada vez vão crescer mais, não lhe vou esconder. A nossa projecção é que este mês de Novembro os resultados vão ser muito maiores dos que apontou relativamente a Outubro e, em Dezembro, vão ser mais ainda. Devemos chegar ao final do ano com entre USD 2,5 milhões e USD 3 milhões de resultados positivos.

    De acordo com o que estavam à espera ou a evolução está a exceder as vossas expectativas?

    Do que estávamos à espera a partir do final do primeiro semestre. Quando tomámos conta do BPN a nossa expectativa era de que nos primeiros dois anos teríamos resultados negativos. Chegámos aos resultados positivos ao fim de 18 meses. Precisamos de crescer em crédito. Temo-lo feito, o crédito tem subido, embora não tanto como os depósitos, mas isso não é drama nenhum. O importante é que possamos continuar a crescer. Não fizemos milagre nenhum. Temos que pensar em duas coisas. O BPN, nos seus bons tempos, chegou a ter 7 biliões de euros em depósitos. O que aconteceu foi que quando o banco perdeu credibilidade os clientes tiraram os depósitos. Alguns desses clientes estão a retornar ao banco.

    E o ‘efeito BIC Angola’ ajudou o banco a crescer em Portugal, pois nós em Angola somos um banco já com alguma dimensão, trabalhamos com as principais empresas angolanas, algumas delas com ligação a Portugal e é lógico que uma empresa angolana que tem ligação a investidores portugueses ao trabalhar connosco em Angola passou a trabalhar connosco em Portugal, ao ter crédito connosco em Angola passou a ter crédito connosco em Portugal. O contrário também é verdade: as empresas que trabalhavam em Portugal com o BPN ou com o BIC também passaram a trabalhar connosco em Angola. Não foi por acaso que decidimos em 2008, ainda antes da fase BPN, ir abrir um banco em Portugal. Sou proveniente de bancos portugueses. E sempre percebi os empresários portugueses trabalham naturalmente com filiais de bancos portugueses ou com capital português.

    São um banco luso-angolano em que a maioria (65%) é de capital angolano e o único banco de capitais maioritariamente angolano que se expande a esse ritmo no exterior…

    Falo muito com angolanos com que me cruzo em Portugal no banco, nos restaurantes ou na rua, pessoas que me conhecem, e vejo em todos eles muito orgulho de ver o embondeiro espalhado por 212 locais, os nossos balcões em Portugal.

    Em 2012, dos vossos prejuízos, 7 milhões de euros decorriam do BPN, os outros 5 milhões decorriam da própria actividade. Isto significa que a dimensão geográfica que vos deu o BPN, associado ao que disse, ao nome à cultura, compensou os € 40 milhões dados na sua aquisição?

    Compensou. O Banco BIC, quando comprámos o BPN, já ganhava anualmente quase 6 milhões de euros. Quer dizer que, logo na fase inicial, deixámos de ganhar esses 6 milhões porque tivemos de cobrir o prejuízo do BPN mas agora estamos a começar a tirar o proveito da operação, que era aquilo que nós esperávamos.

    Depois de tanta turbulência, tanto ruído que envolveu a aquisição do BPN, hoje, olhando para o BIC Português, fica-se com a sensação de que teria de comprar uma instituição para atingir os resultados que tem e de que fala com muito orgulho…

    Os bancos para crescerem rapidamente têm de ter dimensão. Não foi por acaso que o BIC Angola em oito anos e meio abriu 206 agências. Nós achámos que para se ter dimensão tem de ser ter captação de depósitos, tem de se ter ‘funding’.

    O BPN foi uma oportunidade de ‘funding’. Mas esteve quase a desistir da sua aquisição, não foi?

    Não estive quase, cheguei a desistir porque o negócio que nos queriam impor não era aquele que nós queríamos.

    E confirma que foi o primeiro-ministro português que lhe pediu para voltar às negociações?

    É verdade. Já disse isso publicamente e o senhor primeiro-ministro também já o assumiu. E posso dizer através de quem me fez esse pedido. Foi através do Dr. Carlos Feijó que o primeiro-ministro português nos pediu que voltássemos à mesa das negociações. O Dr. Carlos Feijó era, na altura, membro do Governo. (opais.net)

    por José Kaliengue e Luís Faria

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