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    OPEP uma semana depois: o corte na produção de petróleo da Arábia Saudita é uma estratégia arriscada

    Numa reunião tensa da OPEP+, em que os países africanos foram humilhados e que o Portal de Angola teve oportunidade de noticiar, a Arábia Saudita anunciou no passado fim-de-semana, 4 de junho, um corte unilateral de 10% na produção de petróleo do reino em julho, equivalente a 1 milhão de barris por dia para aumentar os preços.

    O corte levará a produção da Arábia Saudita para 9 milhões de barris por dia, nível mais baixo desde junho de 2021 e raramente visto nos últimos 10 anos, sugerindo que Riad está disposta a sacrificar a sua parte de mercado para sustentar o aumento dos preços.

    A medida surpreendeu os analistas do mercado de petróleo não apenas pelo alcance do corte, mas também pelo fato de Riad ter intervindo sózinha depois que outros membros do cartel se recusaram a fazer o mesmo.

    Manter o preço do petróleo acima de 80 dólares o barril é uma estratégia que atende aos interesses da Arábia Saudita. O reino saudita está comprometido com um plano ambicioso para remodelar a economia dependente do petróleo do reino.

    Analistas estimam que o reino precisa de preços do petróleo acima de 80 USD o barril para equilibrar o seu orçamento expansionista.

    Uma semana depois, qual é a situação do mercado de petróleo?

    Na segunda-feira seguinte à reunião, 5 de junho, os preços do petróleo abriram em forte alta, sugerindo que o petróleo Brent atingiria, e provavelmente superaria, a meta estabelecida pela Arábia Saudita de 80 USD por barril.

    Mas nos dias seguintes, a resposta do mercado foi bem menor do que o esperado e os preços do Brent voltaram a oscilar entre 74 USD e 77 USD o barril.

    Uma semana depois, o mercado fechou nesta segunda-feira, 12 de junho, abaixo de 72 dólares o barril Brent.

    Isso pode ter um custo alto para a Arábia Saudita, já que as flutuações do preço do petróleo até agora não compensarão a perda de receita causada pela queda na produção. Analistas estimam que, para compensar a queda na produção e manter as receitas, a Arábia Saudita precisa que o petróleo suba mais de 12 dólares o barril em relação ao preço atual.

    A Arábia Saudita também enfrenta a perspectiva de perder mais participação de mercado em mercados-chave, como a China e India, para a Rússia, que continua a bombear grandes volumes de petróleo mais barato no mercado, apesar de prometer que não o fará.

    A evolução dos preços esta segunda-feira foi bastante decepcionante e uma bofetada para o “pirolito” que o Ministro da Energia da Arábia Saudita anunciou ao mercado quando o reino decidiu cortar a sua produção em 1 milhão de barris por dia.

    É verdade que, segundo previsões da Agência Internacional de Energia, fatores conjunturais apontam para uma escassez de oferta em relação à demanda no segundo semestre deste ano, o que pressionaria a alta do preço do petróleo. As incertezas na guerra na Ucrânia ou qualquer outra turbulência mundial também podem fazer aumentar o preço do petróleo.

    Mas vários relatórios mostram que a demanda por petróleo parece estar a atingir o pico e que os próximos anos verão um declínio lento, mas implacável, da demanda. Se assim for, a OPEP corre o risco de entrar num período de turbulência, porque os membros do cartel terão de dividir entre si um bolo que, em vez de crescer, vai diminuindo.

    Na verdade, as tensões já começaram a surgir.

    Primeiro foi a humilhação dos países africanos a que já nos referimos.

    Em seguida, desde que Riad colocou a Rússia no cartel em 2016, esperava-se que os dois maiores produtores do cartel agissem em uníssono, mas no fim de semana passado, nenhuma redução foi prometida por Moscovo, que simplesmente estendeu a duração das restrições previamente anunciados, que aliás não os cumpre.

    E com os Emirados Árabes Unidos ganhando um aumento na sua quota para 2024, essa nação logo estará adicionando petróleo ao mercado, independentemente do que os sauditas façam.

    Juntos, Moscovo e Abu Dhabi estão mais felizes com os preços do petróleo mais baixos do que Riad.

    No passado, a OPEP podia aumentar os preços sabendo que os rendimentos aumentariam porque não havia muitos substitutos para o petróleo no mixe de energia. Mas com o avanço das energias renováveis, é bastante provável que a elasticidade de substituição do petróleo aumente, o que significa que um aumento no preço do petróleo pode acelerar a demanda por energia renovável e, portanto, diminuir as receitas dos produtores de petróleo.

    Concordamos que ainda é muito cedo para tocar os sinos e anunciar o fim da OPEP. Não só porque a transição para as energias renováveis vai demorar décadas, mas também pelo facto de ultimamente as grandes petrolíferas (ver artigo no Portal de Angola sobre a nova estratégia da Shell) parecerem estar na mesma sintonia que os produtores que adiam a transição climática ou, ainda pior, questionam a necessidade da retirada dos combustíveis fósseis da matriz energética.

    Corremos o risco de ver na COP 28 no Dubai, em fins de Novembro 2023, as grandes petrolíferas e os produtores de petróleo a dançarem o tango, porque como dizem os Argentinos é preciso dois para dançar o tango.

    Em qualquer um dos cenários, Angola e outros países africanos terão de repensar a sua estratégia em relação à OPEP.

    Por: José Correia Nunes
    Director Executivo Portal de Angola

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