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    O acórdão contra o PRA-JA e a crise de confiança na Justiça Angola

    1. Após ter lido o acórdão 632/2020 do Tribunal Constitucional (doravante TC) emitido aos 22 de Julho de 2020 cuja relatora foi a Juíza-conselheira Victória M. S. Izata, fiquei pela segunda vez muito decepcionado e triste pela posição que o TC tomou, tristeza essa que se assemelha àquela por mim sentida aquando da publicação do(s) acórdão(s) de 2017 resultante do contencioso eleitoral que considerou improcedente as acções intentadas pela FNLA, CASA-CE, UNITA e PRS com fundamento na alegada falsidade dos documentos apresentados por todos o queixosos. Curiosamente, apesar dessa suposta falsidade, o TC não se dignou em apresentar qualquer queixa à PGR para o competente processo criminal para a responsabilização dos prevaricadores. PASME-SE!

    2. Num momento em que a luta contra a corrupção e outras práticas nefastas é a bandeira hasteada por quem governa, cujo sucesso dessa luta parece depender a sobrevivência do MPLA enquanto partido governante, surpreende-me que alguns não façam outra coisa, senão diligenciar para emperrar esse processo do qual também depende a sobrevivência do nosso Estado. Não se compreende a intenção “diabólica” de “meia dúzia” de pessoas que, mesmo contra a orientação do PR (que apela que cada um faça a sua parte), não perde uma oportunidade sequer de lançar na lama o nome da justiça angolana.

    3. Os fundamentos apresentados pelo TC para justificar a improcedência do recurso do PRA-JÁ é um abuso à inteligência colectiva dos angolano. Se não vejamos:

    4. É crível não pensarmos que há uma perseguição contra o PRA-JA quando as administrações vêm alegar que os atestados de residência que eles próprios emitiram são inválidos porque não foram assinados pelo administrador? (p.12) Será que os administradores não têm trabalho mais relevante a fazer do que assinar atestados? A figura da delegação de competência não funcionou?

    5. É crível pensarmos que o Bengo, a província mais próxima de Luanda cuja população maioritariamente jovem e desempregada, a comissão instaladora do PRA-JA inicialmente não tenha conseguido 150 assinaturas válidas? (p.15)?

    6. É crível pensarmos que das 32.075 assinaturas recolhidas pelo país todo e apresentados ao TC apenas 20% (6.670) sejam válidas? (p.8).

    7. É crível não pensarmos em perseguição e numa cabala maleficamente bem pensada contra o PRA-JA quando alegadas 531 pessoas aparecem do nada para inviabilizar o processo, alegando não terem dado do seu consentimento? Porquê é que o TC não fez, oficiosamente, uma investigação para averiguar se os ofícios emitidos pela Administração do Kilamba Kiaxi e do Libolo (p.13) relata sobre factos reais? Quem garante (a ser verdade que foram à administração queixar-se) que estes cidadãos que parecem “arrependidos” não foram subornados para agirem naquele sentido?

    8. Então, os atestados emitidos pelas administrações não valem por falta de assinatura do administrador, mas a validade dos alegados ofícios por estas emitidos são aceites de forma cega, nem qualquer questionamento e/ou averiguação?

    9. É crível pensarmos não haver má-fé do TC quando alega que as assinaturas reconhecidas pelo notário, órgão que faz fé pública, não lhe vincula? (p.9). Quer isso dizer que os notários vão oferecem credibilidade alguma e que doravante quem pretender reconhecer um documento nos cartórios notariais não tem qualquer garantia nem segurança jurídica, e fá-lo por sua conta e risco?

    10. As respostas às estas questões são, no nosso entender, óbvias e, lamentavelmente, levam-nos a concluir que o TC mais uma vez prestou um mau serviço à nação. Não é crível que um acórdão com bastantes zonas cinzentas passe ao crivo de 9 juízes conselheiros e seja surpreendentemente aprovado por unanimidade, sem qualquer declaração de voto vencido. QUE MILAGRE É ESSE?

    11. Essa decisão (e outros erros que o governo tem cometido) vai seguramente atirar Angola para o fundo nas próximas classificações internacionais, sobretudo no relatório Doing Business do Banco Mundial. Os juízes precisam entender que quando cometem erros, propositados, como esses ou atrasam o andamento dum processo põem o país numa posição desconfortante e vergonhosa aos olhos do mundo. Não é preciso fazer-se muito esforço para se entender a nossa péssima reputação internacional originada pela corrupção endémica e institucionalizada resultado de acções e omissões como essas que minam a confiança da população e sobretudo dos investidores externos.

    12. A posição humilhante de Angola da classificação dos últimos 5 anos – 181º (2016); 182º (2017); 175º (2018); 173º (2019) e 177º (2020)- no relatório Doing business que analisa o ambiente de negócio de 190 economias (países), não será superada com práticas como essas do TC, pois a confiança internacional de que o país carece ganha-se com práticas sérias e honestas por parte das instituições e agentes públicos. Sem isso, continuaremos a dar um passo para frente e 5 para trás e, com esse acórdão o TC conseguiu novamente alcançar essa proeza. Infelizmente!

    Por: J. Africano Caleia

    PS: Ressalvo o facto de ter havido um voto vencido, mas infelizmente sem declaração, o que não permite saber o que pensa a juíza-conselheira Josefa Neto.

    (in Facebook)

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