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    Gás em Cabo Delgado: “Ganho económico esperado não está a acontecer”

    Em entrevista à DW, o diretor do Centro para a Democracia e Desenvolvimento, Adriano Nuvunga, lamenta que a implementação da Lei de Conteúdo Local esteja a ser “travada”, prejudicando as comunidades locais.

    A organização não-governamental moçambicana Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD) acusa as multinacionais ligadas aos projectos de exploração de gás natural na província de Cabo Delgado de travarem a implementação da Lei de Conteúdo Local, aprovada em Agosto de 2019 pelo Conselho Económico.

    O CDD diz que, com isto, as comunidades e as pequenas e médias empresas moçambicanas ficam a perder, porque “todas as compras são feitas fora” do país. Além disso, muitos dos “biliões” que estão a ser investidos acabam por ir para os países das multinacionais e não para o desenvolvimento de Moçambique.

    Em entrevista à DW África, o director do CDD, Adriano Nuvunga, considera também que falta vontade das autoridades moçambicanas para que esta lei seja implementada.

    Investimentos do gás não estão a chegar às comunidades, critica CDD.
    (DR)

    DW África: Quais são as razões por trás desta demora na aprovação e implementação da Lei de Conteúdo Local?

    Adriano Nuvunga (AN): Fica claro que as grandes empresas multinacionais não estão muito interessadas em ver um quadro regulatório e de governação claro sobre o conteúdo local. Porque, aparentemente, isso atrasa e leva a situações de abuso por parte daqueles que têm de implementar [a lei] do lado moçambicano. Do lado do Estado moçambicano, não há uma liderança firme no que diz respeito a “puxar” para a Lei de Conteúdo Local. Aparentemente, o actual estado de coisas favorece também algumas elites e alguns interesses estabelecidos localmente.

    DW África: Quais são os impactos económicos da não aplicação da lei?

    AN: O impacto é muito sério. A Lei de Conteúdo Local é o primeiro passo para Moçambique se desenvolver economicamente. E, particularmente, para potenciar as pequenas e médias empresas, pois são elas que, no final, absorvem a mão-de-obra e permitem o pagamento do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRPS) para o Estado moçambicano. Como isso não está a acontecer, permite-se que todas as compras sejam feitas fora. E, na realidade, os biliões que se diz que estão a ser investidos ficam nos países de origem. Os empregos que deveriam ser criados em Moçambique estão a ser criados nos países de origem. Na verdade, Moçambique é o sítio para onde se trazem máquinas e produtos feitos para extrair [o gás] e ir [embora]. O ganho económico esperado não está a acontecer. Olhe para a situação de Cabo Delgado: é possível, com uma implementação firme da Lei de Conteúdo Local, resolver-se parte dos problemas na região, em termos de empregos para os jovens e oportunidades para as pequenas e médias empresas.

    DW África: Uma questão que sempre se discutiu é não haver capacidade local para fornecer e prestar serviços…

    AN: Não é verdade. Peguemos num simples caso: um ovo que vem da China e um ovo que vem de outro sítio: qual é a diferença? O Governo moçambicano deveria “ficar de pé”, ter superioridade para liderar esse processo. Mas isso não está a acontecer.

    DW África: Porquê?

    AN: Se recordarmos, na véspera da campanha eleitoral houve uma decisão inicial de investimento feita por uma das multinacionais. Ora, isso não existe. Isso é uma fraude para favorecer o partido FRELIMO [Frente de Libertação de Moçambique, no poder] e o Presidente Filipe Nyusi para ganharem as eleições. Isso pode ser a razão pela qual, hoje, não conseguem “ficar de pé” e impor uma legislação firme, com a qual Moçambique possa ganhar. Isso porque, no passado, houve uma cumplicidade.

    DW África: Sendo assim, continuamos a ter as comunidades e, inclusive, as pequenas e médias empresas mais empobrecidas?

    AN: Mais empobrecidas e, fundamentalmente, marginalizadas. A discussão decisória é feita em Maputo com os grandes chefes interessados nos seus objectivos políticos de curto prazo, marginalizando as comunidades em termos do processo decisório. Os frutos dessas decisões também não chegam às comunidades. Neste momento, a política do partido dirigente é excludente e orientada para a corrupção.

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