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    Eleições “à prova de bala” mostram Angola madura

    Poucos sabem onde fica o colégio Wambinga Nzinga, no bairro de Palanca, em Kilamba Kiaxi. É lá que Paulo Rosa, 39 anos, deve votar, mas nem dois polícias do bairro conseguem indicar-lhe o caminho certo. A maioria dos moradores a quem pede direções encolhe os ombros, até lhe dizerem para seguir um jipe que também anda perdido. Pelo labirinto de terra semeado de lixo, pedras e garrafas de plástico, Paulo demora mais de meia hora a encontrar o colégio, onde está localizada a assembleia de voto número 601 da província de Luanda. As dificuldades em encontrar o local de votação “são enormes”, admite um informador da Comissão Nacional Eleitoral.

    Nas últimas semanas, Justino Lopes ouviu as queixas de muitos eleitores, sem dinheiro para o táxi quando lhes era designado um novo local de votação. Mas no dia das eleições, a afluência foi elevada durante as primeiras horas da manhã, embora já sem filas perto da hora do almoço. Sob o olhar atento de dois polícias, os eleitores dirigiam-se às mesas colocadas na rua, onde os informadores da CNE confirmavam o registo, tendo o cacarejar das galinhas como fundo sonoro. Muitas mulheres chegavam com bebés às costas, enquanto outras saíam de dedo pintado: o indicador direito de cada eleitor é marcado por uma tinta azul indelével, depois de votar. Justino Lopes explica que a tinta permanece durante três dias, é preciso “lavar com sabão, Omo e lixívia e mesmo assim, custa a sair”. O dedo pintado é apenas um dos detalhes do processo singular.

    Nos cadernos eleitorais, além do nome e número de eleitor, cada cidadão está identificado com uma fotografia e um código de barras. A cabine de voto é de papelão, enquanto as urnas são caixas de plástico transparente, de tampa azul, como tupperwares gigantes. As mesas de voto foram colocadas no pátio ao ar livre, enquanto os delegados de cada partido se sentam em cadeiras de plástico e os observadores circulam sem restrições.

    Justino Lopes descreve um clima de paz e festa, comprovado por Manuel Catombela, observador do Conselho nacional da juventude. “Numa lanchonete aqui no bairro, havia pessoas com a camisola da UNITA e outras do MPLA e estavam a dançar kizomba. É um exemplo de tolerância política”. Os moradores contam que houve também um jogo de futebol, no qual uma equipa estava vestida com as t-shirts do MPLA, enquanto a outra tinha camisolas da CASA-CE e o árbitro era da UNITA”. Só ninguém sabe qual foi o resultado da partida.

    “Estamos maduros”, conclui Justino Lopes, em sintonia com o deputado do PCP, António Filipe, observador das eleições a convite do MPLA. Estas eleições contribuem para o “aprofundamento da democracia” em Angola e mostram uma “evolução significativa” em relação ao escrutínio de 2008, no qual o comunista também foi observador. Há “um ambiente festivo”, com os angolanos a demonstrarem “vontade e alegria de participar” e com delegados dos vários partidos em todas as mesas de voto, o que nem sequer acontece em Portugal. António Filipe afasta qualquer suspeita de fraude, convicto de que a “transparência, justeza e genuinidade” da votação “é à prova de bala”.

    Também na qualidade de observador convidado pelo MPLA, Pedro Mota Soares elogia a organização, para dar nota positiva ao ato eleitoral, mas quanto a um eventual acordo entre os partidos da oposição, o deputado do PSD, Luís Vales, considera que a solução não seria entendida pelo povo angolano. Portugal tem uma democracia mais madura, pelo que uma geringonça “poderia trazer graves consequências e até muita instabilidade a Angola. Espero que não aconteça”, afirma o deputado social-democrata.

    Na escola primária nº 1053, no bairro de Alvalade, Margarete Brito, 35 anos, confessa que está confusa, com “muitas coisas a rolar nas redes sociais”, mas salienta que o país “tem de mudar”, com mais escolas e hospitais. O povo angolano “esperava que este dia chegasse”, diz Custódio António, depois de ter votado na mesma escola. “Quando alguém cessa o mandato, o sucessor traz sempre alguma coisa.” (Diário de Notícias)

    por Cristina Lai Men

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