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Domingo, Novembro 3, 2024

Teatro: Aluguer das salas custa mais que as receitas por espectáculo

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Salas de teatro, às vezes sem condições de luz nem som, chegam a cobrar até 4 milhões de Kz para os grupos e produtoras exibirem as suas peças. Cada espectáculo pode custar até 40 milhões Kz. As receitas de bilheteira raramente chegam para pagar as despesas. O teatro sobrevive, sobretudo, do amor e dedicação dos artistas.

Os grupos e produtoras de teatro chegam a gastar até 4 milhões de Kz para alugar uma sala onde podem exibir as suas peças de teatro. Este valor é só da estrutura, sem contar com outras condições indispensáveis para apresentar um espetáculo, como luz e som.

Segundo apurou o Expansão, com base numa consulta feita às maiores e mais pequenas salas de teatro, o espeço mais caro é o do CCB – Centro de Conferências de Belas, em Luanda, que pertence ao MPLA e o partido faz a própria gestão, sendo que os grupos chegam a pagar até 4 milhões e 445 mil Kz de aluguer para apresentarem os seus espectáculos.

A mais acessível, como ilustra o nosso gráfico, é a ex-liga africana (LAASP), com um preço fixo em 45 mil Kz. Mas na prática, a mais barata chega a ser o Elinga Teatro que apesar de ter um preço de 50 mil Kz, apresenta duas outras possibilidades de negociar – uma é um desconto que pode chegar até os 30 mil Kz, e a outra, a que já se tornou um exercício habitual, a parceria que consiste na divisão de 50% entre as partes do total do dinheiro que se arrecada no espetáculo, não sendo cobrado qualquer valor pelo espaço.

Quase todas as salas onde os grupos e produtoras realizam os seus espetáculos são estruturas do Estado, na sua maioria escolas e são os grupos que as adaptam para o teatro. Mas normalmente a gestão é privatizada, e muitas vezes quem gere são os funcionários da mesma instituição. É o caso da ex-liga africana (LAASP), que tem um preço fixo de 45 mil Kz por espetáculo e onde os gestores são os próprios funcionários.

Já a escola Horizonte Nzinga Mbande, com dois anfiteatros, cobra 30% da faturação no fim de cada espetáculo, um critério definido pelo próprio grupo que gere as duas salas sob liderança de Adelino Caracol, professor na mesma instituição.

São poucos os gestores que olham para a qualidade do grupo para se exibir no seu espaço, quase que não há critérios de avaliação para um grupo ser aceite num espaço. Bastava ter alguma alguma relação com o gestor e/ou cumprir com as formalidades de pagamento para o grupo poder realizar um espetáculo. Não existem critérios de qualidade no acesso aos espaços, nem direitos preferenciais para aqueles que já têm algum histórico.

Se olharmos para os custos globais, os grupos e produtoras teatrais chegam a gastar até 40 milhões de Kz na produção de um espetáculo, mas às vezes nem conseguem tirar 20% do investimento por causa dos custos com o aluguer da sala, aluguer de luzes e o equipamento de som que são bastante onerosos. “Os investimentos nunca são recuperados por isso recorremos aos patrocinadores e não existem muitos mecenas. São esses poucos que asseguram alguma continuidade do teatro”, avança Sophia Buco, considerada uma das maiores produtoras de teatro em Angola.

Nem com venda esgotada de ingressos conseguem recuperar o dinheiro investido num espetáculo. “São mais prejuízos porque estamos limitados de praticar preços altos visto que ainda temos um público que prefere pagar 30 mil kz numa festa do que pagar 5 mil kz pra ir ver uma peça de teatro”, refere a actriz e produtora Elena Moreno, defendendo que “os gestores devem rever os preços que praticam”.

Ausência de políticas governamentais

Os grupos consultados dizem não saber que políticas o Ministério da Cultura tem para impulsionar o teatro. Por isso esperam que se resolva, a curto prazo, a reestruturação das antigas infraestruturas como o Teatro Avenida, o espaço da ex-Assembleia Nacional (no tempo colonial era o Cine Teatro Restauração) e que em Agosto do ano passado, através de diário da república foi prometido aos artistas. Existem outros espaços espalhados pelo País que também estão à espera de obras, como Cine Nacional em Luanda, fechados há anos.

A actriz e produtora Neide Van-dúnem lamenta a falta de dignidade a que são submetidos muitos artistas, em particular do teatro, referindo que ” o número de artistas de teatro é cada vez maior e estes precisam de um lugar digno para exercer a sua arte. Não se justifica que na sua capital (Luanda), não haja uma sala digna para receber público amante de teatro. Noutros países o teatro é cartão-de-visita e impulsionador de turismo, e nós?”, questionou.

Contactado pelo Expansão, a direcção nacional da cultura socorreu-se das nossas questões para identificar os gestores das referidas salas, diz que este assunto requer uma análise aprofundada junto dos gestores ou coordenadores dos mesmos espaços. Mas admite ter noção dos custos para se realizar um espetáculo, embora não avance qualquer acção neste sentido.

Segundo o Director Nacional da Cultura, Euclides da Lomba, “o ministério de tutela, não tem competências executoras nem gestora de espaços e instituições públicas, prestadoras de serviço”, mas diz não ter dúvidas dos custos com materiais para compor um espetáculo como de “som, luzes, palco, a manutenção, higiene de Instalações, e o asseguramento do espaço”.

Euclides da Lomba defende que outras disciplinas artísticas lidam com a mesma condição, não sendo um assunto específico dos grupos de Teatro.

Gabinetes provinciais também gerem salas

Noutras províncias os preços por sala variam de 30 a 50 mil Kz, tanto nas públicas como nas privadas. Mas esta realidade chega a ser muito cara se tivermos em conta a realidade de escassez de público que frequenta as salas, o preço do bilhete (de 500 Kz a 1.000 Kz), pelo que apenas para paro aluguer, as realizações teriam de ter no mínimo 100 espectadores pagantes.

Embora sejam adaptadas para o teatro, existem salas em quase todas as províncias do País, muitas pertencem aos gabinetes provinciais da cultura turismo e ambiente ou às mediatecas, mas também a escolas públicas. Estas são geridas, maioritariamente, pelos funcionários das próprias instituições, o que não se entende mas que se explica pelo facto de o Estado não ter uma política de promoção da cultura, o que o leva desresponsabilizar-se de uma gestão que devia ser sua.

Na sala da Biblioteca Provincial do Huambo os grupos pagam até 50 mil Kz para terem acesso, contra os 30 mil Kz que se paga no aluguer da mediateca provincial da Huila, valores que são muito altos para estas cidades, tendo em conta a escassez de público.

Isto motiva a uma prática de corrupção. Como os grupos não têm condições para pagar aquele valor ,então os gestores optam por valorizar o preço do aluguer em forma de leilão. “Tem a sala quem pagar o valor mais aproximado do que do definido”, disse o director de um grupo no Huambo. Para uma boa produção, os grupos nas províncias chegam a gastar até 400 mil Kz para realizar um espetáculo, desde o aluguer da sala, luz, som, cenário, as vezes cadeiras para o público se sentar.

Entretanto, contactado pelo Expansão, o Ministério da Cultura Turismo e Ambiente manifesta a preocupação com a pouca oferta de equipamentos culturais, mas refuta-se de interferir nos preços e na gestão de qualquer sala de teatro e diz que a ele “cabe apenas a responsabilidade de traçar políticas que permitam ao cidadão ter acesso a cultura”.

“A recuperação e requalificação das antigas salas de cinema e teatro, numa primeira faze nas províncias de Luanda e Benguela e sequencialmente em todo País é uma das principais soluções encontradas para solucionar estes problemas que a classe enfrenta”, sublinha o gabinete do Ministro da Cultura Turismo e Ambiente, Filipe Zau, numa nota de resposta às questões solicitadas pelo Expansão.

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