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    Poluição das praias periga saúde pública

    Angop|António Neto

    A cidade de Luanda continua a registar um elevado índice de poluição nas praias, com materiais orgânicos, inorgânicos e fluidos perigosos espalhados, numa altura em que decorre, em todo o país, a Operação Mar Seguro.

    Terminada que está a época balnear (vai de Setembro a Maio), são ainda muitas as situações que tiram brilho às convidativas praias da capital do país, deixando milhares de banhistas e moradores das zonas balneares com a saúde em risco.

    Por várias praias da capital do país nota-se a falta de observância das normas de segurança ambiental, que causa a destruição de sensíveis ecossistemas marinhos.

    No areal, o aparente cenário de limpeza vislumbrado ao longe, começa a mudar à medida em que, aos poucos, o banhista ou turista se aproxima do mar, inundado por garrafas e sacos plásticos, latas e fraldas descartáveis.

    Em alguns locais de banho o cenário é tão crítico, chegando mesmo a haver filtros de cigarros e até dejectos humanos expostos aos olhos de qualquer um.

    O risco de saúde está à espreita. Todavia, muitos utentes persistem em ignorar.

    Esta realidade é facilmente constatada nas praias do KM 32 e Museu da Escravatura (na comuna do Ramiros), do Capossoca e Amélia (no distrito da Samba), da Ilha de Luanda, no distrito da Imgombota, e de Cacuaco sede.

    Cenário idêntico apresentam as praias da Chicala, Curimba e Mussulo, onde são visíveis os resíduos orgânicos, plásticos e fluidos perigosos.

    A praia do KM 32, comuna dos Ramiros, por exemplo, é muito frequentada por banhistas que procuram um momento de lazer à beira-mar. Entretanto, as sobras da venda de bebidas e comida acabam por ser jogadas directamente no mar.

    “O local encontra-se totalmente sujo e há muito que não beneficia de qualquer campanha de limpeza”, descreve o banhista Domingos Alberto.

    Amontoados de lixo

    Com a extensão de 11 quilómetros de praia, o distrito dos Ramiros, Bairro Benfica, município de Belas, é actualmente um dos pontos mais procurados para banho.

    De uma paisagem deslumbrante, as praias dos bairros quilómetros 30, 32 e Ramiro sede recebem todos os dias visitantes, fluxo que aumenta durante os finais de semana.

    Segundo o administrador distrital, Miguel Almeida, a situação em que se encontram as praias da comuna é preocupante, porque os amontoados de lixo tornam-se num grande produtor de vectores de doenças do fórum dermatológico e não só.

    Para contrapor a situação, a administração e os vendedores destes locais têm realizado, quinzenalmente, campanhas de limpeza nas praias.

    Todavia, o trabalho é insuficiente, por causa da falta de equipamentos adequados.

    “Estamos a prever adquirir quatro motas para os serviços comunitários, no sentido de auxiliar na recolha do lixo a nível das praias do distrito”, refere.

    O problema da poluição não se circunscreve àquela comuna. Parte das praias da Ilha de Luanda também deixam os banhistas tristes, por causa do lixo exposto na areia.

    “É muito difícil encontrar uma praia que ofereça o mínimo de condições. A imundície que se verifica faz com que tenhamos cuidado com os nossos filhos. Há cacos de garrafas dentro da água e até mesmo fezes”, lamenta Aridania da Rosa.

    Já no município de Cacuaco, a realidade é pior, uma vez que as três valas de drenagem das águas da chuva, oriundas dos municípios de Viana e do Cazenga,desaguam ali.

    Para trás fica a imagem de limpeza e sossego da praia Cacuaco-sede, local de eleição para muitas pessoas que pretendiam refrescar e dar mergulho em família.

    Para o director municipal do Ambiente e Serviços Comunitários de Cacuaco, Bento Rafael, a praia de Cacuaco-Sede não oferece condições para a prática de actividades recreativas, porque a sua água é imprópria para banho, segundo testes efectuados.

    Por esse facto, Bento Rafael faz saber que a administração tem estado a sensibilizar os utentes para não usarem a praia, no sentido de evitarem contrair doenças.

    Actualmente, a administração diz não possuir meios e recursos humanos para tratar dos resíduos sólidos, pelo que tem solicitado maior intervenção da empresa Engevia para a recolha dos resíduos sólidos, pelo menos, duas vezes ao dia.

    Danos ao meio ambiente

    Escolher a melhor praia para passar os momentos de lazer em Luanda é, hoje, um verdadeiro “quebra cabeça” para muitos banhistas e turistas atentos. Não existem sinalizações indicando os locais adequados para o banho.

    O alerta sobre a higiene da água previne o banhista da contaminação por bactérias nocivas, derivadas de fluidos perigosos que chegam ao mar por meios dos esgotos residenciais e industriais não tratados, bem como valas de drenagem de água da chuva.

    Segundo o ambientalista Wladimir Russo, os restos de plásticos ou micro plásticos põem em perigo os peixes, aves, tartarugas, crustáceos, golfinhos e as baleias, causando um impacto significativo na fauna marinha.

    “Se tivermos que olhar para os resíduos sólidos que acabam por chegar ao mar, muito são por força das valas de drenagem. Devemos, por isso, implementar programas para melhorar o saneamento básico, com recolha constantes e colocação de contentores, bem como a construção de Estações de Tratamento de resíduos”, refere.

    A criação pelo Estado de um programa urgente, com um conjunto de serviços que possam melhorar as praias e atrair os turistas, é defendida pelo ambientalista.

    O mesmo indica, a título de exemplo, países africanos como a África de Sul e Quénia, que têm praias e outros locais turísticos muito bem cuidados.

    “Nas praias de Luanda não se faz a análise da qualidade da água, exercício que resultaria na classificação destes locais turísticos com a bandeira azul, para aquelas que não oferecem riscos à saúde dos banhistas”, refere Wladimir Russo.

    Sublinha que não basta velar pela ausência de resíduos sólidos e bactérias na água, mas é necessário criar outros serviços, como balneários públicos, nadadores salvadores, serviços de emergências médicas e um eficiente sistema de saneamento básico.

    Por sua vez, a médica dermatologista Erica Nelumba destaca, entre as infecções contraídas pelos banhistas, as bacterianas que atingem as camadas superficiais da pele e a larva migrans ou bicho geográfico (uma larva que penetra na pele e causa muita comichão, vermelhidão e inchaço).

    Os contágios, aponta, ocorrem geralmente em praias onde há fezes de cães e gatos, num raio de dois metros de areia. “A larva caminha sobre a pele e o desenho que se forma é semelhante a um mapa geográfico”, explica a especialista.

    Quanto às medidas para evitar tais contaminações, a médica apela as pessoas a levarem sempre sacos ou embalagens para o depósito de lixo, quando estiverem na praia, bem como redobrarem o cuidado com os animais e as crianças.

    Chama atenção às autoridades, no sentido de incrementarem as acções publicitárias de sensibilização da população para um uso responsável das praias.

    Contaminação preocupa UTGSL

    A esse respeito, a Unidade de Tratamento de Gestão do Saneamento de Luanda (UTGSL) refere que a capital do país não possui nenhum sistema para o tratamento e aproveitamento de águas residuais.

    Segundo a directora adjunta da UTGSL, Zenilda Mandinga, “o casco urbano da província conta apenas com uma rede de esgoto unitária, que recolhe as águas pluviais e residuais e liga a um emissário na avenida 4 de Fevereiro”.

    Depois de percorrer as estações de bombagem ao longo da avenida até a estação 05, na zona do Museu das Forças Armadas, as águas são bombeadas para o mar, indica a responsável da UTGSL, responsável por coordenar o processo de expansão dos sistemas de drenagem pluvial, recolha e tratamento da rejeição final das águas residuais.

    Devido a inexistência de Estações de Tratamento de Resíduos (ETAR), as descargas com dejectos e outro tipo de resíduos urbanos e industriais acabam sempre por chegar ao mar sem o mínimo de tratamento.

    A directora-adjunta faz ainda referência que duas grandes linhas de águas pluviais, nomeadamente Cambamba (Cazenga até ao Benfica) e Mulenvos (Viana até ao Cacuaco), arrastam consigo enormes poluentes orgânicos e inorgânicos, devido ao depósito de lixo e dejectos sanitário ao longo do curso.

    Para contrapor a situação, Zenilda Mandinga faz saber que está previsto, para breve, a efectivação de duas Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR), na foz da linha de água de Cambamba e dos Mulenvos, com objectivo de evitar com que materiais orgânicos e inorgânicos cheguem a poluir as praias, a fauna e a flora marinha.

    “Pretendemos implementar em todo território da província de Luanda uma rede de macro-drenagem separativa, no sentido de que as águas residuais sejam drenadas numa só rede e as pluviais noutra”, aponta.

    Brigadas de limpeza

    O presidente da Juventude Ecológica Angolana (JEA), José Silva, defende a criação de brigadas específicas de limpeza das praias, devido ao nível de poluição que se regista.

    O responsável da JEA enfatiza também a necessidade da implementação de uma brigada de mergulhadores para a retirada do lixo que se encontra debaixo da água.

    Segundo o responsável, os fiscais das administrações locais deviam entrar em acção com o fim de sensibilizar e repudiar os banhistas e moradores da zona costeira que abandonam o lixo “a céu aberto” nas praias.

    Sugere que se façam estudos aturados para comprovar o nível de poluentes existentes nas praias, no sentido de desenvolver programas de segurança das praias, em que os préstimos dos estudantes universidades não poderão ser descurados.

    Entretanto, nesse mar de problemas há quem ainda consiga desfrutar de algumas praias limpas em Luanda. É o caso do turista português João Alencar, que indica as praias do Cabo Ledo, no município da Kissama, como boa referência para banhos.

    Esta constatação verifica-se igualmente na praia do Capossoca, distrito da Samba, onde um grupo religioso, com frequência, se faz presente em campanhas de limpeza.

    As praias têm uma importância fundamental como fonte de Saúde, diversão e lazer. Mas, infelizmente, o ineficiente serviço de recolha de lixo e a falta de civismo contribuem para a sua descaracterização.

    São, por isso, todos chamados à observância das normas, critérios e padrões relativos ao controlo e manutenção da qualidade do meio ambiente, com particularidade das praias de Luanda, um dos grandes cartões postais da capital do país.

    Com uma extensão de 304 quilómetros, partindo do rio Zenza, município de Cacuaco (Luanda), ao rio Longa, província do Cuanza Sul, a costa da província de Luanda é constituída por 54 praias entre 27 autorizadas e o mesmo número de proibidas.

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