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    Morreu D. José Policarpo – O intérprete dos “Sinais dos Tempos”

    (Foto Globalimagens/João Girão)
    (Foto Globalimagens/João Girão)

    José Policarpo foi patriarca de Lisboa durante 15 anos, pedindo dispensa de funções ao Papa Bento XVI, em fevereiro de 2011, logo que atingiu os 75 anos, limite canónico de idade para os prelados. Em maio de 2013 o Papa Francisco aceitou a renúncia e nomeou para seu sucessor o então Bispo do Porto, Manuel Clemente. Morreu hoje vítima de um aneurisma na aorta.

    José da Cruz Policarpo nasceu na freguesia de Alvorninha, concelho de Caldas da Rainha, a 26 de fevereiro de 1936. Foi o primogénito de nove filhos e filhas do casamento de José Policarpo com Maria Gertrudes Rosa, casados em Alvorninha a 26 de janeiro de 1935. Os pais eram agricultores, e produziam cereais, vinho, azeite e fruta com relativa abundância. Romperam com as tradições do tempo, segundo as quais os filhos deveriam suceder-lhes no amanho das terras, e mandaram os filhos estudar, segundo critérios da sua livre escolha. Por influência de um tio materno, José deveria entrar no seminário dos salesianos. Mas o pároco da aldeia aconselhou os pais a enviá-lo para o seminário diocesano em Santarém.

    Depois de concluir o ensino secundário nos seminários de Santarém e Almada, cursou filosofia e teologia no seminário maior de Cristo-Rei, nos Olivais, em Lisboa, entre 1955 e 1961. Em 15 de agosto de 1961, o cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Cerejeira, ordenou-o sacerdote. O seu currículo escolar e as qualidades pessoais que evidenciava fez com que Cerejeira o colocasse no seminário de Penafirme, onde permaneceu durante cinco anos como professor, prefeito e vice-reitor.

    Em 1966, o padre José Policarpo foi enviado para Roma para aprofundar os estudos teológicos na Pontifícia Universidade Gregoriana. Dois anos mais tarde, concluiu a licenciatura em teologia dogmática, com uma tese sobre “Teologias das religiões não cristãs”. Regressou a Lisboa e, em 1970, foi nomeado reitor do seminário dos Olivais, e iniciou a docência na Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa (UCP).

    Um académico e investigador prestigiado

    Homem profundamente tocado pelo Vaticano II, aberto ao mundo e à cultura, em 6 de Outubro de 1971 defendeu uma tese subordinada ao título “Sinais dos tempos – génese histórica e interpretação”, inspirada na Constituição Gaudium et Spes, tendo-lhe sido conferido o grau de doutor em Teologia.

    No âmbito da sua carreira académica, José Policarpo foi professor auxiliar da Universidade Católica Portuguesa (1971), professor extraordinário (1977), e professor ordinário (1986). Foi diretor da Faculdade de Teologia entre 1974 e 1980, e de novo entre 1985 e 1988, ano em que, por decreto da Santa Sé, foi nomeado reitor da Universidade Católica para o quadriénio de 1988/92. Foi ainda reconduzido no mesmo cargo para um novo mandato, de 1992 a 1996. A partir de então passou a ser Magno Chanceler da UCP.

    Presidiu à Comissão Instaladora do Centro Regional da UCP no Porto, entre 1985 e 1987. Protagonista da renovação cultural da Igreja em Portugal, publicou mais de meia centena de obras, e foi sócio honorário da Academia das Ciências de Lisboa e académico de mérito da Academia Portuguesa de História.

    Formatado para cardeal patriarca de Lisboa

    Ordenado bispo pelo cardeal patriarca D. António Ribeiro, na igreja dos Jerónimos em Lisboa, aos 42 anos, foi nomeado bispo auxiliar de Lisboa, com o título de Caliábria, a 26 de maio de 1978, mantendo, contudo, a docência e as responsabilidades de direção na UCP. A 4 de março de 1997 foi nomeado arcebispo coadjutor patriarcal, facto que desde logo lhe conferiu o direito de sucessão. E, de facto, um ano depois, a 24 de março 1998, por morte do cardeal D. António Ribeiro, passou a ser o 16º patriarca de Lisboa.

    O pálio, insígnia dos metropolitas, foi-lhe imposto pelo cardeal-bispo Angelo Sodano, então secretário de Estado do Vaticano, numa celebração antecipada dos santos Apóstolos Pedro e Paulo, em 28 de junho de 1998, na igreja do Mosteiro dos Jerónimos, no contexto do dia da Santa Sé na “Expo 98” que decorreu na cidade de Lisboa. Este cargo detém o raríssimo privilégio perpétuo do prelado que o ocupar ser nomeado cardeal no consistório seguinte ao da sua investidura no mesmo cargo.

    De facto, no consistório de fevereiro de 2001, cinco dias antes de completar 65 anos, foi escolhido para cardeal, tendo sido nomeado pelo Papa João Paulo II, que lhe outorgou o título de cardeal-presbítero de “S. Antonio in Campo Marzio”, que corresponde à igreja de Santo António dos Portugueses. Tomou posse desta igreja em 27 de maio de 2001.

    Como D. José IV, foi patriarca de Lisboa entre 1998 e 2013, assumindo o título e as insígnias de cardeal patriarca de Lisboa a partir de 2001. Enquanto cardeal eleitor participou no conclave de 2005, que elegeu Joseph Ratzinger como Papa Bento XVI. Em 2013 participou no conclave de 2013, que elegeu Jorge Bergoglio como papa Francisco, sucessor de Bento XVI por renúncia deste.

    Resignação e controvérsias

    A 18 de fevereiro de 2011 foi o próprio José Policarpo que anunciou ter enviado uma carta ao papa Bento XVI, renunciando ao patriarcado de Lisboa, uma vez que em 26 de fevereiro seguinte completaria 75 anos. «Ontem mesmo escrevi a carta ao papa – está previsto no Direito Canónico que um bispo, quando cumpre os 75 anos, pede ao Santo Padre a resignação do seu mandato – e fico à espera da sua decisão», disse publicamente.

    Quatro meses mais tarde, no Dia da Igreja Diocesana, José Policarpo voltou a referir-se publicamente ao tema da resignação, anunciando a decisão do Vaticano nestes termos: «Gostava de vos anunciar que o santo padre Bento XVI já respondeu ao meu pedido de resignação, pedindo-me que prolongue o meu ministério episcopal, na Igreja de Lisboa, por mais dois anos». Esta decisão da Santa Sé não foi surpresa nos meios eclesiásticos, já que, tradicionalmente, a regra do Vaticano em relação aos cardeais aponta para que estes se mantenham no cargo por mais dois a três anos além dos 75 anos.

    O mandato de José Policarpo, enquanto patriarca de Lisboa, não foi isento de algumas polémicas de caráter doutrinário. Entre as mais significativas releva a legalização do aborto em Portugal, em 2007, a que a Igreja Católica se opôs com veemência, com vários setores conservadores da sociedade a pedirem o veto presidencial ao diploma, e a recusa do cardeal-patriarca em se associar aos críticos do Presidente da República. Também o apelo de D. José Policarpo às jovens portuguesas para que pensassem duas vezes antes de casarem com um muçulmano gerou grande controvérsia pública. O mesmo sucedeu, sobretudo no interior da Igreja, quando o cardeal-patriarca declarou numa entrevista que a proibição da ordenação das mulheres não era uma questão teológica.

    José Policarpo foi vogal do Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa, e presidente eleito em 13 de abril de 1999, e reeleito em 11 de abril de 2002. Desempenhou os cargos de Presidente da Comissão Episcopal da Doutrina da Fé (1978/1981), do Apostolado dos Leigos (1981/1987), da Educação Cristã (1987/1989) e da Comissão Episcopal dos Bens Culturais da Igreja (desde 1997). Representante da Conferência Episcopal Portuguesa na Confederação das Conferências Episcopais da Europa (CCEE) tendo sido entre 1984 e 1990 representante da Conferência Episcopal Portuguesa na Comissão dos Episcopados da Comunidade Económica Europeia (COMECE). Era membro do Conselho Pontifício para a Cultura desde 18 de Outubro de 1998.

    (Fontes consultadas em dezembro de 2013: agencia.eclesia.org; geneall.net; ens-ramada1.blogspot.pt; wikipedia.org; en.wikipedia.org; sol.sapo.pt; expresso.sapo.pt; wook.pt) (tsf.pt)

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