O arcebispo de Luanda, D. Damião Franklin, concedeu ao Jornal de Angola uma breve entrevista, em que abordou vários assuntos, desde religiosos às actuais relações entre a Igreja Católica e o Estado. “As relações mudaram bastante. (…) O Estado reconhece todas as igrejas, o seu espaço e personalidade jurídica. Nós, também com responsabilidade, assumimos e tudo o mais que devemos fazer é respeitar as instituições do Estado e contribuir para o desenvolvimento do país”, sublinhou D. Damião Franklin.
JORNAL DE ANGOLA (JA) – Em que contexto se inseriu a audiência que o Papa concedeu, há dias, aos bispos da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé?
Damião Franklin (DF) – É a disciplina da Igreja. De cinco em cinco anos, temos que fazer uma visita chamada limina. A última visita aconteceu em 2004 e houve este compasso de espera porque morreu o Papa João Paulo II. Com o novo Papa, teve que se fazer uma nova programação.
JA – Do ponto de vista teológico e cristão, o senhor Bispo acha que a Nação angolana está “salva”?
DF – A salvação é algo que foi oferecido desde a morte e ressurreição de Cristo. É bom que os angolanos façam os possíveis de se enquadrar nesta salvação. É por isso que a penitência, oração, sacramentos e a evangelização são esforços para ver se as pessoas se enquadram. O Senhor dá força de espírito àqueles que pedem.
JA – Como estão as relações da Igreja Católica com o Estado angolano?
DF – As relações mudaram bastante. Não é como no tempo do materialismo. Agora, o Estado é laico, reconhece todas as igrejas, o seu espaço e personalidade jurídica. Nós, também com responsabilidade, assumimos e tudo o mais que devemos fazer é respeitar as instituições do Estado e contribuir para o desenvolvimento do país.
JA – Que contribuição a Igreja Católica dá ao país?
DF – Através da evangelização e da educação, por via da qual a Igreja Católica combate a ignorância. Contribuímos ainda através da saúde e da presença da Igreja Católica junto da população, não só dos fiéis mas também daqueles que, de uma forma ou doutra, precisam da nossa presença.
JA – Uma questão que tem sido discutida em alguns países é a da subordinação directa da alta hierarquia da Igreja Católica nacional ao Vaticano. Até que ponto, temos uma Igreja Católica verdadeiramente angolana?
DF – Quando se fala de uma Igreja Católica não é uma Igreja nacional. A Igreja Católica é sinónimo de igreja universal. A definição de uma diocese – e também aparece no Código do Direito Canónico, diz que cada diocese é uma porção da Igreja Universal, é o pulmão da Igreja Universal e o bispo que está à frente tem que estar em comunhão com o chefe do colégio apostólico e também com outros bispos. É uma questão de catolicidade e universalidade. Claro que há problemas específicos que nós aqui em Angola temos que talvez num outro país não existam, porque há especificidade de cada país, a sua história, tradição, cultura e língua.
JA – Como a Igreja Católica se posiciona em relação à democracia reinante no país?
DF – Há um escritor que fala da democracia em África e chama de nova democracia. É preciso agora dar tempo, consolidar as instituições, porque são estas que fazem com que as democracias possam funcionar. Dentro do espírito de respeito à lei, ninguém é superior à lei. Cada um de nós deve cumprir a constitucionalidade das coisas, respeitar a ordem pública. Esta convivência harmónica deve existir entre os cidadãos. Não pode haver cidadãos de primeira nem de segunda. Os cidadãos devem sentir-se filhos da mesma terra.
JA – Quais são os desafios actuais da missão evangelizadora da Igreja Católica em Angola?
DF – São desafios que afectam todo o mundo, embora tenhamos também outros específicos. Por exemplo, a questão do anúncio do evangelho, a questão de novas estruturas e de valores que devemos anunciar e viver. Porque o neo-liberalismo também está a chegar a Angola, as pessoas querem pôr de parte certas tradições, certos valores que aprendemos quando éramos crianças e querem assumir comportamentos que nem sempre correspondem ao evangelho. O grande desafio mesmo aqui em Luanda é de construção de mais paróquias e pessoal para trabalhar.
JA – Como é que está o processo de canonização do padre angolano Leonardo Sikufinde?
DF – Este processo é antigo e está a ser pilotado pela respectiva diocese, que é a de Ondjiva, província do Cunene. Neste momento, não tenho o ponto da situação de como o processo está a caminhar. Mas sei que tinha iniciado, sobretudo no tempo do falecido D. André Muaca. A cúria de Ondjiva deve estar mais preparada para responder a esta pergunta. Chama-se padre Leonardo Sikufinde, assassinado em 1985 no Cunene.
JA – A Igreja Católica está a atravessar uma crise de valores, por causa dos casos de pedofilia. No país existe algum caso?
DF – Em Luanda não tenho conhecimento. Também os órgãos de comunicação social, muitas vezes, exageram. Numa população de 500.000 padres no mundo – não digo que vamos tolerar o mal – se forem 50 ou 40 que caem nesta asneira não são todos os padres.
JA – Sobre as manifestações que ocorrem, o que tem a dizer?
DF – Já falei disso quando estive com o senhor Presidente da República. É preciso realismo, patriotismo e responsabilidade. É um alerta não só para quem é governado mas também para quem governa.
Adelina Inácio
Fonte: Jornal de Angola
Fotografia: JA