A embaixada chinesa em Itália exigiu o cancelamento de uma exposição do artista dissidente Badiucao, mas o Museo di Santa Giulia, em Brescia, não cedeu.
O autarca de Brescia, Emilio del Bono, recebeu uma carta do gabinete cultural da embaixada chinesa, publicada pelo jornal local “Giornale di Brescia”, que acusa a exposição de estar “cheia das mentiras antichinesas” e de “colocar em risco as relações amistosas entre Itália e a China”.
O trabalho de Badiucao, apelidado pela imprensa ocidental de “Banksy chinês”, inclui imagens a sugerir que o Presidente Xi Jinping mata o desenho animado Winnie The Pooh – uma comparação irónica amplamente censurada nas redes sociais chinesas -, uma homenagem ao denunciante de Wuhan, Li Wenliang, e uma representação da polícia de choque a perseguir um manifestante.
“Devo dizer que tive de ler a carta duas vezes porque me surpreendeu”, disse a vice-presidente de Brescia, Laura Castelletti, considerando-a de “uma intromissão na decisão artística e cultural de uma cidade”. O pedido de cancelamento da exibição, acrescentou, só “atraiu mais atenção”.
Apesar dos protestos dos diplomatas chineses, as obras de Badiucao vão ser reveladas ao público no sábado numa exposição chamada “La Cina (non) è Vicina” (“A China (não está) perto”, em tradução livre).
Perseguido e ameaçado
Nascido e criado em Xangai, mas a viver no exílio na Austrália na última década, Badiucao, de 35 anos, é conhecido por fazer “cartoons” políticos, que normalmente são alvo de críticas do Partido Comunista Chinês (PCC).
O outrora anónimo Badiucao ganhou destaque em 2011, quando começou a publicar caricaturas sobre a forma como a China lidou com o acidente do comboio de alta velocidade de Wenzhou.
Em 2018, uma exibição em Hong Kong foi cancelada por “questões de segurança”. Nessa época, a polícia chinesa deteve vários membros da sua família e o ameaçou de prisão, recorda o “The Art Newspaper”. Admitindo que o seu disfarce “tinha sido comprometido”, Badiucao revelou a sua identidade em 2019 após anos de anonimato.
Recentemente, o artista começou a falar abertamente com a imprensa. “Desta vez é diferente, conhecem o meu rosto. Não têm nada nas mãos para me controlar”, afirmou, acrescentado, contudo, que recebeu ameaças de funcionários da China Global Television Network (CGTN), alertando-o contra “prejudicar os interesses nacionais”.
“É quase impossível [evitar] ofender o Governo chinês hoje em dia. Qualquer coisa pode ser sensível; qualquer coisa pode ser problemática”, disse, em declarações à CNN. “A China é muito boa a usar o capital e dinheiro para controlar, manipular e silenciar as críticas – e é assim que isso se reflete no nosso mundo, o mercado da arte.”