O ex-presidente peruano Alan García rejeitou as acusações de corrupção contra ele numa carta escrita antes de se suicidar, na última quarta-feira, 17, afirmando que “não houve nem haverá contas, nem subornos, nem riqueza”.
“Vi outros desfilarem algemados resguardando a sua miserável existência, mas Alan García não tem por que sofrer essas injustiças e circos”, escreveu o ex-presidente na mensagem dirigida aos seus seis filhos, lida nesta sexta-feira, 19, com emoção, pela sua filha Luciana durante a cerimónia fúnebre, citada pela AFP.
“Não houve nem haverá contas, nem subornos, nem riquezas. A história tem mais valor que qualquer riqueza material”, destacou o ex-presidente, que deu um tiro na própria cabeça na quarta-feira quando estava prestes a ser detido por suposta lavagem de dinheiro e conluio na investigação do caso da Odebrecht no Peru.
García, de 69 anos, que ficou obcecado durante a sua prolífica e polémica carreira política de quatro décadas pelo lugar que ocuparia na história, escreveu que não estava disposto a suportar humilhações.
García, social-democrata, governou o Peru em duas ocasiões: 1985-1990 e 2006-2011.
Veja abaixo o texto completo da carta, lida diante do caixão do ex-presidente, na presença de centenas de seguidores no local. Esse foi o último acto das cerimónias fúnebres, antes de se dirigirem ao crematório.
– Carta aos filhos –
“Cumpri a missão de conduzir o aprismo (do seu partido Apri) no poder em duas ocasiões, e impulsionamos outra vez a sua força social. Acho que essa foi a missão da minha existência, tendo raízes no sangue desse movimento.
Por isso e pelos contratempos do poder, nossos adversários optaram pela estratégia de me criminalizar durante mais de 30 anos. Mas nunca encontraram nada, e derrotarei-os novamente, porque nunca encontrarão mais que as suas especulações e frustrações.
Nesses tempos de rumores e ódios repetidos que as maiorias acreditam ser verdade, vi como se utilizam os procedimentos para humilhar, vexar, e não para encontrar verdades.
Por muitos anos, me situei acima dos insultos, me defendi e a homenagem dos meus inimigos era argumentar que o Alan Garía era suficientemente inteligente, como se eles não pudessem provar as suas calúnias.
Não houve nem haverá contas, nem subornos, nem riquezas. A história tem mais valor que qualquer riqueza material. Nunca poderá haver preço suficiente para quebrar o meu orgulho de ser aprista e peruano. Por isso repeti: outros se vendem, eu não.
Com meu dever cumprido na minha política e nas obras feitas a favor do povo, alcançando as metas que outros países e governos não conseguiram, não tenho por que aceitar vexames. Eu vi outros desfilarem algemados, resguardando a sua existência miserável, mas Alan García não tem porque sofrer essas injustiças e circos.
Por isso, deixo aos meus filhos a dignidade das minhas decisões; aos meus companheiros, um sinal de orgulho. E meu cadáver como uma mostra do seu desprezo pelos meus adversários, porque já cumpri a missão que me impus.
Que Deus, a quem vou dignidade, proteja os de bom coração e os mais humildes”.