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    Bolsonaro faz ameaça, não piada, ao colocar youtuber Cauê Moura na mira

    Uma estratégia recorrente de Jair Bolsonaro e sua turma em sua cruzada anti-civilizatória é o uso prolongado da linguagem ambígua para espalhar absurdos. Pegue o caso das vacinas, por exemplo.

    Jogando com a dualidade, o presidente lança dúvidas sobre a efetividade do imunizante ao questionar, em público, o que está por trás e qual o interesse da Anvisa em aprovar a vacinação infantil.

    Reparem que ele não diz com todas as letras que a vacina é ruim ou que os interesses da agência reguladora são necessariamente escusos. Assim, joga a fumaça da dúvida e nela fica escondido em caso de contestação. Pode dizer a um negacionista que não endossou o programa. E, para um sujeito com um senso de cidadania, digamos, mais sofisticada que nunca moveu um dedo contra o imunizante.

    O mesmo vale para seus pronunciamentos em relação às mortes pela Covid-19. Veja, ele não deixa de lamentar pelas vidas perdidas. O que ele faz é perguntar até quando vamos chorar por elas. Não diz que o vírus não é grave, mas que mais grave do que ele é deixar o país quebrar.

    O mesmo vale para as declarações ambíguas sobre urnas eletrônicas, em que trocou o famigerado “voto impresso” por “voto auditável”, como se o sistema atual não permitisse auditorias, e as promessas com figas em defesa do meio ambiente, enquanto empresta o isqueiro a desmatadores. Os casos se multiplicam.

    Na segunda-feira 7, primeiro dia útil da semana, Bolsonaro saiu com o filho para ostentar sua habilidade como atirador. Era melhor ter ficado com as flexões, já suficientemente vergonhosas.

    Sem conseguir fazer o disparo, precisou ser auxiliado, não sem irritação, pelo filho 02, que tirou o dia de folga do mandato de vereador no Rio para acompanhar o pai no passeio. Coube a ele avisar que era preciso tirar a trava da arma.

    A cena viralizou, para deleite de opositores.

    Um deles era o influenciador Cauê Moura, que chamou o presidente de mentecapto que não sabe atirar.

    Moura tem mais de dois milhões de seguidores –um calibre e tanto em uma sociedade que costuma ouvir seus influencers antes de se posicionar. Incomodado com o petardo, Bolsonaro, que não sabe também fazer conta nem calcular ordem de grandeza, resolveu responder com uma bazuca.

    Com sua covardia habitual, ele jogou na ambiguidade ao dizer que, de fato, as habilidades motoras não lhe permitiram disputar uma Olimpíada. Mas, “em uma eventual invasão de propriedade, se o alvo fosse um gordinho do seu tamanho não ficaria tão difícil acertar”.

    Havia, claro, um tom gordofóbico na fala, mas a fixação neste ponto equivale a se assombrar com o parabrisa quebrado de um veículo sem freio descendo uma ladeira na contramão e prestes a nos atropelar.

    Há indícios de que Bolsonaro talvez, quem sabe, estamos ainda averiguando, tenha afirmado que atiraria sem chance de errar em uma pessoa que o criticou. O detalhe da fala é o senão: em caso de invasão, claro. E não está falando do algoz em específico, mas em um “gordinho” como ele. Não que seja ele. Pode não ser. Atiraria? Atiraria. Mas só em caso de invasão.

    O cuidado em dizer sem dizer com todas as letras confunde e livra o presidente de se responsabilizar pelo que fala e pelo que diz.

    O cuidado serve para pouco ou caso nada em um contexto em que a violência política extrapolou a linguagem nas últimas eleições e alvejaram os dois favoritos da disputa atual. Bolsonaro foi vítima de um atentado a faca durante um ato de campanha em Juiz de Fora. E uma caravana com o ex-presidente Lula foi alvo de tiros disparados por um mentecapto em maio de 2018.

    Seria recomendado, talvez, se não fosse incômodo, claro, que um líder político com mandato, digamos, um presidente, evitasse posar com armas ou ameaçar dar tiros no amiguinho em rede social. Principalmente quando o tiro pode partir da bazuca de quem tem a caneta e um exército, formal e informal, debaixo de suas ordens.

    Torcido e retorcido, o que o presidente que não tem mais o que fazer declarou a milhões de pessoas que atiraria, se pudesse e tivesse oportunidade, em uma pessoa que ousou cruzar uma linha. O nome disso, sem floreios, é covardia.

    Quem não percebe a gravidade do ato e da fala perdeu a noção da gravidade.

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