“A banca está mais voltada à captação de produtos do tesouro (título e obrigações) que são mais atractivos do que financiar o empresariado”
O Sistema Bancário Angolano (SBA) não está ao serviço da economia, dizem especialistas ouvidos pelo Mercado, em reacção ao facto de os títulos e valores mobiliários representarem a maior parcela do activo da banca, em detrimento do crédito concedido a clientes.
O desempenho do sistema bancário, como indica o “Relatório Anual e Contas” do BNA, referente ao exercício económico de 2020, vem dar razão à crítica dos especialistas; inclusive o economista Daniel Sapateiro defende que o BNA, Ministério das Finanças e a Associação Angolana de Bancos (ABANC) reflictam urgentemente sobre este assunto.
“Deve-se tomar decisões sobre que tipo de banca queremos, pois, este paradigma tem de mudar”. Aliás, “temos de nos lembras que estamos na zona de livre comércio continental, na SADC e outras organizações internacionais para a captação de recursos financeiros”, alertou o também docente universitário, em declarações ao Mercado.
Os títulos e valores mobiliários representavam (em 2020) 34,05% (1,76 biliões Kz) do activo da banca, avaliado em pelo menos 18,36 biliões Kz. A aplicação em créditos a clientes teve um peso de 16,38, segundo o “Relatório Anual e Contas” do banco central.
À semelhança de Daniel Sapateiro, o economista Porfírio Muacassange advoga a mudança de paradigma na economia, partindo de um processo de reestruturação do sector financeiro bancário e deixar “os pequenos interesses e pensar na maioria, assim como na sustentabilidade económica futura do País e das próximas gerações”.
Também defende a independência total do BNA, na qualidade de fazedor da política monetária, para que possa reestruturar o sistema financeiro como deve ser e adequá-la a outras geografias.
A banca, disse, está mais voltada à captação de produtos do tesouro (título e obrigações) que são mais atractivos do que financiar o empresariado. Mas, tudo tem muito a ver com a forma como a economia foi organizada, aliás o Estado é o maior motor.
Em Angola, afirma, a banca funciona para uma elite restrita. O único banco que tentou chegar às massas foi o Banco de Poupança e Crédito (BPC) “que uns decidiram destruir”.
“A questão da banca é que os resultados dependem demasiado não de títulos competitivos num mercado pujante, mas sim do quase único tipo de título de investimento financeiro existente: os títulos de dívida pública”, disse o economista Heitor Carvalho em declarações ao Mercado.
O director do Centro de Investigação Económica da Universidade Lusíada de Angola (CINVESTEC), concorda que sem a participação efectiva da banca o sector empresarial privado jamais irá crescer, mas o fraco apoio bancário àquele segmento da economia se deve ao ambiente de negócio, das políticas públicas, monetárias e cambial.
As políticas de ambiente de negócios, monetária e fiscal têm de se alterar urgentemente. Assim a economia não cresce. Nos relatórios do CINVESTEC focamo-nos muito nestas políticas”, disse Heitor Carvalho, para mais adiante afirmar que o BNA, na persecução da política do FMI, ainda agrava a situação secando a liquidez bancária”.
Elizeu Vunge (economista e docente universitário) a credita que o problema está na interação entre o regulador e os filiados, pois os bancos comerciais desrespeitam os avisos emitidos, preferindo receber notificações e pagar multas a concederem créditos.
“Os bancos devem apoiar a actividade empresarial, sem eles é impossível ter um empresariado forte porque precisa de crédito. Também é preciso melhorar o ambiente de negócio e tornar o sistema financeiro credível”, disse.