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    Aeroportos de Moçambique: “Fardo para as contas públicas”

    O CIP garante que a má gestão e a interferência política são dois factores para o buraco nas finanças da empresa pública Aeroportos de Moçambique, que mesmo assim vai avançar para a construção do Aeroporto Xai-Xai.

    A empresa Aeroportos de Moçambique (ADM) “é e será mais um fardo para as contas públicas” moçambicanas. O alerta é lançado pelo Centro de Integridade Pública (CIP), que aponta a má gestão e a interferência política como os principais motivos para o que diz ser uma “degradação alarmante” da ADM.

    Segundo o jornal moçambicano Magazine Independente, o Tribunal Judicial de Maputo congelou as contas da empresa – que já acumula uma dívida de 17 mil milhões de meticais (cerca de 240 milhões de euros). A DW África falou com Celeste Banze, economista do CIP, sobre a situação actual da empresa pública que gere os aeroportos moçambicanos.

    DW África: O CIP diz que a ADM “é e será mais um fardo para as contas públicas”. O que leva a esta conclusão?

    Celeste Banze (CB): O CIP fez uma análise sobre os Relatórios de Contas da ADM no período de 2012 a 2016. Nesta altura a análise já mostrava que os aeroportos já eram um fardo para as contas públicas e será um ónus para as gerações futuras. Porque a ADM é uma empresa, que vem contraindo dívidas para a construção de grandes obras e reabilitações do diversos aeroportos. Contrai dívidas a longo prazo e dívidas em moeda estrangeira, a maior parte das dívidas é em moeda estrangeira. Estas dívidas são muitas vezes acompanhadas de cartas de conforto. O que são “cartas de conforto”? O Estado emite garantias para que estes empréstimos sejam cedidos à ADM. Se os aeroportos não têm capacidade de reembolso para estes empréstimos, o Estado vai entrar e vai pagar. É uma empresa que não tem capacidade para reembolsar as dívidas que vai fazendo.

    DW África: Na nota de divulgação do estudo do CIP é mencionado o mais recente desenvolvimento, o congelamento das contas da ADM pelo Tribunal Judicial de Maputo. O que é que isto significa, na prática?

    CB: O que eu entendo é que o nível de endividamento da ADM é elevado e provavelmente estejam a não fazer face aos pagamentos das prestações e por via disso houve o tal congelamento das contas. Mas já está provado que a maior parte destas obras não é rentável o suficiente para que os aeroportos tenham capacidade de fazer face aos serviços da dívida. Adicionalmente algumas das receitas dos aeroportos são em dólares ou em moeda estrangeira. Mas não tem sido o suficiente para reembolsar a maior parte dos empréstimos para a construção destas infraestruturas, que tem sido em dólares. Eu posso dar exemplos de alguns empréstimos que foram contraídos para a construção do aeroporto de Nacala. Já a 31 de Dezembro de 2016 a dívida era aproximadamente 60 milhões de dólares. Então numa altura destas pode ser que tenham pago algumas prestações, mas ainda é uma dívida alta. Se os aeroportos já não têm capacidade para fazer face aos serviços da dívida hoje, este ónus será um fardo para o Orçamento Geral do Estado e será um ônus para as gerações futuras.

    DW África: Falava das “cartas de conforto” do Estado. Há alguma forma de limitar este aval, alguma forma de limitar a dívida contraída pela empresa?

    CB: O que acontece é que algumas das infraestruturas são decididas um pouco a nível politico. Por exemplo, a construção do Aeroporto de Xai-Xai parece mesmo uma decisão política, então quando há interferência política na gestão das empresas públicas o que acontece é que o nível de fiscalização é menor. Não há nenhuma prerrogativa e nenhum impedimento para emissão de “cartas de conforto”. O grande problema dos aeroportos são os maus indícios de má gestão e a interferência política. Quando existir menos ou não existir interferência política, aí sim poderemos dizer que haverá limitação para emissão de “cartas de conforto”, mas enquanto estes dois factores estiverem conjugados, que é indício de má gestão e interferência política não temos como limitar a emissão de “cartas de conforto” porque são decisões políticas e decisões de topo. E como é que um ministro vai contradizer uma decisão de topo?

    DW África: Quando falamos do topo, estamos a falar da Presidência…

    CB: Na nota que o CIP elaborou já mostra que há uma certa promessa política pelo menos do Presidente Filipe Nyusi a dizer que o Aeroporto de Xai-Xai já é uma realidade. Quando o próprio Presidente já mostra e diz que já é uma realidade ainda que o Aeroporto de Xai-Xai seja um projecto inviável, por estar muito próximo do Aeroporto Internacional de Maputo, de que forma haverá uma outra ordem superior a dizer que isto não é uma realidade porque os aeroportos não têm condição ou estrutura financeira para construir o Aeroporto de Xai-Xai?

    DW África: O CIP diz que é preciso uma reforma urgente das empresas públicas. O que é preciso fazer para travar a má gestão, a interferência política?

    CB: Eu vou dar um exemplo, no Orçamento Geral do Estado não temos informação nenhuma sobre as empresas públicas. Isto não pode ser, tem que haver transparência e disponibilidade de informação. Poucas empresas emitem e publicam os seus relatórios e contas. A partir do momento em que pelo menos as empresas públicas começarem a agir de forma mais transparente já teremos meio caminho andado para que sejam colmatados esses indícios de má gestão. E um outro aspecto é claramente a interferência política. Porque há muita interferência política na gestão das empresas públicas, faz com sejam tomadas decisões que não são acompanhadas de estudos de viabilidade. O que acontece é que muitas delas estão falidas e precisam de ser reestruturadas.

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