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    Floresta do crime no Ramiro

    Instituto de Desenvolvimento Florestal, está a tornar-se um campo de crimes de vária ordem.

    Moradores do bairro da Floresta, na comuna do Ramiro, município da Samba ,em Luanda, revelaram a O PAÍS, quarta-feira, 21, que o centro de experimentação florestal do IDF (Instituto de Desenvolvimento Florestal) está a tornar-se um campo de crimes de vária ordem.

    As declarações dos vizinhos do autódromo de Luanda devem-se a uma série de mortes, roubos e violações que nos últimos tempos têm estado a acontecer no meio do arvoredo afecto ao Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural.
    “De Junho até hoje a situação agravou-se e quase que não há semanas sem uma ocorrência. Como a minha casa fica próxima da floresta, nos apercebemos sempre quando alguém sofre um assalto, é violado ou mesmo morto”, disse Teresa Menezes.

    Ela informou os repórteres sobre o depósito dos corpos de dois chineses, um dos quais queimado, e da violação de três mulheres. Mais de dez senhoras já perderam dinheiro nos sequestros protagonizados por supostos taxistas naquela área.
    Teresa Menezes, que apontou as mulheres como as vítimas preferidas dos malfeitores, contou que circulam na área dois jovens que supostamente prestam serviço de táxi, só no período da manhã e da noite. “Eles aproveitam aquelas horas em que as pessoas se apressam a ir para o serviço ou para a casa e só páram num sítio onde se encontram aglomeradas mulheres e crianças”, detalhou, denunciando que os carros são de marca Toyota Corola, um vermelho e outro preto. De acordo com a mesma fonte, nos últimos dias os referidos delinquentes
    preferem desviar as passageiras para dentro da floresta ou para a praia do Quilómetro 26, onde, depois de lhes tirar todo dinheiro, as violam.

    Para demonstrar que suas alegações transportavam uma verdade confirmada, a cidadã referiu-se a duas vizinhas, uma de mais de 40 anos de idade e outra de apenas 15, abusadas sexualmente na semana passada.
    Diz que a mãe da adolescente contou-lhe que a filha vinha do Benfica para casa, quando, de repente, parou ao lado um Toyota-Corola vermelho. O motorista anunciou-lhe que estava a fazer táxi, o que colocou a jovem sem escolha, visto que já escurecia.
    Ao aproximar-se da zona da floresta,a menina viu o carro desviar-se para a praia do Quilómetro 26. A mudança de percurso obrigou a menina a querer saber dos motivos da mudança de rumo. O falso taxista disse que, na praia, alguém aguardava pela sua boleia.
    Quando o carro parou, a rapariga viu uma arma apontada a ela, situação de terror que facilitou a consumação do desígnio do malfeitor.
    Abandonada e enfraquecida, ela esforçou-se a chegar perto da estrada, onde foi encontrada por conhecidos, que juntamente com alguns familiares já procuravam por ela.
    A família teve de providenciar todo tipo de consultas, análises e tratamentos a adolescentes, para que retomasse as aulas no dia da nossa reportagem.

    Avelino, outro morador da área, considera que o crime por ali já atingiu uma escala preocupante, por isso apela às autoridades da ordem pública a apressarem o programa de colocação de esquadras móveis. “A polícia já sabe do número de crimes que ocorrem aqui, então deviam ser rápidos a pôr aqui uma esquadra móvel durante o dia e fazer algumas rondas nocturnas”, sugeriu o jovem, realçando que só assim se conseguirá estancar a onda de insegurança na zona.Sem querer canalizar também a atenção da polícia para outros bairros vizinhos, ele assegurou que seus familiares, amigos e conhecidos dos bairros Quilómetro 30, Matadouro, Mundial e Ramiro já vivem a mesma insegurança, ao ponto de se registar pouca circulação de pessoas nessas paragens, principalmente durante o período nocturno.

    “De Junho até hoje, a situação agravou-se e quase que não há semanas sem uma ocorrência. Como a minha casa fica próximo da floresta, nos apercebemos sempre quando alguém sofre um assalto, é violado ou mesmo morto”

    Engolidos pela floresta
    Abordados por este jornal, dois seguranças do IDF, destacados no local desde 1993, começaram por se queixar do número insuficiente de vigilantes para uma área tão vasta como é a sua de trabalho. “Duas pessoas a guardar isso tudo é como se não tivesse nenhum agente”, queixou-se um deles, ironizando que um dia não bastaria para circular por toda área verde.

    Em relação aos acontecimentos recentes, os guardas confirmaram os factos, tendo detalhado o caso de uma senhora recentemente violada por um suposto taxista, dentro da mata.“Ficamos a saber que a senhora vive mesmo aí na zona do Catambor, próximo da zona florestal, mas lamentamos o facto de ser já uma idosa”, disseram entristecidos.
    Os seguranças disseram ainda que os crimes nesse local não são coisa de hoje, pois já entre 2004 e 2009 a selva serviu de destino cruel a pessoas a assassinar e assassinadas.
    “Essa gente era mais capturada dos bairros do Prenda, Rocha Pinto e Cassequel”, precisaram os guardas, explicando que as suas deduções baseavam-se nos documentos pessoais encontrados no local do crime.
    Outra garantia dessas proveniências lhes tinha sido dada por um indivíduo que sobreviveu a um atentado do género.

    ALÍVIO

    Vítima escapa no limite

    Luzia, 31 anos de idade, moradora do bairro da Floresta há 2 anos, viu a vida correr perigo, quando, há dias, abordou a famosa “viatura do mal”, para seguir rumo ao Benfica.
    O facto de ter notado que no veículo andavam outras três senhoras vindas do bairro Mundial, despertou-lhe a curiosidade de rever a cor do carro. Ao se aperceber de que se tratava de um Toyota-Corola, vulgarmente conhecido por «Rabo de pato», pediu ao motorista que parasse, alegando que a pasta com o dinheiro tinha caído.
    O taxista parou o carro e ela saiu a correr, perdendo-se pelo bairro adentro. Horas mais tarde começou a ouvir os residentes falarem de duas senhoras que perderam 40 mil Kwanzas cada e uma terceira que tinha sido raptada e violada.
    “Fiquei muito chocada e comecei a pensar mil e uma coisas que deviam ter acontecido comigo, se não me decidisse inventar aquela mentira”, disse    a senhora, anunciando que, daquele dia em diante, prefere caminhar a pé até à estrada asfaltada, para tomar um táxi desses Toyotas-hiace azul e branco.
    O trauma da senhora era tanto que a única coisa que ela conseguiu reter do motorista é o casaco preto que este usava no dia do episódio.”Nem sequer consegui ver-lhe a cara”, lamentou, suspirando de alívio por ter escapado das garras do famoso  ́homem do carro vermelho ́.
    Luzia explicou que não participou o caso à polícia, porque outras já o haviam feito, semanas atrás, sem, no entanto, terem tido o devido apoio.

    PISTAS
    Suspeito na boca de todos

    Moradores, seguranças do IDF e o oficial-dia entrevistados por este jornal foram unânimes em apontar como principal actor dos roubos e violações ocorridos, nos meses de Agosto e Setembro, um jovem que conduz uma viatura de marca Toyota-Corola de cor vermelha, vulgarmente conhecido como “rabo de pato”.
    Embora o polícia tenha acrescentado na lista das suspeitas motoristas de Toyotas Rav 4, os guardas e os moradores insistiram em dizer que se trata sempre da mesma pessoa, que vai tentando baralhar os indivíduos atentos com a troca de carro.
    Os insistentes caracterizaram fisicamente a figura suspeita como sendo alta, magra e clara, para além de aparentar um comportamento bastante colérico.
    Eles desconfiam tratar-se de um militar ou polícia que não vive muito distante da área, já que, em todas histórias, se fala de manipulação de armas de fogo novas.
    Curiosamente, momentos antes de a nossa reportagem ter abordado os seguranças do Instituto de Desenvolvimento Florestal, estes tinham visto um carro vermelho passar pela porta da instituição, em direcção à zona do Autódromo.
    Os próprios referiram, na ocasião, que a viatura só costuma circular nos arredores, o que lhes assegura a desconfiança de se tratar de uma pessoa muito próxima das suas vítimas.

    ‘NÃO TEMOS PATRULHEIROS’
    “Nós não temos patrulheiro, por isso mesmo nos atrasamos a intervir nesses acontecimentos, ao ponto de o infractor ter todo tempo para se desfazer do local do crime”

    Em defesa da Polícia, o oficial-dia de quarta-feira, 21, identificado com o nome de Sargento Cobra fez saber à reportagem deste semanário que a esquadra policial a que pertence se atrasa a intervir nos casos participados pela população por não possuír nenhum carro-patrulha.
    “Nós não temos patrulheiro, por isso mesmo nos atrasamos a intervir nesses acontecimentos, o que dá tempo ao infractor para se desfazer do local do crime”, informou o oficial, tendo revelado que, muitas vezes, se servem de viaturas individuais para perseguirem os delinquentes.
    De acordo com Sargento Cobra, a única viatura de que dispõe a corporação do Ramiro é um Audi A 3, pequeno, que, em sua opinião, não facilita o trabalho de busca e captura, por causa da natureza das estradas dos bairros da jurisdição da sua esquadra.

    Vale lembrar que a única via asfaltada no Ramiro e bairros da mesma comuna é a Estrada Nacional 120, que liga as províncias de Luanda, Bengo, Kwanza Sul e Benguela. As que dão acesso aos bairros adentro estarão cheias de areia e alguns buracos, reclamando por uma nova terraplanagem.
    “Se nos metermos a perseguir alguém com este carro, corremos o risco de ficar enterrados”, disse.
    Sobre os casos da semana que antecedeu à da nossa reportagem, a esquadra do Ramiro recebeu participação por parte dos moradores da zona da floresta, segundo revelou Sargento Cobra, que anunciou um plano de acção social traçado pelo seu comando.
    “O nosso comandante decidiu levar a cabo um programa de mobilização e sensibilização dos populares em relação às medidas alternativas de segurança, tendo reunido com os moradores há coisa de uma semana”, referiu o policial.

    Evitar passar pela floresta no escuro e servir-se de taxistas ocasionais para chegar à casa ou ao local de serviço constam entre as recomendações dadas pelo sub-inspector da polícia Nacional, como as primeiras precauções. Outras têm a ver com a participação das ocorrências e denúncia de circulação de elementos estranhos no bairro, principalmente no período da noite ou de manhã muito cedo.
    A Polícia atribuiu ainda responsabilidades acrescidas aos guardas-florestais, a quem acorrem imediatamente os moradores, para informarem todas as queixas à unidade comunal do Ramiro.
    Quanto aos novos acontecimentos, que resultaram no roubo de dinheiro e estupro de três cidadãs, o agente da autoridade reconheceu a gravidade dos actos, tendo informado logo a seguir que os infractores estão a ser engenhosos pelo facto de saberem que a esquadra policial está a uma distância considerável dos locais dos crimes e, se calhar, por saberem também que os efectivos não dispõem de meios de transporte adaptados ao terreno.
    Há ocasiões em que os agentes em serviço no bairro do Ramiro se aliam aos da comuna da Barra do Kwanza, município de Viana, com os quais partilham o patrulheiro para algumas operações extraordinárias.

    Alberto Bambi
    Foto: O País
    Foto: O País

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