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    Os ciclos do preço do petróleo em Angola desde 1987 (2.ª parte)

    ALVES DA ROCHA Economista e Docente universitário (Foto: D.R.)
    ALVES DA ROCHA
    Economista e Docente universitário
    (Foto: D.R.)

    Qual a verdadeira história do preço do petróleo e os factos a que está ligada? O gráfico seguinte mostra o seu comportamento numa perspectiva de longa duração (Maio de 1987 a Junho de 2015, 338 observações).

    Até sensivelmente Janeiro de 2002, o preço médio mensal do barril de petróleo oscilou sempre na vizinhança de 20 USD. O grande boom no valor desta commodity energética situou-se entre a anterior data e Janeiro de 2008. Justamente este período foi o que registou as mais elevadas taxas de crescimento do PIB em Angola.

    A queda brusca verificada durante 2008 e 2009 – que consequencializou uma drástica revisão do OGE – coincidiu com a crise financeira do subprime nos Estados Unidos da América e da queda do crescimento do PIB mundial e das principais economias desenvolvidas e emergentes. Sendo fácil entender que a ‘mini-idade’ de ouro do crescimento económico do País (2002/2008) apresenta uma forte correlação com o preço e as receitas do petróleo, já o mesmo não é identificável com o período entre Maio de 2011 e Junho de 2014.

    Na verdade, a taxa média anual de crescimento do PIB foi de apenas de 3,4%, contra 11,1% no período dourado. Duas razões fundamentais podem ser aduzidas. Por um lado, a redução da produção petrolífera – devida a problemas diversos, uns de natureza técnica e outros de organização e investimento. A taxa média anual de variação foi de -2,2%, com parciais de -5% em 2009, -0,6% em 2010, -8,1% em 2011, 5,3% em 2012, -0,6% em 2013 e -3,5% em 2014.

    Por outro, também a economia não petrolífera experimentou alguns obstáculos, tendo a sua taxa média anual baixado de 12,8% entre 2002 e 2009, para 7,7% entre 2010 e 2014. Um sinal claro de que novas fontes de crescimento teriam de ser encontradas, em especial através da diversificação das exportações. Em termos sintéticos, a economia angolana já foi afectada por duas vezes pela queda do preço do barril de petróleo, uma em 1998 e outra em 2008/2009. A presente crise é a terceira, depois da independência do País.

    Durante a longa duração – 1987/2015 – o preço médio do barril de petróleo foi de 44,8 USD. Durante este extenso período, podem ser estabelecidos alguns subperíodos, de acordo com a sua relação a determinados acontecimentos nacionais e internacionais.

    ? Período Janeiro de 1990 a Dezembro de 1999 – O facto mais relevante foi o da transição para a economia de mercado, após a adesão de Angola ao FMI e Banco Mundial em 1984 e de ter sido aprovado o SEF (Programa de Saneamento Económico e Financeiro). Depois da assinatura dos Acordos de Bicesse e da Conferência Internacional de Doadores, em 1995, em Bruxelas, a guerra civil generalizou-se a todo o território nacional. A taxa média anual do PIB neste período foi negativa e estimada em -3%, com uma crise económica em 1993 e 1994, com o PIB a regredir 21% e 20%, respectivamente. Foi também a fase da hiperinflação em Angola, com registos de 1.837% em 1993, 971,9% em 1994 e 3784% em 1995. O preço médio mensal do barril de petróleo foi de 18,3 USD.

    ? Período Janeiro de 2001 a Dezembro de 2001 – Como ocorrências mais notáveis podem ser registadas o novo modelo de gestão macroeconómica (uma muito maior relação entre a política monetária e a política orçamental) e a mudança de toda a equipa económica de então. Do ponto de vista político, eram visualizáveis sinais de que o conflito armado estava próximo do seu fim, urgindo, por conseguinte, preparar a economia para a fase de reconstrução. De negativa, a taxa média anual de variação do PIB de negativa passou a positiva (3%). O processo de desinflação da economia foi posto em prática, favorecido pelo aumento das reservas em divisas e pela nova convergência entre as políticas macroeconómicas, do que resultaram taxas de inflação de 268% em 2000 e de 115% em 2001. O preço médio mensal do barril de petróleo foi de USD 26,5.

    ? Período Janeiro de 2002 a Dezembro de 2008 – Destaca-se a fantástica dinâmica de crescimento do PIB, ainda que de muito menor intensidade do que aquela que o Governo ia anunciando (foi possível corrigir em baixa estas taxas graças às Contas Nacionais). O País beneficiou de montantes significativos de receitas da exportação do petróleo e de receitas fiscais com a mesma origem (190 mil milhões USD para as primeiras e cerca de 107,3 mil milhões USD para as segundas) e os investimentos públicos em infra-estruturas ascenderam a 27,4 mil milhões USD. 2005 (15%) e 2007 (14%) foram os anos de maior crescimento do PIB, em 40 anos de independência política1. O processo de desinflação continuou firme, graças também à utilização da âncora cambial para controlar a dinâmica de subida dos preços permitida pelas fantásticas reservas em moeda externa. O preço médio mensal do petróleo foi de 54,4 USD.

    ? Período Janeiro de 2009 a Dezembro de 2010 – O acontecimento mais marcante foi a grande crise financeira e económica internacional que deixou em Angola rastos que ainda hoje influenciam o comportamento do PIB. É pouco credível que o País volte a ter registos de crescimento tão impressivos como os ocorridos durante a mini-idade de ouro. Ocorreram outros factos: diminuição das receitas do petróleo, quer as destinadas à economia, quer as de propriedade do Estado, decréscimo do investimento público em 7,5%, forte atenuação do crescimento económico (taxa média anual de 2,8%), subida da taxa de inflação e instalação de um clima de certo descrédito quanto às capacidades e dinâmicas de crescimento sustentável da economia. O preço médio mensal do barril do petróleo foi de 70,5 USD.

    ? Período Janeiro de 2011 a Dezembro de 2014 – Grande turbulência no mercado petrolífero internacional com uma queda do preço médio do barril, entre Junho e Dezembro de 2014, de 44,2%, implicando a obtenção de uma taxa média de variação do PIB de apenas 4,1%. Os Estados Unidos transformam-se no maior produtor mundial de petróleo, enquanto prosseguiu o braço de ferro com a OPEP e a Arábia Saudita quanto ao não ajustamento em baixa da produção da organização. Sinais de que a inflação em Angola volta aos níveis dos dois dígitos e apresentação do OGE 2015 elaborado em bases completamente irrealistas. O preço médio do petróleo neste período foi de 107,6 dólares por barril.

    ? Período Janeiro 2015 a Julho de 2015 – A grande questão é a de até onde poderá baixar o preço médio do barril de petróleo. Segundo diversas agências internacionais a economia mundial poderá, de novo, entrar num período de petróleo barato, o que favorecerá o seu crescimento. Em Angola, este período é marcado por sucessivas revisões em baixa dos principais agregados macroeconómicos, conforme já referido anteriormente. A inflação anual homóloga em Julho foi de 10,4% e a tendência é para que a taxa de inflação acumulada no final do ano se venha a situar em mais de 12,5%.

    O preço médio do barril de petróleo neste período foi de 56,9 dólares. Podem ser elencadas algumas conclusões:

    Uma conclusão geral decorrente da análise do comportamento de longo prazo do preço médio mensal do barril de petróleo é que foi inferior a 45 USD, estando, portanto, os valores mais recentes ainda dentro desta fasquia. Só que as necessidades de financiamento da economia e do Estado são hoje incomparavelmente maiores do que nos períodos em que o preço médio se situou na vizinhança de 30 USD o barril, sendo igualmente de muito maior expressão a corrupção e a necessidade de alimentar uma elite política e empresarial do MPLA com um poder financeiro absolutamente notável.

    Durante quatro anos consecutivos, o País beneficiou de um preço médio mensal acima de 100 USD o barril, o que lhe permitiu acumular receitas fantásticas em divisas e impostos.

    Depois de Dezembro de 2014, o preço médio do barril de petróleo tem decrescido sistematicamente. As incertezas e as dúvidas sobre como a economia nacional poderá evoluir no futuro mantêm-se e a confiança em que se possa sair da actual crise tem sido cada vez menor. (expansao.ao)

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