Vocês se lembram daquela epopeia do “Guarani Kaiowá” em cada primeira postagem no Facebook? Pode se preparar para uma nova onda. O governo do Brasil votará, em breve, uma emenda à Constituição que sugere a possibilidade de exploração de recursos minerais e energéticos em terras indígenas demarcadas.
Trata-se de uma emenda ao artigo 231 da lei, que é o primeiro artigo do capítulo VIII, que trata “Dos índios”. A emenda é assim, conforme a cita o Diário do ABC: “[…] aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional”.
Já o original diz assim, parágrafo 2º do mesmo artigo: “As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”. “Uso exclusivo” pelos índios das riquezas das suas terras cria um pouco a sensação de eles deterem uma parte dos recursos terrestres do Brasil sem compartilhar com o Brasil. Doutro lado, se o Brasil foi tão generoso como para conceder partes do seu território a povos que não reconhecem na integridade a civilização contemporânea, seria lógico se essas partes continuem sendo uma espécie de micro-Estados.
A proposta vem na época da crise hídrica no país, com vários dos principais sistemas de abastecimento de água funcionando a ponto de não aguentar mais.
Antes, já tinha a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, do ano 2000, que será examinada de novo em breve por uma Comissão Especial. A PEC 215 queria munir o Congresso Nacional de poderes para aprovar demarcações de terras indígenas e ratificar as demarcações já homologadas pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI).
Também a questão da energia elétrica entra em jogo. Para satisfazer todas as necessidades crescentes do país, mais hidrelétricas são precisas. E onde construir hidrelétricas senão na região Amazônica?
Perigos e benefícios
Segundo as normas vigentes, a construção de usinas na Amazônia (por exemplo) só pode ser realizada se não houver prejuízo aos povos indígenas que lá habitam. Mas há discussões que visam regulamentar o artigo 231 para tornar possível a construção e prospecção nessas regiões sempre (oficialmente) que haja uma compensação aos índios, o exemplo mais corrente sendo royalties.
Ou seja, uma compensação para uma produção nociva. É difícil que surta algum efeito de aprovação entre os índios. O caso de Belo Monte mostrou que o índio é uma potência nacional e precisa ser respeitado. A questão dos índios é sensível no Brasil. E não é rara a confrontação entre os interesses dos indígenas e do negócio.
Desta vez também, as lideranças indígenas demonstraram forte repúdio à iniciativa legal. Segundo eles, se for aprovada, iria tirar-lhes o que lhes resta de suas terras. E segundo os representantes do negócio, se não for aprovada, será preciso procurar novas opções de desenvolvimento.
E na verdade, é isso, eu acho. Os índios, em um sentido, favorecem o progresso, fazendo os políticos e o negócio pensar bem antes de pegar a primeira opção à vista e buscar soluções mais responsáveis. (ruvr.ru)
