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    Polícia fecha um call center de golpe do falso empréstimo por semana no Rio

    Durante três meses, o aposentado Silvio Mendes, de 67 anos, recebeu ligações e mensagens diariamente oferecendo empréstimos consignados. Diante da insistência da suposta funcionária de uma financeira e da oferta de lucro por meio de uma aplicação com o valor a ser creditado em sua conta, acabou cedendo a proposta. Além de visitar o escritório da empresa, no Centro de Niterói, na Região Metropolitana do Rio, fez o reconhecimento de firma da transação em cartório. Ao fechar o contrato e ter os débitos em seu contracheque, no entanto, percebeu ter sido vítima de um golpe praticado por uma quadrilha especializada em estelionatos:

    — Trabalhei por toda a vida como assistente de Departamento Pessoal, atuando na elaboração de folhas de pagamento. Então, sempre entendi minimamente de matemática financeira e fui muito reticente a contrair qualquer tipo de dívida por meio de empréstimos. Mas eles me ofereceram R$ 36 mil, que seria investido integralmente por eles, que me devolveriam R$ 968 por mês, além de R$ 300 de rendimentos. Por todo assédio que sofri e pelo ar de legalidade que me passaram, acabei acreditando no negócio, mas infelizmente só tive prejuízos.

    De acordo com inquéritos instaurados pela Polícia Civil do Rio, nos 45 primeiros dias de 2023 seis centrais clandestinas de empréstimos consignados foram fechadas em todo o estado — representando uma por semana. Nessas ações, 141 pessoas foram presas em flagrante por crimes como estelionato e organização criminosa — uma média de 23 suspeitos em cada uma das empresas. Em alguns dos casos, foram apreendidos manuais, com o passo a passo de como convencer as vítimas a contraírem as dívidas e caírem nos golpes.

    — Esses criminosos fazem um levantamento prévio de dados pessoais, sobretudo de pensionistas e aposentados e, dentro uma estrutura de call center, entram em contato oferecendo vantagens financeiras diversas, como a restituição de descontos indevidos de benefícios previdenciários, a portabilidade de empréstimos com redução de juros, a disponibilização de cartões de crédito, entre outros. A partir daí, solicitam que as pessoas compareçam ao escritório da empresa, onde são levadas a assinar documentos que viabilizarão a transferência indevida de valores pecuniários ao grupo — detalha a delegada Natacha Alves de Oliveira, titular da 76ª DP (Niterói) e responsável pela operação que prendeu cinco estelionatários na Rua São João, no Centro.

    A investigação foi iniciada na 76ª na primeira semana de dezembro do ano passado, quando os policiais observaram registros de ocorrência com a mesma dinâmica criminosa. Os inquéritos mostravam que, de forma organizada, supostos atendentes de telemarketing consultavam o banco de dados de clientes bancários, captando dados de possíveis vítimas e, por meio de um programa de discador, realizavam ligações oferecendo vantagens financeiras com o intuito de convencê-las a comparecer ao escritório.

    Dados pessoais e foto

    Já dentro da central, os criminosos informavam existirem valores a receber referentes a descontos indevidos de seu benefício do INSS ou comunicavam sobre a existência de um cartão atrelado ao CPF. No local, para concretizar as operações, solicitavam dados pessoais e uma fotografia do rosto ao lado da identidade. Com a imagem, eram realizados os empréstimos sem conhecimento das vítimas.

    Ao serem flagrados pelos policiais, eles admitiram usar bancos de dados para ter acesso a informações de pensionistas do INSS e ainda afirmaram seguir um roteiro fraudulento para ludibriar as vítimas.

    Na semana seguinte, também na Região Metropolitana, agentes da 72ª DP (São Gonçalo) prenderam nove pessoas aplicando golpes semelhantes. Uma das estelionatárias contou que também contrai empréstimos sem a anuência dos clientes.

    — Em depoimento, os integrantes da organização criminosa revelaram que, durante o contato telefônico, conseguem instalar um aplicativo que capta as informações do celular das pessoas. Eles então solicitam que elas entrem nos sistemas bancários e digitem as senhas, para receberem essas informações. Após o encerramento da ligação, são contratados os empréstimos — explica o delegado Márcio Esteves, titular da 72ª DP.

    A equipe de Esteves apreendeu nas centrais do crime roteiros usados pelos golpistas. Os bandidos se apresentam como sendo de um fictício “setor de verificações do INSS” e dizem que a vítima tem um valor a receber — no caso do call center alvo da operação, de R$ 1.900 a R$ 2.400. Os criminosos alegam que uma correspondência foi enviada, mas pode não ter chegado devido à mudança no endereço da pessoa. A partir daí, conseguem extrair as informações pessoais das vítimas.

    Os bandidos somem

    Na delegacia, os criminosos disseram, que ao terem o valor creditado na conta, as vítimas são incentivadas a realizarem uma transferência para a empresa, prometendo que arcarão mensalmente com as parcelas dos empréstimos. As investigações mostram, no entanto, que até o terceiro desconto no contracheque, os valores são de fato devolvidos. A partir de então, os pagamentos passam a não ser honrados e os atendentes mudam os números de telefone.

    — Esse bandidos me procuravam três vezes por dia por um mês. De tanto insistirem, me convenceram que podiam reduzir a taxa de juros de um consignado que tinha desde 2020. Enviei meus documentos para ele, por WhatsApp, e, para minha surpresa, foi creditado um novo empréstimo. Quando liguei para reclamar, eles pediram desculpas pelo erro e me disseram para devolver para a conta deles que o valor seria estornado. Mas não foi e depois disso nunca mais consegui falar com a empresa — lamenta um aposentado, de 72 anos, mencionando outra modalidade de golpe.

    Cuidados para não ser enganado

    Professor de Direito Penal da PUC-Rio, o advogado André Perecmanis orienta que, ao desejarem realizar negociações envolvendo valores, como empréstimos, as pessoas devem procurar instituições financeiras reconhecidas no mercado e nunca forneçam informações pessoais e bancárias ou enviem documentos a estranhos, seja de maneira física ou virtual.

    — O crime de estelionato é caracterizado por duas condutas: induzir alguém a erro ou manter essa pessoa em erro, se utilizando de alguma fraude e levando a vítima a uma falsa percepção da realidade. Nesse sentido, pessoas idosas, menos instruídas ou até com interesse em ganhos rápidos podem ser facilmente enganadas por esses estelionatários, que realizam promessas que não serão cumpridas, somente para levá-las a erro, fazendo-as acreditar no negócio jurídico e obtendo vantagem patrimonial indevida — pontua o criminalista.

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