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    O princípio do fim da era Merkel

    Após quase duas décadas, chanceler federal passa adiante a liderança de seu partido, a União Democrata Cristã. Definição do sucessor pode indicar quem será, daqui a alguns anos, o próximo chefe de governo da Alemanha.

    O próximo congresso da União Democrata Cristã (CDU) está cercado de expectativas. Está totalmente em aberto a decisão sobre quem sucederá a chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, na liderança da legenda – uma situação inédita para os democrata-cristãos, em se tratando de uma decisão central de pessoal.

    Para a reunião em Hamburgo estão credenciados 1.500 representantes da mídia. O cientista político Frank Überall considera histórica a decisão de Merkel de entregar agora a presidência do partido, e o congresso é uma data que definirá os caminhos para a CDU trilhar no futuro.

    A separação entre chefia de governo e presidência partidária é inusual na Alemanha, porém não inédita. Em março de 2004, o então premiê Gerhard Schröder entregou a liderança do Partido Social-Democrata (SPD), na disputa pela imposição de reformas sócio-políticas polêmicas, e seguiu chefiando por mais 18 meses a coalizão governamental com o Partido Verde. E a partir de 1974 Helmut Schmidt permaneceu chanceler federal por oito anos, enquanto Willy Brandt liderava os social-democratas.

    No que concerne os democrata-cristãos, é preciso voltar 50 anos na história: na década de 1960, Ludwig Erhard foi premiê por três anos, sem encabeçar a legenda. Depois dele, seu correligionário Georg Kiesinger esteve um ano à frente do governo, mas não da CDU.

    O mais tardar com Helmut Kohl ficou claro que para a figura de liderança o ideal é controlar ambos os setores. Assim, ele foi o chefe de partido de 1973 a 1998, e de governo entre 1982 e 1998, com a CDU como sua base de poder e a Chancelaria como seu Executivo político.

    Também para Angela Merkel ambas posições de ponta formavam um pacote. Por isso a mudança que se anuncia é uma ruptura tão importante. Mas a redistribuição dos dois cargos é um aspecto: pelo menos tão inusitada quanto ela é a competição aberta pela presidência democrata-cristã.

    “Para a CDU, também é uma experiência nova, emocionante, os delegados terem, de fato, uma escolha, e haver uma corrida dos candidatos”, comenta Überall, que leciona na Escola Superior de Mídia, Comunicação e Economia de Colônia.

    Nenhum especialista arrisca antecipar quem sucederá a atual líder, se Annegret Kramp-Karrenbauer (considerada antes pró-Merkel) ou Friedrich Merz (no passado, um de seus oponentes internos). Só em relação a Jens Spahn todas as enquetes são unânimes: no momento atual, ele não tem a menor chance de assumir a liderança democrata-cristã.

    A chanceler federal Merkel terá que se acostumar com o rosto de quem quer que seja eleito. Pois ele ou ela estará à mesa nas rodadas de coalizão, as reuniões do governo, realizadas a intervalos irregulares. Para Frank Überall, esse é “um ponto muito importante”: quem participa dessas conversas na Chancelaria Federal pode influenciar os debates, dar-lhes uma direção. Isso confere grande poder ao líder do partido.

    Seja como for, o politólogo prevê uma mudança sensível para a CDU. Sob Merkel, sem dúvida muito correu bem para o partido, “mas uma coisa praticamente não aconteceu, que foi realmente levar a fundo as controvérsias”. Tradicionalmente, um grande partido estabelecido possui diversas alas, direcionamentos diversos sob um só teto. Na CDU, estas são: a que tende para a esquerda social, a mais conservadora de direita, e a liberal-econômica.

    “E justamente a ala conservadora da CDU se sentiu, no passado, menos considerada e menos levada a sério”, diz Überall. O novo presidente certamente deverá “introduzir mais cultura de discussão no partido”, acredita. Pode ser que aí passe a se ver entre os democrata-cristãos mais daquela tensão positiva entre partido e missão governamental que há muitos meses agita o parceiro de coalizão SPD.

    Quem for chefiar a União Democrata Cristã não apenas servirá a legenda, mas também vai querer colocar sua marca própria e, consequentemente, ser conhecido. A expectativa comum é o presidente do partido ser o favorito quando Merkel também renunciar como premiê, e for escolhido o candidato conservador para as próximas eleições legislativas.

    Este terá, de qualquer forma, que indicar um novo secretário-geral, e assim apontar uma direção decisória. Kramp-Karrenbauer, a atual secretária-geral, não estará mais disponível para o cargo. Frank Überall não acha improvável que um representante “um pouco mais cortante” assuma, defendendo a linha partidária “de maneira mais intensiva e talvez mais ousada”.

    Aliás, o estatuto da CDU prevê a possibilidade de que um político seu seja chanceler federal, mas não presidente do partido. Assim, um chanceler federal democrata-cristão integrará sempre o quadro da liderança partidária, e, quem quer que seja o próximo líder, Merkel permanecerá no primeiro escalão da CDU.

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