Um relatório do Tribunal de Contas (TC) sobre os contratos assinados de junho a setembro no âmbito de um regime de exceção dos contratos públicos – criado para responder rapidamente à pandemia – encontrou enormes diferenças nos preços unitários pagos pelo Estado em compras de máscaras cirúrgicas e de ventiladores.
Se no caso das máscaras cirúrgicas o preço unitário de aquisição variou entre 65 cêntimos e 1,58 euros e se nota algum efeito de preços mais baratos em compras de maiores quantidades, nos ventiladores os preços unitários mais elevados surgem exatamente nos dois contratos (em oito analisados) onde se compraram mais ventiladores.
Num contrato publicado a 7 de junho de 2020 o Estado comprou 10 ventiladores por 100 mil euros, num preço unitário, segundo o TC, de 10 mil euros por ventilador – o valor mais baixo detectado no relatório.
Noutro contrato, publicado dia 21 do mesmo mês, foram comprados 100 ventiladores por 4,947 milhões de euros, ou seja, 49.477 euros por ventilador. Além disso, no contrato que envolveu uma maior quantidade de ventiladores, 243, publicado em agosto, o preço por ventilador também chegou aos 44.499 euros.
Pela análise da TSF aos dados disponíveis no site do Instituto Dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC), os dois contratos de maior valor, para comprar 243 e 100 ventiladores, foram assinados pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) com empresas chinesas, enquanto que os outros contratos foram assinados por outras entidades, de menor dimensão, do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
O relatório do TC, lido pela TSF, sublinha, no entanto, que apenas apresenta “conclusões retiradas da análise dos dados obtidos sem se proceder a qualquer apreciação de legalidade ou de mérito dos respetivos procedimentos e contratos”.
Falta de transparência
No mesmo relatório, o Tribunal de Contas volta a detectar um problema que já tinha encontrado numa primeira análise feita em junho e que “limita a melhor e mais fina apreciação dos contratos”.
“Permanecem insuficiências na publicitação e na comunicação”, nomeadamente de contratos publicitados no portal oficial do IMPIC mas não comunicados ao Tribunal de Contas e vice-versa.
Concretizando, o relatório dá o exemplo dos contratos de maior valor, acima de 350 mil ou 750 mil euros, em que o portal do IMPIC divulga 224 contratos, dos quais o TC apenas teve conhecimento de 50 – ou seja, 22%, percentagem inferior ao período analisado no primeiro relatório publicado em junho (36%).
Por outro lado, continuando nos contratos de maior valor, foi dado conhecimento ao TC da existência de, pelo menos, 15 adjudicações ou contratos que não se encontram publicitados no portal oficial onde se têm de divulgar os contratos públicos.
Falhas que levam os juízes do Tribunal de Contas a fazer pela segunda vez as mesmas recomendações às entidades do Estado que assinam contratos públicos, nomeadamente que, como a lei exige, comuniquem ao TC e ao IMPIC essas compras, preenchendo, igualmente, “com maior rigor, os campos disponíveis no formulário de comunicação de contratos ao Portal BASE, nomeadamente no que se refere ao objeto contratual, ao prazo de execução e ao local de execução, concretizando-o, pelo menos, ao nível do concelho”.