Quatrocentos e três jornalistas foram investigados e tiveram o perfil ideológico traçado para as cúpulas da OMC e do G20 em Buenos Aires, denunciou a actual direcção da Agência Federal de Inteligência (AFI), que pediu para interrogar o ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019).
“A denúncia judicial foi apresentada na sexta-feira passada e amanhã (segunda) será aportada toda prova”, disse neste domingo (7) à AFP uma fonte oficial que pediu para ter a identidade preservada.
A lista de investigados inclui dezenas de jornalistas de veículos estrangeiros, entre eles vários da AFP, bem como uma centena de académicos, empresários e outras personalidades da sociedade civil.
O material foi encontrado em três envelopes com as legendas “2017”, “Jornalistas G20” e “Vários”, dentro de um cofre do gabinete que era ocupado pelo ex-director operacional da Área de Contra inteligência da AFI.
A capital argentina sediou a cúpula da OMC em 2017 e um ano depois, a do G20.
“A investigação sobre os jornalistas eram simples. Recolhiam informação nas redes sociais e daí era traçado um perfil ideológico e político”, explicou a fonte.
Em sua denúncia judicial, a interventora da AFI, Cristina Caamaño, destaca que constam das fichas “preferências políticas, publicações em redes sociais, simpatia com relação a grupos feministas e de conteúdo político e/ou cultural, entre outras”.
Junto aos nomes, aparecem comentários como “mostra-se muito crítico sobre o actual governo”, “mostra afinidade com o peronismo”, “apoia o governo”, “pediu no Facebook a libertação de [o ex-presidente brasileiro] Lula” ou “apoiou o aborto legal”.
Segundo o perfil ideológico, tinham as fichas marcadas com as cores verde, amarela ou vermelha, supostamente para habilitar o credenciamento que os jornalistas tinham pedido à chancelaria argentina, uma prática que evoca uma prática da ditadura (1976-1983).
“Se for confirmado esse procedimento do governo de Maurício Macri, a ACERA repudia energicamente procedimentos dessa natureza, que são inadmissíveis em uma democracia e comprometem gravemente o exercício da profissão de jornalista”, manifestou-se em um comunicado a Associação de Correspondentes Estrangeiros (ACERA).
A Associação de Empresas Jornalísticas (ADEPA) pediu que a investigação judicial seja realizada “com celeridade, efectividade e independência” e advertiu pelo Twitter que, se confirmadas as denúncias, “tais condutas seriam incompatíveis com o Estado de direito”.
A Federação Argentina de Trabalhadores da Imprensa (FATPREN) e o Sindicado de Jornalistas de Buenos Aires (SIPREBA) também manifestaram seu repúdio.