Com Trump à frente, populismo e interesses nacionais ganham relevância e impedem busca conjunta de soluções para problemas globais. Assim o G20 não deve durar muito, opina o enviado especial Bernd Riegert.
Dez anos depois de sua criação, o Grupo dos 20 (G20), na qualidade de fórum para a solução dos problemas mundiais, está claramente em risco. Fundado como forma de regulamentar os mercados financeiros internacionais, que haviam saído de controle em meio a uma grave crise, o formato do G20 se tornou obsoleto.
Isso não porque esteja errada a ideia de que problemas globais exigem soluções globais, mas porque a vontade política de muitos participantes se perdeu: isolamento, nacionalismo, proteccionismo estão ganhando relevância como resposta à crise financeira, às supostas consequências de uma globalização sentida como desenfreada.
Líder dessa tendência é sem dúvida alguma o atirador é mesmo Donald Trump, um desconstrutivista assumido, ou seja, alguém que quer destruir a ordem estabelecida porque acredita que ela não lhe serve. Nisso ele simplesmente cria novas regras, que favorecem apenas a ele mesmo. O que interessa é o resultado rápido e a popularidade em casa, sem se importar com os outros e com o resto do mundo. E Trump – e isso é fatal – não está sozinho.
O presidente russo, o príncipe herdeiro saudita, o autocrata turco e o presidente chinês, todos reunidos no G20, não dão muita bola para Direito e Justiça. E esse clube do “Meu país primeiro” ganha cada vez mais membros. No México, um populista acabou de assumir o poder. No Brasil, um radical de direita assumido entrará em Janeiro no Palácio do Planalto. Tudo isso cria perspectivas ruins para a próxima cúpula do G20, em Osaka, no Japão.
A chanceler federal da Alemanha, o primeiro-ministro do Canadá, o presidente da França e os representantes da União Europeia – que ergueram a bandeira do multilateralismo em Buenos Aires – estão cada vez mais isolados. Mesmo dentro da União Europeia é perceptível que populismo e interesses próprios ganham força. O exemplo mais recente é o governo populista da Itália.
A árida declaração de intenções da cúpula do G20 em Buenos Aires deixa a impressão de que esse clube, que reúne representantes de dois terços da humanidade, é só uma casca sem conteúdo. É verdade que os signatários ainda se declaram a favor de uma reforma do sistema de comércio internacional. Ao mesmo tempo, porém, partes do grupo punem-se mutuamente com taxas de importação, na esperança de abocanhar uma fatia maior do bolo da economia mundial. Teoria é uma coisa, a prática é bem outra.
Trump, que participou de apenas alguns encontros no G20, provavelmente logo dará cabo do grupo. Seu assessor de segurança considera o fórum supérfluo, apesar de ele ser o único órgão de tomada de decisões politicamente relevante em nível global. É cada vez mais difícil explicar para o público e para os eleitores no próprio país – isso quando os há – para que o G20 serve se há nele cada vez mais grosseirões que só pensam nos próprios interesses.
Até hoje, o G20 não conseguiu nem mesmo cumprir sua tarefa primordial, ou seja, regulamentar em nível internacional a taxação de empresas da era digital. Ela foi mais uma vez adiada, por pressão dos Estados Unidos, para a cúpula depois da próxima, caso esta venha mesmo a ocorrer. Rebaixar o G20 para o nível ministerial, como antes de 2008, ou mesmo acabar com o grupo seria uma vitória que não se deveria permitir para os nacionalistas. Assim, o provável é que as cúpulas continuem, mas o G20 pode facilmente virar um morto-vivo a caminho da execução política.