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    Polícia reforça combate à criminalidade violenta

    Todos os dias ouvem-se rumores de que um carro foi roubado, um cidadão foi assaltado, que uma criança foi violada. Tudo isso indica que o índice de criminalidade em território nacional está a aumentar. Em entrevista ao Jornal de Angola o 2º comandante Geral da Polícia Nacional, comissário Chefe Paulo de Almeida, afirma que vai-se inverter brevemente esta tendência dos crimes, sobretudo violentos, cometidos em Angola, reforçando a capacidade de resposta das forças policiais. Para o efeito, vai ser criada uma unidade que se vai denominar “Unidade Anti-Crime”, que terá a missão de reforçar as unidades policiais no combate ao crime violento.

    Jornal de Angola – Como se justifica a subida dos índices de criminalidade, que na prática cresce diariamente no país?

    Paulo de Almeida – Realmente nos últimos meses temos vindo a registar com muita preocupação um ligeiro aumento dos crimes de carácter violento. Esta situação tem-nos levado a algumas reflexões, mas chegamos à conclusão que as causas são aquelas que todos nós já dominamos. Existem factores de ordem social e económica que influenciam no comportamento destas pessoas à margem da lei. Isto por um lado. Por outro lado, também reconhecemos que a cobertura policial ainda é muito deficiente, dando espaço aos delinquentes para movimentarem-se com alguma facilidade. Portanto, o problema da criminalidade é um fenómeno transversal, onde devem intervir várias instituições na prevenção e combate.

    JA – Que factores em concreto são esses?

    PA – As razões estão descortinadas. Por exemplo existem factores exógenos tais como desemprego, expectativas de vida e sociais frustradas, desurbanização anárquica, carências de vária ordem, falta de iluminação das localidades, legislação penal desactualizada, miúdos de rua, mercados informais descontrolados, enfim, uma série de situações anormais que ainda propiciam a prática de crimes. Factores endógenos: falta de efectivos e meios para melhor cobertura policial e consequente resposta oportuna.

    JA – Mas alguma coisa tem de ser feita?

    PA – É verdade que alguma coisa tem de ser feita. Entendemos que a questão da criminalidade deve ser vista com maior profundidade e com um sentido mais estratégico. A segurança nacional é um “substantivo comum” e transversal ou multissectorial. E se nós quisermos de facto combater a criminalidade e pô-la na insignificância, temos de reunir esforços, no sentido de cada instituição afim poder cumprir com a sua missão.

    JA – O que a Polícia pensa fazer para reverter o quadro da criminalidade violenta?

    PA – Com as forças e meios que temos vamos desenvolver esforços no sentido de operacionalizar melhor as nossas acções. Vamos criar unidades mais especializadas para combater este tipo de crime. É assim que pensamos criar uma Unidade Anti-Crime, com a incumbência de reforçar as forças da ordem pública nas missões de combate ao crime violento.

    JA – Vão ser unidades permanentes?

    PA- Não. São situações ainda excepcionais. Na próxima legislatura pensamos levar à aprovação uma estrutura orgânica da Polícia mais consentânea com a realidade actual da situação de segurança pública, bem como rever a questão do estatuto da Polícia e do Polícia e a sua dinamização como corporação policial.

    JA – A Polícia acha-se capaz de assumir as suas responsabilidades como força principal da manutenção da ordem pública?

    PA – Nós temos quadros! Doutorados, mestres, licenciados, especialistas e técnicos em várias especialidades. Somos vitoriosos neste domínio. O que nos falta são meios e as vezes mais facilidades para podermos desenvolver os nossos conhecimentos. A Polícia evoluiu muito e hoje requer mais aberturas para desenvolver os programas que tem em carteira.
    JA – Que condições estão a ser criadas para assegurar o período eleitoral?
    PA – Temos vindo a preparar-nos há dois anos, sobretudo na formação do pessoal que estará envolvido no asseguramento deste evento. É um período excepcional e para estes períodos excepcionais nós temos programas próprios que já estão a ser executados. Todos os esforços estarão postos à disposição para que o cidadão se sinta com segurança durante o período de eleições.

    JA – Será que depois das eleições tudo voltará ao ponto zero?

    PA – Não. Nós funcionamos na base de programas. Também já temos gizado o programa pós eleições. É claro que não teremos a mesma carga operacional como teremos no período das eleições, mas vamos continuar a garantir a ordem e tranquilidade nos períodos posteriores. Contudo voltamos a afirmar que há toda uma necessidade de se pensar em investimentos sérios para a Polícia Nacional, para não continuarmos a fazer políticas de manta curta, isto é, quando sentimos frio na cabeça puxamos a manta para tapar a cabeça e destapamos os pés ou então vice-versa. Também temos que reconhecer que temos de corrigir muitos erros: a postura do agente na via pública, a abordagem do agente ao cidadão, o atendimento dos reclamantes nos guichés dos postos policiais, o atendimento do Polícia nas instituições policiais, enfim, impor uma certa disciplina na gestão e utilização dos meios públicos ao seu serviço. Portanto são os desafios que também temos pela frente.

    JA – Voltemos à questão da transversalidade no combate ao crime. Só a polícia não basta?

    PA – Só a Polícia não pode nem poderá dar um fim à criminalidade. Por isso, o primeiro esforço vem de casa, da família, da sociedade. Se assim não o fizermos, vai ser difícil não termos marginais. Portanto, a Polícia vai inverter este quadro reunindo esforços de conter e neutralizar as acções marginais, mas aconselhamos que nos próximos tempos se crie um conselho de segurança nacional para se debater as várias questões que encerram a problemática da segurança pública.

    JA – Muitos destes factores são do conhecimento da Polícia?

    PA – Dominamos a questão, mas queremos recordar que Angola é um país em crescimento e de grandes oportunidades. É um país de expectativas e isso faz com que muitos procurem encontrar vias fáceis para ter um modo de vida também fácil. Após a guerra, sentimos, ao contrário do que pensávamos, um êxodo das zonas rurais e do interior do país para as cidades do litoral. Muitas destas pessoas não têm emprego, não têm casa, deambulam pelas ruas à procura de uma oportunidade, e quando não as encontram enveredam pelo crime. Por outro lado, sentimos uma imigração ilegal galopante de estrangeiros ao nosso país que incentivam directa ou indirectamente os sindicatos do crime. Portanto tudo isto, nós temos combatido e na base de informações por nós colhidas.

    JA – A não aprovação da nova Lei Penal pode contribuir para o aumento do crime?

    PA – Não linearmente, mas temos que reconhecer que a lei vigente está desajustada da realidade penal em Angola. Ela já não desencoraja o criminoso. Julgamos ser urgente a sua revisão e aprovação. Mas também gostaríamos de alertar que nesses estudos, a Polícia fosse levada em conta na análise desse projecto de diploma, porque nós vivemos o dia-a-dia do crime e das suas causas, consequências e formas de melhor combater. Temos opinião.

    JA – Isso diminui a capacidade de intervenção da Polícia?

    PA – É verdade que a nossa legislação tem que acompanhar a dinâmica do momento. A criminalidade de hoje não é a mesma de ontem. O crime hoje já se apresenta organizado, mais violento e com propósitos bem definidos. Existem crimes que não estão tipificados na nossa lei e muitas vezes tem que se fazer algumas analogias para se poder julgar ou condenar esta ou aquela prática lesiva não tipificada. Daí que às vezes nos sentimos impotentes para actuar em casos que não estão tipificados na lei, mas que criam danos à sociedade.

    JA – E o que é certo?

    PA – O certo é acelerarmos o processo. Esta é uma das tais coisas que nós chamamos transversal e que os órgãos afins devem dar solução.

    JA – Fala de dificuldades de efectivos. Porque razão?

    P A – O país cresceu muito em termos de população de zonas habitadas ou urbanizadas que não obedeceram a um plano reitor, previamente concebido. Naturalmente que esta evolução foi tão rápida que deixou a Polícia para atrás. Não podemos acompanhar esta dinâmica porque estamos condicionados aos programas orçamentais e de recrutamento de pessoal concebido pelo Governo.

    JA- Existem efectivos acima de 50 anos de idade na PN?

    PA- Nós temos efectivos com 70 a 75 anos de idade no activo. Mais de 35 por cento dos nossos efectivos estão na faixa dos 50 anos para cima. Portanto temos muito pessoal em idade de reforma, em idade inadequada para o serviço operativo, o que reforça ainda o índice numérico da falta de efectivos. Só a título de exemplo, na província de Luanda nós temos um Polícia operacional para 2.500 homens. Em regra, a cifra é de 1 polícia para 200 a 300 homens. Por isso, não é possível podermos fazer um asseguramento eficiente com esta lacuna tão estrondosa.

    JA – Admite que em qualquer momento podemos entrar numa onda de violência descontrolada?

    PA – Não. Temos condições para conter a situação da criminalidade violenta, embora os índices sejam preocupantes. Não estamos para além daquilo que nós consideramos normal para o país. Agora temos que investir. Se quisermos ter uma segurança pública capaz. Não temos outra saída senão investir a sério na Polícia.

    JA – A criminalidade já tem conotações transnacionais?

    PA – Sim. E aqui falamos do tráfico de drogas. Angola serviu ou tem servido de placa giratória do tráfico de drogas proveniente da América Latina. Houve algum tempo em que o roubo de viaturas, gado, e mesmo assaltos a agências bancárias ou a viajantes portadores de valores tinham conotações com pessoas de países vizinhos ou próximos.

    JA – Como pretendem estancar a situação dos roubos bancários?

    PA – Os roubos nos bancos praticamente cessaram, conseguimos neutralizar. O que se passa agora tem a ver com pessoas que fazem levantamentos de altos valores monetários nos bancos e são assaltadas na via pública. Temos prevenido os cidadãos sobre os procedimentos que devem ter quando houver necessidade de fazer levantamentos avultados. Infelizmente não cumprem e são assaltados. Acreditamos que há uma certa conivência com alguns funcionários que fazem a tramitação destes expedientes. Estamos a trabalhar neste sentido.

    JA- Quantos crimes a polícia regista por mês?

    PA- Todos os dias desmantelamos e detemos mais de 100 indivíduos e grupos de marginais. Só no mês de Abril, em todo o território nacional, tivemos três mil crimes, uma média de 125 crimes por dia. Por isso devemos reflectir o porquê que vivemos essas situações.

    JA – Qual o número real da corporação?

    PA – Nós gerimos aproximadamente 100 mil homens. Portanto o nosso estatuto não pode ser confundido com outras estruturas de menor dimensão.  Corremos muitos riscos e somos responsáveis pela segurança pública do país. É altura de valorizar o agente policial porque se não o fizermos, não estamos a dar ânimo às pessoas que correm risco de vida e se sacrificam diariamente. Tudo isto contribui para o bom desempenho do policial.

    Fonte: JA

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