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    Henrique Barbosa // Tradição académica ao serviço da administração

    Henrique Barbosa
    O tom da conversa foi sereno, o nosso interlocutor mostrava dominar praticamente todos os aspectos relacionados com a sua província. Uma entrevista fácil e cordial.

    Como é que se pode caracterizar o Huambo neste momento em que comemora noventa e nove anos?
    Os noventa e nove anos da cidade do Huambo caracterizam-se por várias etapas da sua história, naturalmente, desde o período colonial. Vindo mais para cá, depois da independência, ao longo destes praticamente trinta anos de guerra que o país viveu, e se pensarmos que em 1975, o Huambo, com 63 anos de vida, era já a segunda cidade do país, com a sua importância económica e social e com um grande nível de crescimento e

    “A energia tem de ser barata, para sustentar as actividades económicas e produtivas”

    desenvolvimento, obviamente que o Huambo sofreu as consequências da guerra, até porque foi aqui no centro onde a guerra incidiu com muita força e por mais tempo … isso tirou ao Huambo aquele protagonismo de crescimento e desenvolvimento, porque sofreu a destruição da maior parte das suas infra-estruturas, fundamentalmente nos sectores agro-pecuário e industrial. O tecido empresarial também ficou destruído.

    Portanto, nestes 99 anos pode-se falar, quase, num recomeço?
    É que mesmo depois do alcance da paz viveram-se outras etapas para o renascimento e desenvolvimento. Houve, primeiro, uma fase de emergência porque, como consequência da guerra, a província teve cerca de meio milhão de deslocados. Muitas pessoas viram-se obrigadas a deixar a sua vida no meio rural para buscarem maior protecção junto das cidades. O Governo teve de tomar as necessárias medidas, criando os centros de reassentamento, onde ficou uma boa parte dos deslocados de guerra. Mas um bom dado é que logo após a assinatura da paz iniciou-se um percurso de regresso das populações às suas zonas de origem. Hoje pode-se dizer que cerca de noventa por cento da população regressou às zonas de origem.

    É natural que uma população maioritariamente camponesa volte aos locais onde possa trabalhar…
    Exactamente, voltaram para os locais onde tinham as suas casas, as suas terras. É um dado importante, a aptidão das pessoas que trabalham a terra e o uso da tracção animal. Mas continuando, depois vivemos uma fase de assistência com mais estabilidade. Com a estabilidade vieram os primeiros programas de investimentos públicos para começar a recuperar as infra-estruturas económicas e sociais. Daí que nove anos depois dos acordos temos o Huambo a marcar o seu lugar…

    Tem mais importância o regresso das pessoas ao campo, para o desenvolvimento do Huambo, ou será ainda o regresso da electricidade e do comboio, em pleno, no próximo ano?
    Há uma fase que se pode considerar como finalizada. Já não temos registos de deslocados ao redor da cidade, há um sentido de regresso muito positivo e muito marcante. O comboio virá ajudar a estabilizar mais ainda, se o considerarmos também um instrumento no combate contra a pobreza e promotor da unidade entre as famílias e entre as pessoas do país. O comboio passa por quatro províncias e permite o intercâmbio… enfim, é um grande factor de unidade nacional…

    Uma das marcas da guerra era a carência alimentar, com a necessidade de apoios das nações Unidas e de várias ONGs. Como está o Huambo em termos de produção alimentar… há ainda gente a precisar de assistência?
    Não podemos considerar que estão todos os problemas resolvidos, mas poderemos afirmar que já ninguém vive de doações de organizações estrangeiras, por exemplo, como as ONGs que, no período crítico, vieram com as suas doações para apoiar o Governo a mitigar os efeitos da fome. Hoje não vemos isso, até pela particularidade que é a propensão das pessoas para o desenvolvimento da agricultura, no trabalho da terra. Aqui emprega-se, com muita intensidade, a tracção animal, as juntas de bois e as charruas são neste momento bens importantes para as empresas agrícolas familiares. Por outro lado, os dados e os balanços que vamos tendo, obtidos dos estudos que se fazem nas campanhas agrícolas, falam de uma crescente tendência… e significativa, dos níveis de produção, quer falemos de milho, de batata, do feijão, ou dos produtos horto-frutícolas. Mesmo quando se registam anomalias nas chuvas, há aí uns três anos que os indicadores são muito animadores em termos de resultados da produção agrícola.
    O que é necessário agora é passar-se à fase de processamento desses produtos para dar-lhes um valor acrescentado.
    Daí a necessidade de energia, que tem de ser barata, para sustentar as actividades económicas e produtivas, por que sustentar as unidades hoteleiras, as indústrias que hoje existem com grupos geradores, os custos são altos e isso vai incidir, depois, nos preços. Mas, agora, a chegada do comboio vai permitir uma redução nos fretes para a transportação de bens, isso terá também um reflexo nos preços dos produtos e na vida das pessoas. A electricidade regular vai permitir a redução dos custos operacionais das unidades industriais, das empresas .

    “Huambo foi o segundo maior parque industrial do país, tinha uma classe de operários que dominava o manuseamento de equipamentos industriais”.

     

    “Uma boa parte das estradas na periferia da cidade do Huambo foi herdada do período colonial sem asfalto, hoje estão asfaltadas e esse trabalho foi feito por empresas nacionais”

    O Huambo está preparado para a industrialização e para o comércio? Estou a falar de capacidade técnica…
    Há aqui uma tradição, o Huambo foi o segundo maior parque industrial do país, tinha uma classe de operários que dominava o manuseamento de equipamentos industriais. Muitos deles agora estão em idade de reforma, mas é por isso que existe a aposta em fazer dos centros de formação técnica e profissional mais eficazes. Temos o centro de formação Fadário Muteka, por exemplo, ligado ao sector industrial, para a preparação de mão-de-obra jovem, capacitada, para o mercado de emprego que se vai abrir. Com a abertura do Instituto Médio Politécnico e do Instituto Superior Politécnico, e com as escolas técnico-profissionais, temos espaços de formação de excelência, dos futuros operários e técnicos que garantirão o funcionamento dos equipamentos do futuro pólo industrial. Neste aspecto temos alguma tradição. Aqui já havia indústrias têxteis, indústrias alimentares, a indústria ligeira com uma série de unidades e produzia-se de tudo um bocado.

    Recupera-se a indústria, e o mercado consumidor?
    Há dias esteve cá a senhor ministra do Comércio e analisamos esta questão muito importante que é o surgimento dos operadores logísticos para a absorção da produção interna, para o seu processamento, incremento da qualidade, o acondicionamento e embalagem para permitir a entrada no mercado de consumo de produtos como os horto-frutícolas, por exemplo, até para aproveitar a apetência natural de consumo de produtos locais. Precisamos de fazer o processamento da nossa fruta, por exemplo, para não ficarmos reféns do consumo de sumos importados, fruta importada, batata… por exemplo, temos estado a falar com a Shopprigth porque pensamos que não temos necessidade de consumir aqui batata importada da África do Sul. Mas precisamos de processadores e operadores logísticos, para calibrar a batata, seleccionar, e apresentá-la de forma atraente no mercado de consumo.

    O comboio é muito importante, mas ele traça uma linha que passa por alguns municípios e pela cidade do Huambo, como ficam as localidades mais afastadas, e que também produzem, em termos de transportes e em termos de vias?
    Temos que considerar que o Huambo, pela sua condição geográfica, tem algumas vantagens, porque uma boa parte dos seus municípios é servida por corredores viários nacionais, a rede fundamental de estradas do país, com a reabilitação dessas estradas, nove do onze municípios ficaram “bafejados pela sorte” porque tiveram o privilégio de ter boas estradas. Isso veio facilitar a circulação directa para cada um desses destinos. Mas o executivo local conseguiu concertar com as estruturas centrais a reabilitação das vias primárias que ligam aos outros dois municípios, o caso do Mungo, onde há apenas que concluir uma ponte, mas os trabalhos estão avançados, e o caso da Ekunha cuja estrada se atrasou um pouco por força da crise, mas que já não levará muito tempo. a tarefa agora centra-se na reabilitação das estradas secundárias e terciárias …

    “Com a abertura do Instituto Médio Politécnico e do Instituto Superior Politécnico, e com as escolas técnico-profissionais, temos espaços de formação de excelência”

    Pois, e são estas exactamente que mais servem a produção agrícola
    Certamente. Neste momento, como empenho de sua excelência o senhor governador, foi possível trazer empreiteiras e empresas que fizeram os levantamentos e os estudos nos princiapis troços e neste momento estão a ser negociados financiamentos para a reabilitação de uma boa parte da rede de estradas secundárias e terciárias.

    Haverá empresas nacionais nesta tarefa? É que se por um lado as autoridades se queixam de empresas que não cumprem as suas tarefas, há também empresários a dizer que o Estado é um péssimo pagador e que privilegia os estrangeiros.
    Há empresas angolanas a trabalhar neste processo de reabilitação na província do Huambo, na manutenção e no reasfaltamento. Uma boa parte das estradas na periferia da cidade do Huambo foi herdada do período colonial sem asfalto, hoje estão asfaltadas e esse trabalho foi feito por empresas nacionais. A cidade é um exemplo concreto. Mas as nossas empresas nacionais devem primar pela capacidade operativa e técnica, fazendo o trabalho com qualidade e nos períodos acordados. Houve alguns problemas nos pagamentos, mas que resultaram do tal processo da crise internacional, que também levou a um reajustamento macroeconómico do país.

    “aqui, mesmo que chova o trabalhador não falta, chega a horas”

    Quando alguém que cá esteve há três ou quatro anos e viu as ruas a serem asfaltadas, volta hoje e encontra as ruas bem conservadas, ao contrário do que acontece noutras localidades do país. Qual é o segredo do Huambo?
    Não há qualquer segredo. O importante é o reforço institucional das áreas, dos sectores. Não apenas nas direcções sectoriais, mas também ao nível das administrações municipais. Outro aspecto é a malha de redes de infra-estruturas de saneamento e escoamento das águas pluviais. Aqui, após uma chuva, são muito poucos os locais em que a água fica acumulada na superfície das estradas. Consideremos a situação geográfica e outras características naturais para somar à rede de esgotos. Por outro lado, como dizia, há um reforço da capacidade institucional ao nível das direcções. Neste aspecto a província do Huambo beneficiou imenso, porque no quadro da reforma administrativa foi possível enquadrar, ao nível departamental, vários quadros e técnicos de nível superior. Basta ver que quase todos os administradores municipais são técnicos superiores e uma boa parte dos directores provinciais são técnicos superiores, assim como os chefes de departamento. Também os quadros que foram colocados nos municípios, ao abrigo da reforma administrativa, são técnicos superiores. Há uma grande vantagem, porque o Huambo, e é sua tradição, como cidade académica, facilita ao executivo a mobilização e o recrutamento de quadros com alguma competência.

    “O nível de ociosidade e do absentismo é baixo. O cumprimento dos horários é uma espécie de cultura das pessoas. Isso marca a diferença, é a produtividade elevada dos quadros, dos técnicos, das pessoas, mesmo no meio rural. Isso é muito importante”

    Grande parte dos projectos do Executivo angolano para a área agrária tem o Huambo como ponto de partida, os lançamentos são feitos cá. Isto justificasse porque o Huambo tem mais necessidades ou por ser um bom exemplo de cumprimento?
    Acredito que deve ser dos bons exemplos de cumprimento. Uma das características principais desta província é a laboriosidade das suas gentes. Aqui, mesmo que chova o trabalhador não falta, chega a horas. O nível de ociosidade e do absentismo é baixo. O cumprimento dos horários é uma espécie de cultura das pessoas. Isso marca a diferença, é a produtividade elevada dos quadros, dos técnicos, das pessoas, mesmo no meio rural. Isso é muito importante.

    Os programas são lançados mas há imponderáveis como a falta de chuvas, por exemplo. Têm tido casos de pessoas que cruzam os braços, que vêm pedir apoio ao governo por não poderem honrar os seus pagamentos ao micro crédito, por exemplo?
    São raros, estes casos. Olhe que uma das experiências piloto do BDA (Banco de Desenvolvimento de Angola), um caso de estudo, foi um financiamento que les deram a uma cooperativa agrícola, a cooperativa Faça Tudo Pelo tempo, na Chipipa, com aproximadamente um milhão e duzentos mil dólares. Não está na estratégia do BDA financiar cooperativas, apenas empresas com personalidade jurídica. Mas a cooperativa foi buscar um consultor cadastrado no BDA, apresentou o seu projecto e mereceu aprovação. Até onde se sabe, eles têm estado a honrar os seus desembolsos regulares. Apesar dos constrangimentos ainda existentes no escoamento dos produtos do campo. Por isso mesmo o governador tem estado a baixar orientações para que o escoamento não seja apenas da responsabilidade dos produtores, mas que seja também uma das preocupações das administrações locais. O senhor administrador municipal deve ser o primeiro agente a estimular o desenvolvimento socioeconómico da sua área de jurisdição. Qualquer informação que ele receba sobre problemas no escoamento deve preocupá-lo e levá-lo a procurar soluções junto de quem de direito. À responsabilidade política e administrativa do administrador deve-se juntar a responsabilidade socioeconómica, com isso ganha o município.
    Estamos também a trabalhar num programa de absorção interna e na valorização da produção local, que é fazer despertar a consciência dos investidores e empresários locais para o agro-negócio e para a agro-indústria, para não se ficarem como agentes de venda a retalho, apenas virados para o comércio. O comércio foi uma fase importante, nasceu antes da indústria, historicamente, mas temos de motivar os nossos empresários a preparar as suas propostas de desenvolvimento industrial…

    Ora bem, com a chegada do comboio e com a electricidade barata do NGove virão muitas propostas de investimento, crescerá a pressão, o empresariado do Huambo vai ser ultrapassado, engolido? Até porque não é uma classe muito forte…
    Pensamos que não. Pensamos que o empresário do Huambo se irá adaptar à nova realidade que é marcada pelo comboio, pela energia mais barata e pela chegada de outros produtos e serviços mais atraentes e com preços competitivos. É aí onde veremos a capacidade de adaptação e o desempenho dos nossos empresários. Há uma classe nova de empreendedores na província, a maior parte deles jovens empresários, que estão a ser muito bem sucedidos. Há muita gente a viajar para a China, para a África do Sul, ao Dubai … participam em vários eventos… e há um processo de diálogo do executivo com os empresários locais onde são abordados vários temas. No último encontro tivemos o Dr. Aguinaldo jaime. Fala-se de programas, de legislação económica, de oportunidades, etc. porque queremos comunicar a disponibilidade de recursos de que a província dispõe, ao nível dos programas de investimentos públicos, nos programas de desenvolvimento rural e combate à pobreza, nos do Orçamento Geral do Estado, para induzir o empresariado local a agir, para aproveitar os recursos e as oportunidades.

    Estamos em plenas festas da cidade, mas há apenas um espaço para eventos que é o pavilhão do Ferrovia, não há um único cinema…
    Está em construção o Centro Cultural do Huambo, que terá salas de cinema, anfiteatros e outras valências para actividades culturais. Temos de admitir que, neste aspecto de oferta de recreação, ainda estamos em défice, mas tivemos cá uma equipa da EDICINE e do Ministério da Cultura a fazer um levantamento dos espaços de exibição de cinema. É preciso ainda um trabalho apurado, há poucas propostas de parceiros para reabilitar os cinemas da cidade. Mas a cidade cresceu, em 1975 seriam 300 ou 400 mil habitantes, hoje há cerca de um milhão e duzentas mil pessoas na cidade e na sua periferia. Isso implica investimentos em vários espaços culturais, em várias casas de cinema e até ao nível de discotecas. Nós temos apenas uma discoteca na cidade, o que resulta em sobre-lotação e falta de segurança, como é obvio. É uma questão de tempo, está-se a trabalhar para recuperar o Ruacaná, o Estúdio 404… há propostas para que investidores e o executivo recuperem estes espaços. O Huambo sente necessidade desta oferta também. Os jovens exigem. Mais dois ou três anos e tudo isso será ultrapassado.

    “Quase todos os administradores municipais são técnicos superiores e uma boa parte dos directores provinciais são técnicos superiores, assim como os chefes de departamento”

    O Huambo é das cidades para onde abala mais gente aos fins de semana e nas férias. Viria mais gente se houvesse mais oferta de camas.
    Precisamente. Fomos das primeiras províncias a apresentar o Plano Director do Turismo ao Ministério do Turismo, agora foi possível identificar os projectos e os passos necessários para criar as condições necessárias para criarmos infra-estruturas que apoiem o turismo. Um dos aspectos do plano prevê, para a cidade do Huambo, no médio prazo, até 2015 ou 2016, cerca de quatro mil camas. É preciso ver que há meia dúzia de anos tínhamos apenas uma unidade hoteleira com vinte camas e agora já estamos com cerca de mil camas. Neste momento estão em construção, na baixa, pelo grupo AAA, mais três unidades hoteleiras e há várias propostas em carteira para outras unidades hoteleiras. A direcção provincial de Hotelaria e Turismo tem conversado também com os investidores que requereram algumas unidades mas que ainda não lhes pegaram, é o caso do Hotel Almirante, do Excelsior e de outras.

    “É preciso compreender o Huambo com todas as suas consequências no contexto histórico, no contexto de guerra e agora no contexto de paz”.

     

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    O Huambo comemorou os seus 99 anos na passada quarta-feira, 21 de Setembro.

    Parece terem cessado as queixas sobre intolerância política no Huambo, há mais proximidade policial, houve mais diálogo para acalmar as coisas… o que aconteceu?
    Pensamos que com o trabalho da CPI, ouvindo os cidadãos, independentemente da sua cor política, porque foram levantadas muitas situações, ajudou a esclarecer muitas dúvidas e situações em torno disso. É preciso ver que o processo de pacificação não se faz num dia, num país que viveu trinta anos de guerra, com famílias separadas, numa país onde houve contendas, as feridas e as mágoas levam tempo a sarar, naturalmente.
    Mas pensamos que com o trabalho da CPI no terreno, ouvindo as autoridades tradicionais, os agentes políticos de todas as latitudes … e há que louvar a pessoa que esteve a frente da CPI, general Higino Carneiro, que fez um trabalho muito profundo, andando os onze municípios, permanecendo o tempo que tiveram de permanecer, toda a gente foi ouvida … as instituições religiosas, cidadãos, etc. Com todas as dúvidas que existiam, pensamos que esse trabalho foi também um bálsamo para os espíritos e na consciência das pessoas. Naturalmente que as feridas levam tempo para sarar, a guerra tem as suas consequências e pensamos que o trabalho da CPI foi salutar. Ao nível dos partidos políticos é também importante trabalhar no perfil do militante e do dirigente político, com formação, para que não fomentem nem sustentem a intranquilidade, para que não passem a vida a ameaçar as autoridades tradicionais, porque isso cria os seus dissabores.
    É preciso compreender o Huambo com todas as suas consequências no contexto histórico, no contexto de guerra e agora no contexto de paz. Os partidos têm que trabalhar para conquistarem o seu próprio espaço.

    Tem havido, da parte do Executivo, abertura para conversar com os partidos políticos na província?
    Naturalmente, o senhor Governador tem conversado com os representantes dos partidos, recebe-os em audiências. Esse trabalho é feito também por outras instituições como a polícia, que interage a protege as actividades dos vários partidos.

    O Huambo, tudo indica, será um ponto de batalha importante nas próximas eleições, pela importância histórica, pelo número de eleitores e pelo valor psicológico que representa. Pergunto a si se o governo do Huambo está a vontade, com a tarefa executada, ou teme ter espaço para muita crítica ainda?
    Pensamos que as pessoas entendem bem o trabalho do executivo, o grande esforço que se está a fazer. Nem tudo se resolve num dia, a pobreza não se vence de um dia para o outro, é um processo. Nas condições históricas em que herdamos o país, com todas as infra-estruturas destruídas, com um nível de analfabetismo muito alto e com um meio rural desestruturado … isso tem as suas consequências, naturalmente.
    O que com o que o executivo tem de se preocupar é trabalhar e mostrar a obra feita, elas convencerão o eleitorado. E trabalho é o que se tem estado a fazer. A chegada do comboio é um exemplo, a reabilitação da barragem do NGove é outro exemplo, o surgimento do pólo industrial é um terceiro.
    A instituição da Universidade José Eduardo dos Santos já vai dando os seus frutos, aquilo que eram núcleos hoje são faculdades, de facto, sustentadas, na maioria, por quadros angolanos, embora tenhamos também quadros estrangeiros … mas só o surgimento da faculdade de medicina, quando aqui os alunos iam apenas até ao segundo ano e o resto era para fazer em Luanda, é uma mais-valia enorme.

    “o Huambo também tem condições naturais para que a bacia leiteira vingue”

    A província do Huambo tem sido também notícia por motivos menos bons, como o caso da sinistralidade rodoviária, relata-se com frequência acidentes com grandes números de vítimas, isso mesmo quando o governo diz estar a prestar atenção ao transporte público entre sedes municipais e outras localidades. O que se está a passa?
    Há que organizar melhor a rede de transportes do serviço público. O primeiro passo foi dado com a entrega, por parte do Ministério dos Transportes, de autocarros para suprir as necessidades de transportes colectivos. Mas, efectivamente, falta ainda acabar de cumprir com o aspecto das paragens, é um passo necessário, a instalação de infra-estruturas de paragem, com os horários, rotas, para personalizar, na medida do possível, os serviços de transportes públicos. Há também que fazer surgir uma rede organizada de transporte de táxis.
    Por outro lado, a motorizada é hoje o meio de subsistência de muitos cidadãos e muitos deles ex-militares, alguns dos quais vivem no meio rural e que vêm a cidade fazer o serviço de táxi e depois regressam à casa. Está-se a trabalhar com a associação dos taxistas motorizados, apesar alguns problemas que eles tiveram na sua organização, houve acusação dos associados de desvios de fundos pela direcção, dinheiros das contribuições dos motociclistas … mas o trabalho vai continuar para estruturar a sua actividade e para se lhes dar alguma formação. As regras mínimas e o Código da Estada. Efectivamente, o nível de acidentes na província ainda é muito elevado, ou pelo desrespeitos as regras do código, ou pelo consume do alcoól …

    Por outro lado, não é muito cedo para o Huambo estar a apostar na criação de uma bacia leiteira, quando está, em termos de efectivo bovino atrás da Huila e do Cunene, por exemplo?
    Não. É preciso ver que o Huambo já produzia leite. Ainda nos anos oitenta consumimos leite produzido aqui, por criadores que, na sua maioria, eram fazendeiros portugueses e que, com a guerra, abandonaram as suas produções, mas o Huambo tinha um parque de vacas importante. Tivemos aqui a Ela – indústria de lacticínios, e a sua matéria-prima era de produção local. O que pretendemos é apenas recuperar o parque perdido, tradição e cultura já temos. Claro que respeitamos as potencialidades e o trabalho do Cunene e da Huila, a Huila tem tradição na produção de leite, mas o Huambo também tem condições naturais para que a bacia leiteira vingue, já só faltam os financiamentos.

    Mas o Huambo abandonou o programa HuamboGen, de melhoramento da genética animal..
    Não está abandonado, está a ser reestruturado e a gestão passará para o Ministério da Agricultura, até porque este projecto tem agora muito mais condições para vingar com o funcionamento da Faculdade de Veterinária e com o novo laboratório, mas moderno e bem apetrechado. Tecnicamente o HuamboGen é muito importante para os médicos veterinários, no seu trabalho de vigiar a criação animal, garantindo a segurança alimentar e sanidade animal.

    O que falta para o governo do Huambo se sentir feliz, qual é o desfio que está a custar vencer?
    Nem tudo está feito, temos de admiti-lo. Pretendemos que a energia do NGove seja uma realidade, que surja o pólo industrial, que o fornecimento de água potável na cidade se resolva de uma vez, estamos na segunda
    fase de reabilitação da rede de infraestruturas da água, até para termos os jardins mais verdes, mais floridos. Precisamos de concluir a reabilitação da Estufa Fria, o pulmão da cidade, precisamos de desenvolver o projecto do pólo universitário, assim como a futura Feira Internacional do Huambo e outros projectos… acho que, nessa altura, o executivo provincial poderá dizer-se algo feliz, porque aí as pessoas estarão mais felizes.
    Quando se iniciou a reabilitação no Huambo, começou-se por potenciar as sedes comunais e municipais, estava tudo destruído no dia seguinte, depois da guerra. Tivemos muitas vezes de deixar administradores municipais e comunais ao relento, ou em cabanas, tendas, etc. Hoje, felizmente, cada administrador tem a sua casa apetrechada e a dignidade para executar o seu trabalho. E ainda temos estradas, pontes e pontecos por reabilitar nas chamadas zonas cinzentas que ainda temos…

    E são muitas?
    O suficiente para nos manter preocupados.

    José Kaliengue
    Fonte: O País
    Fotografia: O País

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