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    Falta de indústria trava a projecção

    Pormenor de um dos desfiles de moda que decorreu na semana passada no recinto da Feira Internacional de Luanda

    A falta em Angola de uma indústria têxtil e de confecção tem sido o grande travão ao desenvolvimento do segmento da moda. De resto, vontade de criar não falta aos estilistas angolanos, mas as limitações são cada vez maisevidentes.
    “Com uma indústria têxtil seria possível estabelecer uma cadeia de produção nacional e vestir mais angolanos com produto o local”, disse ao Jornal de Angola o secretário-geral da Associação de Estilistas Angolanos, Elias Dom Sebas.
    A Associação, que existe há cinco anos, pretende desenvolver trabalho de investigação sobre a questão do estilo nos tempos idos até aos dias de hoje. “Precisamos de recuperar estes valores para que as gerações não percam de vista aquele que sempre foi o nosso estilo”, disse.
    Com 16 estilistas inscritos, a organização surge para defender os interesses dos profissionais do ramo, numa altura em que trabalha para o resgate da cultura, com realce para os trajes, penteados e bijutarias de origem local.
    O estilista referiu haver uma maior propensão das pessoas em usar quase tudo ocidentalizado, até no modo de vestir e pentear.
    “Estamos mais aculturados do que aquilo que devia ser”,  notou.
    Para contrariar a situação, a associação quer dar alguns passos, no sentido de encontrar um tecido que represente a identidade nacional. “Já recuperámos a Samakaka e queremos recuperar também outros tecidos que antigamente eram produzidos localmente, no reino do Congo, Chokwe e outros”,  sublinhou o estilista.

    Elias Dom Sebas disse que a sua instituição está a trabalhar em parceria com o Ministério da Indústria, no sentido de se recuperar a indústria têxtil, com realce para África Têxtil, em Benguela, e Textang II, em Luanda.
    Com a produção de tecidos no país, acrescentou, os estilistas vão passar a ter mais oportunidades de trabalhar nas suas criações e aumentar o nível de produção nacional, factor que reforça o fomento da indústria da moda em Angola.
    “Estamos a procurar dar um toque mais suave aos nossos trajes, caso da bessangana, que deve ser estilizado em conjunto com outras roupas tradicionais”, disse, frisando que isso só vai resultar se existir uma sincronia entre os estilistas e o incentivo do Executivo.
    “É necessário recuperar o parque industrial. Sem uma indústria de confecção, sem o cultivo de algodão não temos como crescer ou fazer avançar a moda”, referiu.
    Actualmente, disse Elias Dom Sebas, o que os estilistas fazem não é suficiente para a produção nacional que se pretende. “Precisamos de industrializar aquilo que fazemos em pequenos ateliers para expandir a nível nacional e internacional. E isso depende muito da aposta que se fizer no sector”, referiu Elias Dom Sebas.

    Dificuldade

    Face à escassez de material, um dado decorrente da própria realidade do mercado, os estilistas angolanos trabalham em grande parte com material importado. “Não temos um pólo industrial que nos sirva de suporte, por isso não podemos fazer muito”, disse. O trabalho tem bastante elasticidade na medida em que se aplica a outros sectores, não só os de vestuário e seus acessórios, pois segundo Elias Dom Sebas, tem a ver com o imobiliário, no caso da decoração de interiores, e com a indústria automóvel, além de outras.

    Moda promove turismo

    Elias Dom Sebas referiu que se deve despertar a sociedade, os empresários e o Executivo de que é rentável investir no ramo da moda. Este é um sector promissor e que conduz na prática a altos rendimentos, além de incentivar o turismo. Para isso, prosseguiu, basta olhar para as grandes capitais da moda. A moda faz com que uma capital, uma região ou país faça parte das grandes rotas turísticas. Quem ganha é a economia destes países.
    “É preciso trabalhar em conjunto para encontrar caminhos que nos conduzam à revitalização da indústria e assim seguir para a criação de uma indústria da moda em Angola. Moda é hoje um dos segmentos que mais rendimento proporciona aos governos. Paris, Veneza, Milão e Nova Iorque são muito conhecidos por força da moda”, salientou.
    Neste momento, sublinhou, trabalham limitados e mesmo com esta limitação procuram mostrar que é possível crescer neste segmento. “É preciso apostar nisso. Mas é preciso que haja interesse. De resto, os nossos estilistas são competentes e podem criar com dedicação boas peças de vestuário, talhadas para a nossa realidade cultural”, realçou.
    A  nossa participação no Fashion surge da necessidade de aumentarmos o número de membros e até agora os resultados têm sido satisfatórios. Além disso, a Associação está a procurar criar parcerias para instalação em Luanda de uma Escola Nacional de Moda, contando com o apoio dos Ministérios da Educação e da Indústria.
    A formação continua a representar maior preocupação da associação.  “Estamos a pensar também na criação de uma Faculdade de Moda”, disse o estilista,  acrescentando que  grande parte dos estilistas da nossa praça é formada fora do país e a restante entrou para a profissão por via do autodidactismo.

    Indústria têxtil

    O Executivo tem dado sinais de aposta no sector. Prova disso é que no segmento da joalharia e bijuteria existe já a Fábrica de Lapidação de Diamantes Angola Polishing Diamond, que está a dedicar-se até há pouco tempo ao negócio de jóias, o que supre uma certa lacuna neste segmento. Outro passo a ter em conta é o facto de estar em recuperação a indústria têxtil. Em Benguela está a reerguer-se a antiga África Têxtil, ao mesmo tempo que há também sinais do reinício, embora tímido, do cultivo de algodão. O que é necessário para que cresçamos são políticas e uma aposta na industrialização da moda e nos próprios fazedores. Isso passa pela abertura da banca ao ramo, com a concessão de crédito e a abertura de escolas de moda.
    A estilista Yana Van-Dúnem, presidente da Associação de Estilistas de Angola, diz ser importante que mais profissionais se inscrevam na associação. “Daqui a algum tempo quem não fizer parte da associação não vai poder exercer a profissão, à semelhança do que acontece com as diversas ordens. Vamos trabalhar em parceria com os Ministérios da Indústria e do Comércio, assim como com a Policia Económica. “É bom que todos que se sintam estilistas façam a sua inscrição”, disse Yana Van-Dúnem, acrescentando que é preciso que se respeite a ordem e a forma como estão estruturadas as coisas.
    “É péssimo trabalhar nas condições em que o nosso mercado se encontra. Acreditando que as coisas venham a melhorar para os profissionais do ramo, caso as indústrias têxteis e de confecção forem revitalizadas, comprometemo-nos a trabalhar com o Ministério da Indústria no sentido de criar tecidos e fazermos designer para os mesmos”, realçou.
    A opinião da estilista angolana Lucrécia Moreira não diverge das demais. Ela afirma que a ausência de uma indústria têxtil no país continua a ser o principal entrave para a confecção de vestuário e o desenvolvimento da moda angolana. “Sem as fábricas não podemos confeccionar em série, porquanto não produzimos para todos e a baixo custo”, disse.
    A falta de uma indústria têxtil, prosseguiu, impossibilita também a produção de artigos nacionais. À semelhança de Dom Sebas, Lucrécia Moreira defende que os Ministérios do Comércio e da Indústria trabalhem com os criadores nacionais para difundir a moda angolana a nível internacional. “Precisamos de grandes investimentos e máquinas. A moda é a terceira maior indústria no mundo, tendo em conta o volume de receitas que fornece”, precisou. Lucrécia Moreira.
    Mia Mendes, experimentada criadora, realçou que com uma indústria têxtil, os estilistas criam padrões com características nacionais  e podem  vestir mais os angolanos com produtos locais.

     

    João Dias

    Fonte: Jornal de Angola

    Fotografia: João Gomes

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