A primeira edição da Bienal Internacional de Poesia pretende recuperar o que a poesia foi na sua origem, a sonoridade, como consta no seu programa de recitais, embora pretenda privilegiar, numa proporção equivalente, uma mostra de textos poéticos fixados pela escrita.
A poesia foi, durante muito tempo, som, ou ritmo sonoro, obtido pelo encadeamento verbalizado da palavra dita. Só muito mais tarde se tornou escrita e, depois disso, imagem instaurada a partir do efeito da palavra, em ritmo visual.
A bienal internacional pretende que a poesia seja vista, pelo impacto da plasticidade e visibilidade das suas distintas ortografias, contrariando a ditadura interpretativa de sentidos únicos, e elegendo o efeito da democracia da palavra, no seu mais aberto e abrangente sentido artístico e estilístico.
A criação poética, incluindo a magnitude diversa do património oral, tem uma longa tradição em Angola, e a bienal deseja que a poesia esteja exposta, cantada, representada, e debatida em mesas redondas, ao longo da sua evolução diacrónica, pelos vários períodos de criação colectiva e individual, enaltecendo os seus mais prestigiados e legítimos autores.
Poetas convidados
Para além de poetas angolanos, estão convidados para o palco livre de recitais e participação nas mesas redondas, os poetas Ademir Assunção, Guido Bilharinho, Nina Rizzi, Cláudio Daniel, Wilmar Silva, Micheline Verusck, Camila Vardarac (Brasil), Amosse Mucavele, Diniz Muha, Eduardo Quive, Luís Cezerilo, Filimone Meigos (Moçambique), Luís Costa, António José Borges , Maria Ângela Carrascalão (Timor-Leste), Corsino Fortes, Elísio Filinto, José Luís Tavares, Vera Duarte (Cabo Verde), Jerónimo Salvaterra Manuel, Conceição Lima ( São Tomé e Príncipe), Ernesto Melo e Castro, Jorge Melícias, Luís Serguilha, Fernando Aguiar (Portugal), Odete Semedo, e Tony Tcheka (Guiné-Bissau).
Programação cultural
Mais do que incluir obras e autores, interessa aos curadores da Bienal Internacional de Poesia, a problematização do fenómeno literário, centrada na poesia, enquanto fonte potencial de conhecimento da história política e social de Angola, e dos representantes dos países convidados.
Da programação cultural fazem parte concertos, com cantores que vão interpretar textos de poetas angolanos, recitais, com poetas angolanos e convidados estrangeiros, mesas redondas sobre a génese da poesia e história literária, teatro sobre poemas representados em palco, exposição de livros e discos editados sobre recitais de poesia, e está ainda reservada uma semana especial dedicada à obra do poeta Agostinho Neto, e depoimentos sobre a sua vida literária, a cargo da escritora Maria Eugénia Neto.
Música e poesia
A Bienal Internacional de Poesia reservou um espaço para os cantores que cantam textos de poetas angolanos, desde Agostinho Neto, Mário António, Manuel Rui, Viriato da Cruz, António Jacinto, e Raul David, que são interpretados, pelos trovadores José Kafala, e Acácio, do grupo musical Acapaná, e Dulce Trindade, incluindo as propostas inovadoras do cantor, Jack Kanga.
Textos clássicos
A Bienal Internacional da Poesia embora inclua a produção literária contemporânea, vai privilegiar os clássicos da literatura angolana, na perspectiva das obras que se reportam à história literária de Angola, entendidas na relação entre a edição e a tradição literária que lhe é anterior, independentemente de um eventual juízo estético.
Um exemplo pode dar luz ao critério de selecção dos textos clássicos presentes na Bienal: cinco anos após a instalação da imprensa em Angola (1845) surgem os poemas do livro “Espontaneidades da minha alma. Às senhoras africanas”, de José da Silva Maia Ferreira, um clássico da literatura angolana, publicado em 1849, assim considerado não na perspectiva da sua valorização estética, mas pelo pioneirismo e contexto em que surgiu. Maia Ferreira foi o primeiro poeta africano de língua portuguesa com livro publicado.
Poesia e liberdade
A poesia angolana, importante ferramenta de contestação anti-colonial, viveu um longo período naturalista, romântico, e, sobretudo, contestatário, e tem evocado, mais recentemente, o lirismo e a liberdade subjectiva dos seus poetas mais jovens, instaurando a construção livre e a sucessiva desconstrução de mundos possíveis.
De natureza inclusiva, a Bienal Internacional da Poesia vai ser uma singular oportunidade de empreender uma reflexão especulativa sobre a natureza e os mecanismos de construção textual da poesia, valorizando as diversas vozes da poética angolana, que têm absorvido, ao logo da sua gloriosa história, múltiplas marcas, caminhadas e peregrinações, onde os silêncios gritaram de mágoa, e, hoje, os desesperos ressuscitam de esperança, no processo heróico e irreversível da construção da “Nova Angola”, o novo ciclo da história, enunciado pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos. Os convidados, e público em geral, vão desfrutar o efeito estético de uma infinidade de “palavras escritas em folhas de mel”, signo do certame, e paráfrase de um verso do poeta e curador da Bienal Internacional da Poesia, João Maimona.
Um dos nobres objectivos da Bienal Internacional de Poesia é o de legitimar, no sentido pedagógico, a história da poesia angolana, consubstanciada na produção dos seus mais dignos poetas, invertendo a tendência de um certo tipo de criação, de pendor subversivo, que desrespeita o bom nome das instituições angolanas.