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    As quotas de produção de petróleo voltam a ameaçar a coesão da OPEP, após a saída de Angola no final de 2023

    Para a maioria dos analistas que, como nós, acompanham regularmente o que se passa nos mercados petrolíferos, a reunião da OPEP e dos seus aliados, OPEP+, no domingo, deveria ser amplamente consensual. E foi, demorou apenas 4 horas, com a particularidade de alguns dos ministros estarem em Riade, na Arábia Saudita, líder de facto da organização, e os restantes ministros estarem online a partir das suas capitais. Aparentemente, ninguém estava em Viena, na Áustria, onde está sediada a OPEP.

    A reunião foi consensual, mas o resultado extremamente confuso. Os membros da OPEP+ estão atualmente a reduzir a produção num total de 5,86 milhões de barris por dia (bpd), ou cerca de 5,7% da procura global. Isso inclui cortes de 3,66 milhões de bpd, que deveriam expirar no final de 2024, e cortes voluntários de 2,2 milhões de bpd por parte de oito membros, que expirariam no final de junho de 2024. No domingo, a OPEP+ concordou em prolongar os cortes de 3,66 milhões de bpd por um ano até ao final de 2025 e prolongar os cortes de 2,2 milhões de bpd por três meses até ao final de setembro de 2024. A OPEP+ eliminará gradualmente os cortes de 2,2 milhões de bpd ao longo de um ano, de outubro de 2024 a setembro de 2025.

    Considerando tudo isto, o leitor poderá responder se a OPEP+ irá reduzir, manter ou aumentar a sua produção de petróleo? Não se preocupe, poucos o sabem.

    Os analistas de petróleo ainda estão a debater o significado do acordo da OPEP+ . A única coisa clara no acordo é que o vencedor inegável é a potência ascendente do grupo: os Emirados Árabes Unidos. Num acontecimento surpreendente no domingo, a OPEP+ adiou as discussões sobre as capacidades de produção até novembro de 2025 e concordou com uma nova meta de produção para os Emirados Árabes Unidos, que poderá aumentar gradualmente a produção em 0,3 milhões de bpd, acima do nível atual de 2,9 milhões de bpd.

    No entanto, os mercados já reagiram e o pessimismo fez com que o preço do Brent, que perdeu quase 4% na segunda-feira, caísse acentuadamente para perto de 78 dólares por barril. A ideia, alimentada por muitos analistas, de que o preço do Brent poderia atingir os 100 dólares por barril no segundo semestre parece cada vez mais uma miragem.

    Na verdade, a OPEP+ está mais uma vez a debater-se com a espinhosa questão de saber quanto petróleo os seus membros são realmente capazes de extrair, uma questão que representa riscos para os esforços do grupo para estabilizar os mercados mundiais.

    Enquanto os membros da OPEP+ discutem a sua política de produção para o resto de 2024, o grupo resolveu esconder debaixo do tapete o debate sobre a capacidade de cada produtor para bombear petróleo. As capacidades de produção de petróleo tornar-se-ão a base para quaisquer quotas de produção ao abrigo do acordo OPEP+ para 2025, o que tem levado vários produtores a pressionar por estimativas mais elevadas da sua capacidade.

    Depois de um debate acirrado sobre o assunto no ano passado – que acabou por conduzir à saída de Angola em dezembro do ano passado – a aliança liderada pela Arábia Saudita encomendou uma avaliação externa das capacidades de produção dos seus membros. Vários grandes exportadores procuraram aumentar os seus níveis, com vista a garantir o direito de bombear mais petróleo em 2025. Mas o cartel decidiu adiar as discussões para o próximo ano para evitar conflitos internos que possam minar a credibilidade da organização e, em última análise, levar ao seu declínio.

    A razão para adiar o debate sobre as capacidades de produção no seio da OPEP é muito simples. Durante o choque petrolífero em meados da década de 1970, a OPEP controlava cerca de 65% do mercado petrolífero mundial (excluindo os países do bloco soviético). Hoje, a participação relativa da OPEP é de cerca de 35% do mercado. A OPEP já não controla o mercado como fazia no passado.

    A teoria económica ensina-nos que à medida que um cartel deixa de controlar o mercado, a disciplina interna começa a desgastar-se até o cartel acabar implodindo.

    A OPEP e os seus parceiros têm restringido a produção de petróleo numa tentativa de evitar um excedente e reforçar os preços do petróleo. Mas a JPMorgan Chase & Co. Já advertiu que o grupo – que já detém uma capacidade ociosa considerável – poderá ter dificuldades em gerir os mercados no próximo ano, quando o crescimento da procura começar a abrandar e a oferta dos países fora da OPEP começar a subir.

    Os Emirados Árabes Unidos conseguiram aumentar a sua quota e a gigante petrolífera estatal Abu Dhabi National Oil Co. disse no seu website que é capaz de bombear muito mais, cerca de 4,85 milhões de barris por dia.

    O Iraque também declarou publicamente que tem capacidade para produzir mais do que os créditos da OPEP.

    Grande parte da pressão sobre a OPEP vem das energias renováveis. Mas tudo indica que a maioria dos países começa a equilibrar a transição energética com a segurança energética e, portanto, a procura de petróleo e gás continuará a ser importante por mais tempo do que se pensava.

    O grande desafio da OPEP vem dos produtores de petróleo e gás fora do cartel. A produção de petróleo fora da OPEP não para de crescer. Os Estados Unidos, Canadá, Brasil, Guiana, Noruega, Reino Unido continuam a aumentar a sua produção. Novos produtores de petróleo, como a Namíbia e o Senegal, também se preparam para entrar no mercado.

    Neste contexto, a OPEP terá dificuldade em disciplinar os seus membros, uma vez que alguns deles acreditam cada vez mais que os sacrifícios que estão a fazer para reduzir a sua produção e manter preços elevados acabam por beneficiar os países fora da OPEP que continuam a aumentar a produção. Isso tem a ver com a conhecida questão económica do free-rider, ou seja, aquele que vai a boleia sem pagar o bilhete.

    Mas a OPEP tem uma oportunidade de se regenerar. Para o conseguir, terá de abraçar a transição energética, tal como fez a Agência Internacional de Energia (AIE), que foi criada justamente na década de 1970 por países consumidores de petróleo para fazer face à OPEP.

    Além de militar pela segurança energética durante o processo de transição energética, a OPEP também poderá fazer valer os interesses dos países produtores de petróleo, muitos dos quais são países em desenvolvimento e cujas receitas são fundamentais para financiar o desenvolvimento sustentável e a transição energética. Nesse quadro, ser membro ou não da OPEP seria irrelevante.

    Por: José Correia Nunes
    Diretor Executivo Portal de Angola

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