O activista Edson Kamalanga está em prisão preventiva há mais de seis meses, apesar da deterioração do seu estado de saúde, segundo avançou a defesa. O julgamento iniciado em 18 de maio foi adiado sine die.
O activista angolano Edson Kamalanga continua em prisão preventiva no âmbito do processo onde é acusado de crime de furto doméstico na qualidade de encobridor. Kamalanga comprou material de construção civil – que havia sido roubado -, a um guarda do Complexo Escolar Marítimo Hélder Neto, na província angolana do Namibe. Segundo a acusação, o ativista sabia do roubo e, em vez de o denunciar, fez a compra.
Kamalanga foi detido a 20 de outubro de 2020.
O julgamento do caso teve início esta terça feira (18.05) no Namibe. Em entrevista à DW África, o advogado de defesa José Cavela, afirmou que “nada justifica a prisão preventiva” do ativista.
DW África: O que foi decidido no julgamento?
José Cavela (JC): O julgamento continua ainda a decorrer. Houve uma interrupção de natureza processual devido à necessidade de ouvir um dos declarantes. Felizmente ou infelizmente, o declarante em causa não é falante de língua portuguesa. É espanhol e há necessidade de um intérprete para melhor esclarecer e ajudar a descobrir a verdade. Foi isso que levou a essa interrupção.
DW África: Da primeira sessão não há conclusões?
JC: As audiências de discussão e julgamento têm por objetivo a descoberta da verdade material. É um momento de produção de provas, quer por via de provas declarativas, quer por via de provas documentais e relatórios. Até este momento não se decidiu absolutamente nada. O processo é complexo. Exige que haja um pouco de serenidade e ponderação aquando da audiência, porque estamos a falar do momento mais alto da produção de provas, em que está em jogo justamente a liberdade e outros direitos fundamentais.
DW África: E já há nova data marcada para dar continuidade ao julgamento?
JC: O julgamento está sine die. A qualquer momento o tribunal pode notificar-nos para o reinício da audiência de discussão e julgamento e depois dar-se sequência a outras fases processuais.
DW África: E até novos desenvolvimentos Edson Kamalanga irá continuar em prisão preventiva?
JC: Sim, não só Edson Kamalanga mas todos os arguidos. Tinham de regressar ao estabelecimento penitenciário, pois o julgamento ainda não terminou. Não obstante termos pedido a alteração da medida de prisão preventiva, devido ao estado de saúde dele. Ele padece de tuberculose, que é contagiosa, mas também de malária. São doenças que vão mexendo com o estado psicofísico dele.
DW África: Nem argumentando com o estado de saúde conseguiu a alteração da medida de prisão preventiva?
JC: Não. A apreciação do tribunal é do entendimento que, em obediência ao princípio da igualdade não se podia alterar, aguardando que esgotasse todos os meios de prova durante a audiência para melhor se fazer justiça penal.
DW África: Em abril, em entrevista à DW, falou em perseguição política. Mantém essa avaliação?
JC: Em parte entendo que sim. O Edson Kamalanga não é o autor material do crime, mas sim encobridor. As teorias penais modernas são mais do que claras. Nada justifica a prisão preventiva dele. Não há cometimento, não há crime direto que tenha sido praticado por ele. Acabou por comprar bens que pertencem a uma instituição e ele desconhecia a proveniência dos mesmos, se era furtado ou não era furtado.
Um dos coarguidos acabou por ficar com a medida alterada – trata-se de uma arguida que foi solta – por conta do seu estado de saúde, porque tem hipertensão arterial. O Edson Kamalanga padece de uma doença mais grave e não vê essa alteração. Não há um cumprimento rigoroso, quer por parte do Ministério Público, quer por parte do tribunal, do cumprimento do princípio da igualdade. Se houve a necessidade de se alterar a medida por um dos coarguidos ser vítima de uma doença, seria normal que se pudesse alterar a medida de prisão preventiva do ativista.