A intervenção das forças militares nos processos de produção e garantia de estabilidade e segurança nas principais rotas marítimas do comércio internacional constituem alguns dos pressupostos para que os países africanos possam superar os desafios económicos impostos pelas consequências directas da pandemia da Covid-19, tendo em vista ao alcance dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável até 2030.
A perspectiva consta do leque de deliberações da sétima conferência cíclica virtual ” “, realizada há dias sob o lema ” Africa Sessions “África pós Covid-19: perspectivas sobre a segurança em África”, em que especialistas em Segurança e Economia Internacional procederam a uma abordagem exaustiva sobre os possíveis impactos financeiros, tecnológicos, políticos, sociais inerentes à grande complexidade, dilemas e responsabilidades adicionais aos processos de tomada de decisão.
Integrada à plataforma digital, Global Strategic Platform (GSP) e apoiada institucionalmente pela California State University nos EUA e a Fundação Millennium BCP em Portugal, a VII conferência online Africa Sessions teve como prelectores o especialista em Defesa e Segurança Africana, Luís Bras Bernardino, o professor da Universidade Lusófona, Miguel Ferreira da Silva, o director da Sociedade de Geografia de Lisboa, Francisco Proença Garcia e o consultor de geopolítica na Vosionware, SA, Felipe Duarte Pathé.
De acordo com Francisco Proença Garcia, a resolução dos problemas de África passa pela mudança da forma como os países ocidentais encaram o seu conceito de soberania, deixando de fazer intervenções militares e se preocupar apenas em levar apoios para o desenvolvimento socioeconómico das populações, ao contrário da tendência em impor os seus respectivos modelos de re-gime político.
O especialista tomou como exemplo o caso da região do Sahel, em que a União Europeia investiu, nos últimos anos, cerca de 8 mil milhões de dólares, mas que não surtiram efeitos devido à instabilidade que se faz sentir em consequência dos diferentes grupos que reivindicam a legitimidade do poder e autoridade por razões etnolinguísticas e religiosas.
Miguel Ferreira da Silva sublinha que “existem duas perspectivas bastante diferentes sobre o impacto da Covid-19 no continente africano, sendo a primeira na situação de segurança e outra na possibilidade de isso acarretar um adiamento no processo de democratização.
O académico sugere que o impacto directo da pandemia na capacidade de defesa e prontidão não constitui um problema de segurança no sentido mais tradicional do termo, apesar de não se poder negligenciar. Todavia, o cenário é diferente no que diz respeito à população, numa altura em que se nota muita imprecisão nos dados referentes à taxa de prevalência no continente, fornecida por diversas instituições.
“Este fenómeno poderá influenciar de forma negativa no comércio, já que está ligado à discriminação ou preconceito em determinadas sociedades que acreditam que se trata de uma doença que é trazida pelos estrangeiros. Desta forma, o comércio internacional sofre um grande impacto que se traduz no fraco desenvolvimento económico”, frisou.
Influências das relações com União Europeia, EUA e China
A competição geopolítica entre a União Europeia, China, Estados Unidos da América e Rússia pode acarretar influências positivas ou negativas para o desenvolvimento do continente africano, em função do tipo de cooperação a ser levada a cabo pelos respectivos países na esfera do comércio bilateral e cooperação em matéria de desenvolvimento, segurança e tecnologia, segundo análise do professor da Nova School of Law, Filipe Duarte Pathé.
O académico acredita que no actual contexto, os Estados Unidos da América são a potência que mais perde por estar mais afastada do continente africano, detentor de 75% das reservas em energia e matéria prima, quando a China assume um papel cada vez mais expressivo nas relações comerciais com os Estados de África.
Em sua opinião, os africanos só poderão sair beneficiados da relação com o gigante asiático se souberem maximizar as vantagens do projecto chinês denominado “Belt and Road Initiative”, que configura o “plano Marchal”, chinês em prol das ambições que aquele país tem no seu plano de desenvolvimento e expansão.
Filipe Pathé adverte que uma das melhores formas de concretizar a maximização dos ganhos económicos é obrigar que a China cumpra com as suas promessas, o que passa pelo acesso ao financiamento de 60 mil milhões de dólares, para que possam criar infra-estruturas e desenvolver as trocas comerciais.
Quanto à Rússia, o académico lembrou que em termos económicos não pode competir com a China, uma vez que após a implosão da então URSS, o seu foco já não tem nada a ver com o expansionismo do comunismo, estando agora virada para as questões de segurança, extracção de recursos e energia nuclear.