
“A campanha é mais do que folclore”: comunistas confiantes que “o povo português não vai meter a maioria dos ovos no mesmo cesto”.
“O povo português não vai meter a maioria dos ovos no mesmo cesto”, garantiu ontem Jerónimo de Sousa ao popular que, em Moura e invocando Deus, lhe disse esperar que nem o PSD nem o PS “ganhem com maioria”. A breve troca de palavras ocorreu junto ao restaurante, pastelaria e padaria O Ideal, onde o líder da CDU se apeou do carro e cumprimentou um a um os homens e mulheres sentados na esplanada – um ritual desta vez quase silencioso, por comparação com situações similares desta campanha.
Alguns metros à esquerda, no Largo General Humberto Delgado, centena e meia de apoiantes e militantes – incluindo meia dúzia de crianças – iam conversando ao som dos Xutos & Pontapés (entre outros grupos) enquanto a comitiva não se dirigia ao palanque junto da carrinha da CDU.
Coube ao presidente da Câmara de Moura, o historiador comunista Santiago Macias, fazer as honras da casa: “Não sabia o que havia de dizer, sabia o que não havia de dizer”, começou o autarca. E resolveu cantar “salta, Jerónimo salta, olé”. Segundo o autarca, “não quer dizer que não saltasse”, mas a explicação era outra: “Uma campanha é mais do que folclore”, embora tenha de ter momentos desses.
Foi o deputado João Ramos – natural do concelho e que considerou a iniciativa como “uma das mais participadas” de sempre da CDU na zona – que sublinhou o papel desenvolvido pelo PCP e por Os Verdes no Parlamento em prol do distrito de Beja, pelo qual são eleitos três deputados e que, nas últimas duas eleições legislativas, foram distribuídos por PSD, PS e CDU.
“Não é preciso ser comunista para votar” na foice, no martelo e no girassol que simbolizam a CDU “e acabar com o rumo do vira o disco e toca o mesmo” associado à política do governo PSD-CDS.
Jerónimo de Sousa – de mangas arregaçadas como de costume – deixou a seguir palavras de “confiança e esperança” na derrota de uma maioria PSD-CDS cuja luta dos comunistas “isolou socialmente, condenou politicamente e vai aplicar uma derrota eleitoral”.
Numa terra do Alentejo profundo, o secretário-geral do PCP condenou a “alienação da soberania” decorrente do acordo com a troika. “Qualquer burocrata [do FMI, do BCE, da UE] sente-se no direito de dizer aos portugueses como têm de se governar”, quando “temos uma pátria livre e independente”, lembrou Jerónimo de Sousa.
Horas antes, em Beja, o dirigente máximo da CDU almoçou – num lotado pavilhão dos bombeiros – com pensionistas e reformados a quem exortou a usarem o voto “como um elemento de esperança e instrumento de confiança” para derrotar a maioria PSD-CDS.
Apesar da natural concordância dos presentes com o seu discurso, em que lembrou os cortes dos últimos anos nos salários, pensões e reformas, o líder comunista deixou um alerta: “Seria um voto contra os vossos interesses, a negação de si próprios, votarem nos culpados pela situação em que se encontram.”
Após criticar duramente o governo por tratar os pensionistas e reformados como “gente que já não trabalha, que está inativa, que é um peso para o país”, por os ver “quase como um estorvo, quase como uma despesa”, Jerónimo deixou uma exortação: “Vocês não estão mortos, não são inúteis. Mostrem-lhes que não estão derrotados.”
À noite, num jantar-comício em Serpa, que juntou algumas centenas de apoiantes à mesa para comer ensopado de borrego e em que participou a deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia, Jerónimo de Sousa ouviu um grupo de cante alentejano entoar o célebre tema do 25 de Abril Grândola, Vila Morena – em cujos versos sobressai “o povo é quem mais ordena”.
Apresentando-se pela primeira vez sem casaco num comício noturno e com vários dos presentes a ouvi-lo de pé, o líder comunista reiterou que a CDU “nunca faltará a uma política patriótica e de esquerda”. Contudo, “não vamos servir de sustentáculo” à política de direita – um continuado recado direto ao PS. (dn.pt)