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    Se é elementar, porque insistimos no erro, camarada?

    CARLOS ROSADO DE CARVALHO Economista e docente universitário
    CARLOS ROSADO DE CARVALHO
    Economista e docente universitário

    Por estas semanas, milhares de angolanos receberam ou vão receber os diplomas referentes à conclusão dos respectivos cursos superiores. A todos, sem excepção, os meus parabéns por mais esta etapa cumprida, seguramente à custa de muitos sacrifícios, próprios e das respectivas famílias, e votos sinceros de sucesso profissional e pessoal.

    Teoricamente, com a entrega do diploma as instituições de ensino superior certificam formalmente perante o País e o mundo que o recém licenciado possui os conhecimentos, as habilidades e as competências para abraçar uma carreira profissional na área de estudos superiores
    que frequentou.

    Na prática, nem sempre é assim. Uma percentagem – que não ouso quantificar, mas que presumo elevada – dos licenciados em instituições de ensino superior angolanas não têm, de facto, os conhecimentos, as habilidades e as competências inerentes aos diplomas que ostentam. Em linguagem simples, diria que muitas das nossas instituições de ensino superior não passam diplomas, na verdadeira acepção da palavra. Antes distribuem, a torto e a direito, canudos para os seus titulares exibirem se na sociedade e junto de empregadores
    públicos e privados.

    Neste último caso, com o objectivo de ocuparem cargos e, sobretudo, desfrutarem dos respectivos benefícios, só acessíveis a quem frequentou, com aproveitamento, um curso superior. Dir-me-ão que é assim em todo o mundo. É verdade. Mas não é menos certo que é mais assim nuns países do que noutros. E com o mal dos outros podemos nós bem. Salvo melhor opinião, Angola está entre os países em que é mais assim, em que muitos dos diplomas atribuídos servem, efectivamente, de livre-trânsito de acesso a tachos e respectivas mordomias. Com as consequências negativas que daí advêm para a sociedade, em geral, e a economia, em particular.

    Sendo que os primeiros a pagar a factura são os próprios licenciados que, não tendo “cunhas” para acederem directamente a tachos e mordomias, são atirados às feras num mercado detrabalho cada vez mais competitivo. Pergunto-me mesmo se não estaremos a formar potenciais revoltados. É que, muitos dos nossos licenciados candidatam-se a empregos para os quais preenchem os requisitos formais, nomeadamente o diploma, mas depois acabam preteridos, incluindo por estrangeiros, porque não têm os conhecimentos, as habilidades e as competências inerentes ao diploma que ostentam.

    O aumento exponencial do número de diplomados por universidades angolanas nem sempre se traduz, pelo menos na mesma proporção, na melhoria da qualificação média da nossa mão-de-obra.

    “Lamentavelmente, temos hoje no ensino superior alunos que, por incrível que possa parecer, não dominam uma série de conhecimentos de base, como, por exemplo, redigir uma simples ‘redacção’, sem cometer erros ortográficos e gramaticais monumentais, assim como desconhecem a tabuada, a prova dos nove, ao ponto de não conseguirem fazer uma simples operação aritmética, sem recurso às habituais ‘canadianas’, leia-se máquinas calculadoras.”

    O parágrafo anterior não é da minha autoria – foi integralmente retirado da Carta ao Leitor da última edição, 24 de Agosto de 2013, do Semanário Angolense, dirigido pelo meu camarada (de profissão) Salas Neto.

    Mas assino por baixo! Não só este parágrafo, como a totalidade do editorial dedicado à educação em Angola. Concordo com os elogios ao Executivo “que tem feito investimentos consideráveis no sector”, embora com a ressalva de que “os investimentos em termos quantitativos não foram proporcionais aos qualificativos”. Também não percebo “a apetência quase que desmedida para a emergência de novas instalações do ensino superior em tudo o que é beco”.

    Da mesma forma, considero que “a corrida desenfreada às universidades e aos canudos, em detrimento da melhoria da qualidade do ensino de base, transmite-nos a ideia de que o país está a ser erguido pelo tecto, ao invés de começarmos pelos caboucos, como se estivéssemos a inverter a pirâmide!”.

    Temo igualmente que “nesse andar continuaremos a ter milhares de “doutores” que, no final das contas, nada sabem de jeito, por lhes ter faltado o básico que se devia aprender nos primeiros anos de escola, o que só se inverterá quando se apostar muito mais seriamente no ensino de base”. “Isto é elementar!”, conclui o editorialista do SA. Nem tanto, pelo menos para alguns, digo eu, que até já fui criticado, por
    alegada falta de patriotismo, só porque disse publicamente que faltam quadros qualificados em Angola. (expansao.ao)

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