
Foto: Quintiliano dos Santos-NJ
Melhorar a qualidade do investimento privado de forma a contribuir para o desenvolvimento do país é um dos desafios da ANIP que quer auxiliar o executivo a chegar aos quatro mil milhões de dólares ano até 2017.
Concorda com a exigência do um milhão de dólares como valor mínimo para o investimento privado no país?
As pessoas confundem muito investimento privado e geral com investimento privado de qualidade ou até o que normalmente é chamado de investimento directo.
Há normas em qualquer parte do mundo para a entrada de investimento estrangeiro em cada país. Porquê? Porque quando o investimento estrangeiro vem para Angola ou para um outro país, sai em forma de dividendos. E temos de saber até que ponto este valor corresponde, ou não, realmente ao que vai ser feito, ou se a introdução deste valor não será depois utilizado para outros fins que não aqueles pretendidos.
Mas temos de ter normas com padrão internacional para evitar que se caia no erro em que já caíram vários países, que podem ser considerados independentes politicamente, mas são economicamente dependentes.
Por norma, os países desenvolvidos não fazem política para obter finalidade política, para terem amigos políticos. Fazem política para obter resultados económicos.
E é isso que se chama diplomacia económica.
É o que está a ser feito agora?
Exactamente. A diplomacia económica é feita pelo conjunto de órgãos do executivo que, fora de Angola, é coordenada pela missão exterior diplomática, a qual, por sua vez, é coordenada pelo Ministério das Relações Exteriores. E tem um embaixador como representante do Estado e do Presidente da República.
Deverá haver nesses países um conjunto de representantes que possam responder às questões, em conjunto com a parte política. Por isso é que é preciso haver parâmetros e os valores têm a ver com isso.
A comunidade internacional, e não só, fala do excesso de burocracia no investimento em Angola. Esta diplomacia de que falou não acaba por chocar com esta burocracia?
Essa burocracia não se prende propriamente com aprovação dos projectos, propostas ou criação de uma empresa. Inclusive, mesmo até o alvará, para o qual havia uma dificuldade na concepção, melhorou.
Porque agora é automático. O problema que se põe é mais em termos de se encontrar, se calhar, um terreno para se construir uma fábrica, ou para agricultura, ou um projecto imobiliário. O preço do terreno obedece ao preço do mercado, mas há terrenos que o próprio Estado pode disponibilizar, obviamente com preços inferiores, em zonas adequadas para o mesmo efeito e é aí que por vezes há problemas.
Há um outro problema. As nossas associações industriais e comerciais não estão muito bem organizadas.
Acredito, inclusive, que os presidentes das associações têm mais um papel político e de empresários do que de presidentes associativos.
As pessoas são sempre as mesmas e acredito que não têm evoluído muito. Têm feito mais trabalho de lobbie.
Esta burocracia também acaba por ir dar com a suposta falta da transparência. Por exemplo, o embaixador norte-americano tem falado muito nisso nos últimos tempos. As empresas norte-americanas não conhecem a realidade de Angola, têm pouca informação, querem investir, mas têm o problema da transparência…
Discordo completamente com essa [ideia] falta de transparência. Porque é o governo que fornece os dados que são conhecidos. Ninguém vem fazer espionagem ao Ministério das Finanças ou à Direcção Nacional do Tesouro ou ao Banco Nacional de Angola.
Se houvesse algo a esconder seria na fase da divulgação dos dados.
Não seria agora e, sobretudo, depois de vários anos de trabalho conjunto.
Acredito que isto é má-fé. As nossas contas são muito bem conhecidas, inclusive pelo próprio Departamento de Estado norte-americano.
O que se passa é que havia questões políticas que ainda não estão bem resolvidas não obstante a nova administração americana estar a trabalhar com Angola. Há estigmas que levam anos a serem ultrapassados. Acredito que, em relação a Angola, haja um estigma que esteja mais propriamente ligado ao Senado Americano do que ao governo americano. Logo não é verdade que haja falta de transparência e de informação.
Os americanos têm cá empresas e nunca houve um problema em termos de instabilidade política, nem económica, para trabalharem.
E tem-se beneficiado muito com a lei do AGOA, que facilita a entrada de produtos angolanos nos Estados Unidos sem pagar impostos. Como não temos quase produção nenhuma, o petróleo acaba por ser o produto que lá chega e com a vantagem de quase não ser tributado, quer em Angola, quer na América.
Se calhar, estaria mais preocupada em saber o que é feito dos valores que ficaram fora, nos bancos estrangeiros e em alguns paraísos fiscais, relativos às empresas estrangeiras petrolíferas, algumas delas americanas, que operam em Angola e que de acordo com a lei da administração anterior eram já obrigadas a depositar nos nossos bancos. Mas como a legislação tinha excepções. E, através delas, esse dinheiro não ficava nem fica, até a presente data, no nosso país. E sobre esse dinheiro sim, gostaríamos de saber onde está. E a esta pergunta talvez o governo americano pudesse investigar melhor.
A obrigatoriedade de o investidor privado estrangeiro se associar a um nacional não retrai o investimento?
Não acreditamos que assim seja, porque a obrigatoriedade é só nas áreas que no passado estavam interditas aos nacionais.
Estamos a falar de que áreas?
Por exemplo dos petróleos e diamantes. E nestes dois casos era injusto que os angolanos não pudessem beneficiar. Antes isso acontecia.
E na área dos petróleos estamos a proteger o segmento da prestação de serviços.
É na área de prestação de serviços que é imperioso que o estrangeiro trabalhe com o nacional. E obviamente que a legislação sobre o investimento no petróleo é especial e tem requisitos próprios.
Há companhias que vieram de vários países, principalmente portuguesas, e ficaram cá ilegalmente.
Quer dizer, vinham para cumprir um determinado contrato e, a coberto desse contrato, que as beneficiava com isenção de impostos, foram praticando outras actividades e continuavam também a não pagar impostos.
Não entendo porque que é que um estrangeiro vem para aqui com uma mão à frente e outra atrás, às vezes vem prestar serviços, vem com os cem mil dólares e depois transforma-se em sócio de banco, accionista de empresa petrolífera, tem complexo imobiliário. E as pessoas acham normal.
Ele chegou aí porque houve permissão para tal…
Desculpe, mas ele fez dinheiro. E as pessoas acham normal. Porque é que para um angolano que começa também pequeno e cresce no seu próprio país é anormal que possa ser sócio, empresário e accionista.
Por isso voltamos à questão do um milhão de dólares.
As pessoas que reclamam do um milhão são aqueles que fizeram muito dinheiro ou ouviram dizer que aqui com 100 mil dólares se fazia muito dinheiro e querem ter essa oportunidade que não tiveram.
Como impedir que o dinheiro que deveria beneficiar o país saia com alguma facilidade?
Há uma nova legislação a nível do Banco Nacional de Angola que já está a trabalhar nesse sentido. Que vai fazer com que os valores fruto do investimento feito em Angola fiquem sediados em bancos do país. Havia alguma brecha e a nova legislação vai ser mais rígida.
Há muitas correntes que defendem que as propostas de investimento não têm de ser avaliadas. Só têm de entrar no país e só temos de aceitar e aprovar. Desde que tragam dinheiro são bem-vindas.
E houve períodos em que agimos desta maneira, o que é que aconteceu?
Aconteceu que, por exemplo, fomos à província do Uíge, onde era suposto encontrarmos 16 empresas e ao Namibe onde, deveríamos encontrar 20 empresas. Encontramos duas e cinco, respectivamente. Já fomos ao Bié e Huambo e aconteceu a mesma coisa.
Actualmente, quais os ramos de investimento prioritários?
Em termos de prioridades são a agricultura e a indústria transformadora.
Os projectos propostos têm ido de encontro a esses interesses?
Ultimamente sim. Mas para termos projectos nestas áreas temos de ter boas infra-estruturas. Então, a outra prioridade do governo são as infra-estruturas, para não dizer mesmo: a primeira.
Qual é a principal origem do investimento feito no país?
Até 2011 era Portugal. Mas no ano passado já não foi bem assim. Este ano os chineses estão a tentar ombrear com os portugueses, estão a meter-se também na indústria, embora de pequeno e médio porte. Estão também na agricultura.
Que balanço faz do ano passado?
O ano passado não foi mau. Mas achamos que também não foi bom. Aprovamos cerca de 2.3 mil milhões de dólares em 166 projectos, mas queremos muito mais.
No primeiro trimestre deste ano já aprovamos 306 milhões de dólares.
Este resultado não tão bom deve-se à implementação da lei de investimento privado que exige capital mínimo de 1 milhão de dólares?
Não. Não foi. Porque em 2012 o investimento privado aumentou relativamente ao ano anterior.
Aumentou o número de propostas e projectos em valores, embora o número de propostas tenha reduzido, o que é normal.
Tivemos no passado muitas propostas de actividade comercial e prestação de serviço de 100 mil dólares e, obviamente, essas não apareceram em número tão elevado.
Portanto o número de propostas reduziu, mas o valor aumentou.
Achamos que foi bom, mas podia ter sido um pouco melhor.
No primeiro trimestre deste ano já temos aprovadas propostas no valor de cerca de 306 milhões de dólares, mas entendemos que é pouco se tivermos como ambição o número de quatro mil milhões que se pretende como média entre 2013 e 2017.
Qual é a situação do grupo português Sonae?
A Sonae é um grupo que tem uma proposta que já foi aprovada e há um período que normalmente concedemos, que vai de acordo com o cronograma do projecto.
Até agora ainda não ultrapassaram o prazo para começar a implementar o projecto.
Esta a falar só da rede de supermercados Continente ou também de um outro negócio?
Com a Sonae só temos este projecto do Continente. Pelo menos a nível da ANIP. Mas os investimentos da área commercial não são os prioritários para o desenvolvimento do país.
Por isso, este projecto, para mim, significa um número em termos de dinheiro, mas não significa tanto assim em termos de desenvolvimento económico.
Acredito que vai ajudar mais na segunda fase do projecto em que vão incorporar a nossa produção nas redes e essa é a parte que me interessa mais no projecto. FAUSTINO DIOGO (Novo Jornal)
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