
Carlos Santos Ferreira, presidente do conselho de administração executivo do banco Millennium bcp, onde a Sonangol se afirma como principal accionista (detém a maior participação qualificada), admite que a instituição irá prosseguir iniciativas de reforço de capital de forma a podermos atingir um Core Tier I de 9% até ao final do ano e de 10% em 2012 (o Core Tier I é a principal medida de saúde financeira de um banco e e que afere da sua capacidade para suportar perdas futuras). Santos Ferreira lembra que Millennium bcp foi um dos poucos bancos no mundo que concluiu um aumento de capital de 1,37 mil milhões de euros precisamente no meio de um bail-out de Portugal. O Millennium bcp detém, em conjunto com a Sonangol e o Banco Privado Atlântico o Banco Millennium Angola (BMA), que já conta com mais de 100 mil clientes em 14 das 18 províncias do país. Santos Ferreira, que estará em Luanda na próxima semana para participar numa cerimónia do BMA que irá premiar clientes empreendedores que têm projectos financiados através do microcrédito do banco, assegura que este faz uma aposta nos quadros locais e no desenvolvimento do país, sublinhando que a instituição, nos últimos três anos, não repatriou qualquer lucro e que os seus accionistas acertaram que, nos próximos três anos, o resultado líquido será reinvestido em Angola.
No próximo dia 25, terça-feira, o Banco Millennium Angola (BMA) vai proceder à entrega dos prémios referentes ao Microcrédito. O que nos pode adiantar sobre a cerimónia?
Trata-se de uma cerimónia com a presença de cerca de 500 individualidades com o propósito de premiar clientes empreendedores que têm projectos financiados através do microcrédito do banco.
Além de querermos dar visibilidade a estes empreendedores que se pretende sirvam de exemplo a outros – e que constitui o propósito principal da iniciativa, o primeiro classificado verá amortizada integralmente a sua dívida junto do banco e ao segundo e terceiro classificados será amortizado, respectivamente, 75% e 50% dos montantes em dívida.
A todos os participantes será oferecida a possibilidade de frequentarem um curso de empreendedorismo, ministrado pela Academia Millennium Atlântico, onde terão a oportunidade de aprofundar os seus conhecimentos em matérias de elaboração de um plano de negócios, marketing, finanças e outras matérias relevantes para o desenvolvimento dos respectivos negócios.
Desde o início de 2010 que o BMA concedeu mais de USD 40 milhões de microcrédito. Pode explicar-nos um pouco esta área de negócio? Que balanço faz e que perspectivas se colocam?
A carteira de Microcrédito do BMA está geograficamente alinhada com a distribuição da rede comercial do Banco Millennium Angola, que está hoje presente em 14 das 18 províncias, dispondo de 52 sucursais com capacidade, quadros qualificados, para servir os clientes com elevados padrões de qualidade.
Quanto à distribuição por género, aproxidamente 66% dos empréstimos são solicitados por homens, não obstante acreditamos que as importantes parcerias estabelecidas com a Organização da Mulher Angolana (OMA) e com a Federação da Mulher Empreendedora Angolana (FMEA) vão alterar a actual composição da carteira de operações.
No que se refere à faixa etária, mais de 70% dos financiamentos ao abrigo do microcrédito foram contratados por pessoas com idades compreendidas entre os 25 e os 45 anos.
Em termos de valor das operações temos, em termos médios, financiamentos na ordem dos 903 mil Kwanzas, por proponente.
O BMA tem dado importância à formação de quadros angolanos. Qual o papel da Academia Millennium Atlântico no âmbito da qualificação de activos nacionais?
Em termos estatísticos, desde o início de 2010 até ao final do 3.o trimestre foram ministradas pelo banco 3.416 horas de formação que beneficiaram directamente mais de 500 colaboradores.
A expansão e o crescimento do Banco Millennium Angola estão suportados na formação e no desenvolvimento profissional de quadros locais, a todos os níveis da organização, e a Academia constitui um dos pilares chave desse processo de qualificação e valorização de pessoas. Estamos muito satisfeitos com o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pela Academia e quero dar uma palavra especial de agradecimento aos elementos que compõem os seus quadros e órgãos sociais, destacando naturalmente o papel desempenhado pelo Dr. Aldino Remi Sachambula e pela Dra Hermenegilda Benge.
Esta realidade levou o Banco Millennium Angola, conjuntamente com os seus parceiros Sonangol e Banco Atlântico, sem os quais não teria sido possível chegar ao patamar em que nos encontramos, a criar a Academia Millennium Atlântico com um projecto inovador e que pretende formar 10 mil quadros angolanos até 2015 nas áreas financeiras, na banca e seguros.
Que balanço faz da actividade do BMA quanto à evolução do número de clientes e à cobertura do território? Quais os principais objectivos fixados à instituição?
Alcançámos os 100 mil clientes em Maio deste ano, antecipando o nosso objectivo e estamos hoje presentes em 14 das 18 Províncias de Angola. Temos como objectivo para 2012 servir 250 mil clientes.
Muitas vezes refere-se, em Angola, que o afluxo de capitais estrangeiros se centra apenas no objectivo do repatriamento rápido de lucros. O BMA irá reinvestir os seus lucros/ dividendos?
Nos últimos três anos, o Banco Millennium Angola não repatriou qualquer lucro e nos próximos três anos está acertado entre os accionistas que o resultado líquido será reinvestido em Angola, numa perspectiva de longo prazo e de compromisso para com o desenvolvimento do País. Estamos a criar valor para os clientes e a contribuir para o desenvolvimento do sistema financeiro em Angola. Numa operação sustentável há lugar à criação de valor para todos os stakeholders.
As posições externas, no caso no grupo Millennium bcp as posições que detém em Angola, Polónia e Moçambique, vêm dando um contributo muito positivo aos resultados consolidados. A Standard & Poor ́s antecipou uma quebra do resultado líquido consolidado do grupo este ano. Trata-se de uma previsão que se vai verificar?
Não me compete comentar previsões mas posso reafirmar a nossa perspectiva positiva em relação à nossa missão nos mercados africanos e no seu crescente contributo para os resultados consolidados do Grupo Millennium bcp.
Relembro que os resultados e indicadores financeiros do Grupo relativos ao 3o trimestre de 2011 serão publicamente conhecidos no dia 2 de Novembro e, portanto, apenas nessa altura os poderei dar a conhecer e comentar.
O Millennium bcp, tal como os restantes bancos portugueses, rejeitam a injecção de capital de € 12 mil milhões, do fundo de recapitalização constante no acordo celebrado pelo governo português com a missão internacional que integra a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional e que concedeu ajuda financeira a Portugal. Admite que os accionistas do Millennium bcp possam vir a ocorrer a um novo aumento de capital do banco?
Penso que a existência de uma almofada de liquidez, que poderá ser utilizada se for necessária, é positiva. No entanto, o Millennium bcp já anunciou o seu plano de capital e considero que, através das iniciativas em curso ou já concluídas, conseguiremos atingir os objectivos de capital traçados pelo Memorando de Entendimento. Desconhecemos ainda os termos em que o recurso à referida linha se poderia materializar, mas, tendo presente a crise que a Europa atravessa, consideramos que a existência dessa facilidade é importante para o sistema financeiro nacional.
Pode a superação das necessidades de liquidez do banco implicar a recapitalização da instituição e também ajustamentos na actual estrutura accionista?
É importante não confundir os conceitos de capital e solvabilidade com o conceito de liquidez. As questões relacionadas com a falta de liquidez dos Bancos em Portugal pouco têm a ver com os seus rácios de capital mas antes com a falta de acesso aos mercados de capitais de Instituições financeiras em geral e dos países em bail out em particular.
Apesar das dificuldades que toda a banca europeia tem vindo a atravessar devido à redução significativa do mercado monetário, o Millennium bcp definiu um plano de liquidez claro que passa pela redução do gap comercial com o objectivo de atingir um rácio de crédito/depósitos de 120% no final de 2014, pela diversificação das fontes de financiamento e pelo aumento dos activos elegíveis em bancos centrais, de modo a amortizar e reduzir as necessidades de financiamento.
Relativamente ao tema da solvabilidade, o Millennium bcp definiu um plano de capital que passa por várias iniciativas, a saber desalavancagem, liability management, optimização dos activos ponderados pelo risco, venda de activos não core, IRB advanced, avaliação de novas parcerias e outras iniciativas de gestão de capital. Os resultados já alcançados nesta vertente de actuação são muito positivos.
Não creio, por isso, que este tipo de medidas implique necessariamente alterações na estrutura accionista do banco, contudo, esse tipo de alterações, resulta da vontade e decisão dos accionistas e não de actuações do conselho de administração do banco.
Ao contrário do Millennium bim de Moçambique, o BMA não figura entre os 100 maiores bancos de África por capital. É de admitir um aumento do capital do BMA?
Do ranking de que tenho conhecimento elaborado pela revista African Business -, o BMA figura na 84.a posição com um capital de 152 Milhões de USD. Sobre um eventual aumento de capital já falaremos, sendo sempre de considerar nos planos quando se pretende fazer crescer de forma significativa uma operação.
As acções do Millennium bcp em Portugal já se encontram abaixo dos € 0,2 registando uma quebra muito expressiva. Não é estimável que o mercado português, face às medidas de austeridade plasmadas no Orçamento de Estado, venha a registar qualquer evolução positiva. Entretanto, o Millennium bcp já reconheceu ter recebido propostas para a compra da unidade que detém na Polónia, cujo valor rondará os e 1.000 milhões. Para quando a concretização da venda do Bank Millennium e quanto, de facto, espera o Millennium bcp vir a receber da operação?
A queda de valor da cotação Millennium bcp ao longo de 2011, com uma descida particularmente acentuada nos últimos três meses, resulta de um crash nos mercados accionistas os índices globais dos países na Europa estão a cair cerca de 20% o qual, e à semelhança do que sucedeu em 20082009, tem afectado particularmente o sector bancário. Importa também ter presente que Portugal se encontra em bail out, o que naturalmente penaliza muito o valor bolsista das empresas.
O índice do sector bancário europeu registou uma queda de cerca de 35% e metade dos bancos europeus cotados registam desvalorizações entre 40 a 50%. Acresce que o Millennium bcp foi um dos poucos bancos no mundo que concluiu um aumento de capital de 1,37 mil milhões de euros precisamente no meio de um bail-out de Portugal. Com o aumento de capital que realizámos, o rácio de Core Tier I situou-se em 8,5% em 30 de Junho de 2011 – o mais alto da última década e alinhado com as boas práticas na Península Ibérica, o que nos permite continuar outras iniciativas de reforço de capital de forma a podermos atingir um Core Tier I de 9% até ao final do ano e de 10% em 2012.
As decisões tomadas relativamente à eventual alienação do banco na Polónia, serão oportunamente divulgadas e o mercado será imediatamente informado. Neste momento não temos nenhuma decisão tomada sobre a eventual alienação da operação.
O grupo vai centrar as operações em África e no Brasil?
A agenda estratégica do Millennium bcp para o próximo triénio assenta em quatro pilares: reforço da posição de liderança de mercado em Portugal; aposta nas operações de Angola e Moçambique como plataforma de crescimento para África; exploração de novos mercados de afinidade, através de parcerias de negócio, e redefinição do posicionamento das operações europeias (Polónia, Roménia e Grécia).
Qual o ponto de situação relativamente ao pedido de uma licença bancária no Brasil? A nova unidade será detida em que proporções pelo Millennium bcp e pelo Atlântico? Haverá outros accionistas para além destes?
Como informámos o mercado, o Millennium bcp assinou um acordo de parceria com o Banco Privado Atlântico, no passado dia 7 de Setembro para a constituição de um banco no Brasil, a concretizar após a obtenção das licenças e autorizações necessárias.
O acordo de parceria insere-se na agenda estratégica de reenfoque nos mercados de afinidade e de acesso a oportunidades no mercado brasileiro, nomeadamente nas áreas de corporate finance e trade finance, através de parcerias. Logo que existam mais informações que consideremos relevantes, informaremos novamente o mercado.
O Millennium bcp também já revelou ter pedido uma licença para abrir uma sucursal na China. Quem irá deter a instituição da China, o Millennium bcp ou a nova holding que integrará também a Sonangol, já o principal accionista do banco, e o Atlântico? Qual o ponto de situação relativamente ao pedido de licença?
Relativamente ao mercado chinês, o nosso objectivo passa pelo reforço da presença fisíca do Millennium bcp na China, através da obtenção de uma licença para uma sucursal de pleno direito.
Esta sucursal constituiu uma peça chave na ligação estratégica entre quatro geografias com um potencial de negócio elevado e cria a base para o losango estratégico Portugal, China, África e Brasil.
A expansão de negócio do Grupo bcp a novas geografias, através deste losango estratégico, tem como objectivo acompanhar os nossos clientes no exterior, oferecendo-lhes a qualidade de serviço e inovação nas soluções financeiras que distingue a nossa marca, utilizando parcerias como forma de alavancar o franchise doméstico e know-how do Banco.
Qual a leitura que faz da situação crítica portuguesa? Considera que o Orçamento de Estado português, apresentado esta semana, responde adequadamente à situação?
Não costumo fazer observações ou comentários sobre a política seguida pelo Governo português. Contudo acho que posso dizer que, face ao contexto de austeridade e à situação difícil em que se encontra a economia portuguesa (e também europeia), julgo que a proposta do Orçamento de Estado para 2012 é um caminho que infelizmente tem que ser percorrido. Há que garantir a justa distribuição dos sacrifícios e, como o Presidente Lula da Silva disse, numa situação destas os políticos não se devem preocupar com a próxima eleição mas sim com a próxima geração.